Uma discussão comercial está prestes a provocar um retrocesso colossal no modo como o brasileiro paga suas despesas. O cartão de débito, emitido pelos bancos e administrado pelas tradicionais empresas de cartão de crédito, não será mais aceito por redes de varejo como o Pão de Açúcar, Carrefour e Sonae. Algumas lojas dessas cadeias já não aceitavam o cartão na semana passada. Os postos de gasolina também ameaçam aderir ao boicote em breve. Cerca de 10% das vendas no comércio são fechadas com o chamado dinheiro de plástico.

O cerco em torno do cartão de débito foi motivado pelas taxas cobradas pelas administradoras dos cartões – as principais são Visa Electron e Redeshop. Para ter o serviço em suas lojas, os comerciantes repassam a essas empresas entre 1% e 5% do valor da compra. Um suposto aumento nessas taxas realizado no ano passado teria despertado a fúria dos supermercados. Ninguém revela os valores envolvidos, mas a origem da disputa não pode ser outra.

O cartão de débito, lançado no Brasil há pouco mais de cinco anos, é um sucesso: tem 70 milhões de usuários. É o tipo de tecnologia que deixa felizes todos os envolvidos. Com ele na mão, o consumidor pode aposentar o talão de cheques. Protegido por senha, não causa danos quando é perdido ou roubado, ao contrário dos cheques. E os bancos são obrigados a emitir um cartão gratuitamente se o correntista abrir mão do talão. Para o comércio, ele é o fim da inadimplência. Todas as transações feitas com o cartão de débito são autorizadas na hora. Ou seja: se o cliente não tiver dinheiro na conta, o sistema recusa o pagamento – ao contrário do cheque, que alguns dias depois pode voltar voando para o comerciante. Para as administradoras, elimina riscos de calote na fatura, como ocorre com o cartão de crédito. É dinheiro líquido e certo. Os bancos também adoram, principalmente porque o custo da operação é até dez vezes mais barato que o da realizada com cheques.

O comércio quer pagar menos pelo serviço. Mas já há quem considere que, no fim das contas, o consumidor bancará as consequências da briga. Se as administradoras não cederem, só restará aos comerciantes repassar o aumento na taxa para os preços. Ou, simplesmente, aposentar a maquininha de leitura do cartão.