Saulo de Castro Abreu Filho não tem papas na língua, exceto quando perguntado se é ou não pré-candidato do PSDB para disputar a Prefeitura de São Paulo. Ele sai pela tangente, mas politiza o tempo todo quando fala de segurança pública. Polêmico, nega a existência de grupos de extermínio e critica a falta de ação de prefeitos e do governo federal para ajudar os Estados a diminuir o ranking macabro da violência. Saulo, que foi promotor, corregedor da administração Covas, diretor da Febem na gestão de Geraldo Alckmin, subiu mais um degrau junto ao atual governador em 2002, ao ser nomeado secretário de Segurança Pública. Saulo prega um confronto direto com países como Paraguai e Uruguai para que se possa combater com firmeza o contrabando de armas, o narcotráfico e a lavagem de dinheiro.

ISTOÉ – Quais as dificuldades para se combater a criminalidade?
Saulo de Castro Abreu Filho –
É fazer com que a polícia limite sua ação ao combate ao crime. Para tudo se aprendeu a acionar a polícia e esse conceito é muito arraigado na sociedade, a ponto de se imaginar que todo debate em torno da violência é pautado exclusivamente sobre o tema polícia. O primeiro passo foi trabalhar com as corporações para que focassem suas ações no combate ao crime, uma vez que são cobradas por esse aspecto, e não por salvarem vidas. Doze helicópteros da PM fazem diariamente o transporte de órgãos para transplantes e ninguém sabe disso. E esse não é nosso papel.

ISTOÉ – A sua relação com a prefeitura do PT é boa?
Saulo –
É boa no sentido de tentar operacionalizar, mas a gente gostaria muito que os guardas municipais fossem para as escolas da periferia e não ficassem na zona central, onde o índice de criminalidade é muito baixo. Agora, não temos uma violência latente. O que se tem é rota de colisão entre pobreza e riqueza somada à concentração de renda. Tem ações mínimas que poderiam ser feitas, como a melhoria do transporte coletivo, da iluminação pública, fechamento de bares e, principalmente, não dar alvará para desmanches. Não tem varinha de condão na área de segurança pública. Quem disser que tem é demagogo e mentiroso. As questões da segurança são resolvidas no varejo, e não no atacado.

ISTOE – O sr. ressalta ter desestruturado o roubo de carga. Mas o tráfico de drogas, segundo analistas, está ganhando corpo.
Saulo –
Esse é sempre preocupante. É um medidor de nível de corrupção da polícia. Se as apreensões são poucas, convém desconfiar. Estamos batendo o recorde em apreensões. Só este ano foram 16,8 toneladas de droga tiradas do mercado. A droga sintética (ecstasy) é hoje o nosso maior problema. Prendemos também um traficante cubano e o maior falsificador de remédios dos EUA. Pegamos o Claudair (braço direito de Fernandinho Beira-Mar) no Paraguai. Ferimos aí uma ou outra norma de direito internacional, mas com o Paraguai eu lamento: não tem acordo.

ISTOÉ – Não valem os acordos internacionais?
Saulo –
E a grande quantidade de armas que entra aqui? Não vejo ninguém indignado com isto, nem o Estado brasileiro se posiciona sobre a questão. Por que temos que manter relações diplomáticas e mercantis com o Paraguai? Não vai ter uma linha dura com relação a isso? Por que temos que fazer movimento de aproximação entre as Farcs e o governo da Colômbia? Eles estão vindo praticar crimes aqui. Pegamos dois grandes homens do Cartel de Calí e entre eles um treinador de piloto das Farcs. O fato é que eles são os grandes produtores de droga e de armamento e nós estamos prendendo gente grande, estrangeiros, os donos da droga.
 

ISTOÉ – O sr. não acha que o dono da droga ainda está um pouco acima deste patamar?
Saulo –
Não. Quem articula as ações do narcotráfico, a lavagem de dinheiro, sim. Esta é a minha discussão com o governo federal, o anterior e o atual. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coafi) tem que ficar no Ministério da Fazenda, que é quem tem o Banco Central, que controla o movimento financeiro deste país. Por que o Uruguai continua sendo um bom lugar para você montar uma offshore e lavar dinheiro? Não consigo entender porque o Estado não se posiciona mais firmemente em relação a essas operações. Se não desidratar o crime organizado, por mais que eu faça aqui, vou sempre enxugar gelo e os outros Estados também.

ISTOÉ – O sr. critica o discurso sociológico sobre violência e pede que Estados, municípios e União façam a sua parte no latifúndio da segurança. Qual é o papel de cada um?
Saulo –
O governo federal tem que passar recursos para os Estados e fechar as fronteiras. Monitorar as pistas clandestinas e até derrubar aviões cheios de cocaína e traficante dentro. Ele tem um papel fundamental no combate ao crime organizado. O Estado brasileiro tem que se posicionar mais claramente com relação a esses países de fronteira. Estamos numa guerra aqui dentro. A nós cabe o combate para valer, investigação, polícia preventiva. Eu recomendo aos prefeitos não gastar dinheiro com bala de revólver e ter tolerância zero com escuridão, favelização, invasões. Tem que criar áreas de lazer, investir pesadamente em transporte público, nessas questões que envolvem cidadania.

ISTOÉ – O sr. está com discurso de prefeito. O sr. é pré-candidato?
Saulo –
Não… A carreira pública foi uma opção de vida desde 1995. Trabalhar no serviço público, seja gestor, corregedor, ou no que vier.

ISTOÉ – O sr. se acha um linha-dura?
Saulo –
Pelo menos é do que me acusam. Mas quem está na esquina
se preparando para fazer um sequestro relâmpago tem que ouvir o
meu recado: “Se fizer o sequestro vamos buscá-lo onde estiver,
seja no Paraguai, seja no raio que o parta.” Preciso desestimular
a impunidade, que provoca um sentimento na sociedade capaz
de levar um comerciante, como o de Guarulhos, a contratar um
PM para matar jovens infratores. É isso que andam chamando de
grupo de extermínio. Extermínio nada!

ISTOÉ – Como o sr. enfrentou as críticas da relatora da ONU com relação aos crimes praticados por policiais em São Paulo?
Saulo –
Falei para ela que a nossa postura com relação aos crimes e à impunidade é de total intolerância. Só este ano demitimos 690 policiais. Em nenhum outro Estado foi feito 20% do que fizemos. Disse a ela que em São Paulo não temos grupos de extermínio.

ISTOÉ – E o que a relatora da ONU veio fazer aqui?
Saulo –
Não sei. Ela disse que recebeu denúncia de que havia um
grupo de extermínio em Ribeirão Preto que há dez anos matou mais
de 100 pessoas. Não há grupos de extermínio. O que há são policiais
que aceitaram matar gente. Isso eu nunca neguei. O resto é discurso panfletário político que não leva a lugar algum.

ISTOÉ – E sobre a polícia de São Paulo como líder
no ranking da tortura?
Saulo –
Eu não dou crédito a esse relatório (do SOS Tortura)
porque falta um grau científico mínimo. Cadê os nomes dos
policiais? Quem são as pessoas que denunciam? A gente pede
e não vem nada. Cadê o relatório?