São 1,3 bilhão de habitantes em uma economia que não pára de crescer. Desde 1978, quando lentamente a China começou um processo de derrubada de suas muralhas comerciais, a riqueza produzida no país quadruplicou – nenhuma economia do mundo deu um salto tão espetacular na história recente. Só em 2001, o crescimento foi de 7,3%, com um PIB de US$ 1,16 trilhão. A população, em geral, é pobre e concentrada na região rural, e tudo o que diz respeito a negócios ainda leva o carimbo do Estado.

Terra das contradições, a China permitiu que o McDonald’s (mais que uma rede de lanchonetes, um símbolo imperialista) abrisse suas lojas no país no início da década passada. O sucesso foi tanto que os americanos planejam criar 100 novos pontos-de-venda (já são 368). A turma de Ronald McDonald convive bem com a burocracia estatal. Mas as coisas não são sempre tão fáceis. O governo ordenou, recentemente, que os cibercafés chineses fossem fechados da noite para o dia. A “ameaça” da internet estava facilitando, além do acesso à pornografia, o tráfego de informações não controladas.

Métodos jurássicos à parte, a China está na boca do povo que lida com comércio exterior. A senha foi dada em novembro, quando o país foi aceito como membro da Organização Mundial do Comércio (OMC), depois de décadas de negociações – é o primeiro país socialista a ser admitido na entidade. Em outras palavras, isso significa que a China está hoje apta a negociar dentro de condições respeitadas por quase 200 nações do mundo.

A recessão global, puxada pelos Estados Unidos, também ajudou. Quem não tem como crescer em casa busca mercados fora, diz qualquer cartilha capitalista. Todas as dificuldades impostas pelo governo chinês para os forasteiros, mesmo as mais anacrônicas, são hoje encaradas como um pequeno obstáculo diante do gigantesco mercado. Em sua última edição, a revista de negócios americana Fortune preparou um levantamento das 100 maiores companhias chinesas (todas são estatais, por sinal). “A China está em algum lugar entre o capitalismo e o socialismo”, diz reportagem, numa clara esperança que o capitalismo um dia seja predominante por lá.

Ávido por exportações, o governo brasileiro também pavimenta seu caminho rumo ao Oriente. Em abril, uma missão comercial liderada pelo ministro Sérgio Amaral, do Desenvolvimento, desembarca em Shangai. Pela primeira vez, em 17 anos, será realizada na cidade uma exposição de produtos e serviços dos dois países, a Brazil China Trade Fair. O objetivo é aumentar o volume de negócios entre os dois países.

Churrascaria – Entre as empresas brasileiras de olho grande no gigante mercado chinês se destacam a Embraco (fabricante de motores), a Sadia, que abriu uma churrascaria em Beijin, a GM, que fechou um contrato de US$ 1 bilhão de quatro anos para exportar a perua Blazer, e a Cacique, que desde 1975 vende café solúvel aos chineses.

Há dois anos o secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Roberto Giannetti, fez uma recomendação em uma palestra na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp): “Vocês estão muito acomodados. Procurem os mercados alternativos e não fiquem atrelados apenas aos mercados dos Estados Unidos, Japão e Europa.” Tornou-se alvo de críticas duras de empresários, engrossadas pelo presidente da entidade, Horácio Lafer Piva. Entretanto, mesmo à revelia, desafiados por Giannetti, os empresários seguiram o conselho. O resultado apareceu no segundo semestre do ano passado: a China passou a ser o quinto mercado para produtos brasileiros, ultrapassando o Japão.

Em 2001, o Brasil exportou US$ 1,9 bilhão para a China, enquanto em 2000 havia vendido US$ 1 bilhão – um explosivo crescimento de 90% em um ano. “O que afirmei em 1999 foi que nós não podíamos permanecer aguardando resultados excepcionais do comércio externo em escritórios refrigerados da avenida Paulista. O mérito agora é dos empresários”, diz Giannetti. A perspectiva hoje, segundo o economista, é ainda mais animadora do que os resultados já obtidos, pois com o acesso da China à Organização Mundial do Comércio os chineses vão se abrir ainda mais. “A admissão da China na OMC representa a queda de tarifas. E as barreiras não tarifárias terão de ser eliminadas”, disse o chefe da Camex.

O otimismo contagia o diretor-geral do departamento econômico do itamaraty, embaixador Valdemar Carneiro Leão, que deixa de lado a tradição contida dos diplomatas para manifestar entusiasmo. A admissão da China na OMC, de acordo com ele, beneficia vários produtos brasileiros, como óleo de soja, café solúvel, açúcar, suco de laranja, automóveis e aviões. O diplomata dá ênfase ao crescimento da economia chinesa, lembrando que em 2000 os chineses alcançaram um superávit de US$ 80 bilhões no comércio com os Estados Unidos. O governo chinês quer manter índices anuais de crescimento superiores a 7% até 2005. O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Benjamim Sicsu, classifica o mercado chinês de “fundamental para o crescimento das exportações brasileiras”.

Entre os principais itens da pauta de exportações brasileiras para a China em 2001 destacaram-se não só os aviões da Embraer (a Sichuan Airlines já comprou cinco ERJ 145, de 50 lugares, e há previsões de novas negociações). A soja (cujas vendas saltaram de US$ 370 milhões para US$ 537 milhões em 2001) e a celulose (de US$ 53 milhões para US$ 114 milhões) brasileira também brilham na China. “Isso para citar apenas estes produtos, que serão somados, nos próximos anos, à carne, ao frango e a outros produtos alimentícios”, disse Giannetti. A muralha, aos poucos, vai caindo.