A Transbrasil foi vendida por R$ 1, na terça-feira 22. O novo dono, o empresário goiano Dílson Prado da Fonseca, 36 anos, assumiu a companhia – ou o que restou dela – e uma dívida de R$ 1 bilhão, que confessa não ter a menor idéia de como pagar. A única certeza da transação, até agora, é que o ex-presidente Antonio Cipriani se livra dos credores e mantém intacto seu patrimônio – que inclui minas de pedras preciosas no Brasil e uma estação de esqui no Colorado (EUA).

A chegada de Fonseca à empresa é um mistério até para os mais experientes profissionais do mercado aeronáutico. Muitos acreditam, inclusive, que Fonseca seria um testa-de-ferro de Cipriani e estaria sendo usado para proteger os bens do ex-presidente, que se tornariam indisponíveis em caso de falência. “Conheci o Cipriani aqui na Transbrasil, na semana passada”, diz o empresário.

Seu histórico no setor se resume à administração de algumas empresas de táxi aéreo de minúsculo porte e de curta vida. Sua última aventura no mercado, a Fly Brazil, está parada desde 2000. O currículo do novo dono da Transbrasil, uma empresa de 47 anos que não voa desde dezembro por não conseguir honrar dívidas com fornecedores, também traz alguns problemas com dívidas. Só em Goiânia, ele é réu em cinco processos abertos por falta de pagamento.

Para tentar acalmar o mercado, Fonseca convocou a imprensa para uma entrevista coletiva na sede da empresa, em São Paulo, na quarta-feira 23. Demonstrando muito sangue-frio em meio ao tiroteio de perguntas – pouquíssimas com respostas convincentes —, Fonseca deu sua versão do negócio. Disse que resolveu assumir a Transbrasil – e não criar uma nova empresa como a Gol, que custou um investimento de US$ 20 milhões – por causa da tradição da marca e do alto nível dos funcionários. “A empresa está há 20 anos sem acidentes. E o que vale são as ‘pessoas humanas’ que trabalham aqui”, diz, prometendo, inclusive, recontratar funcionários demitidos nos últimos meses e pagar os salários atrasados desde setembro. Nem o fato de contar com 100 mil clientes furiosos que compraram passagens e não conseguiram embarcar abala o empresário. Ele jura que vai honrar os bilhetes (em dobro, ressalte-se) assim que assumir definitivamente os 78% de ações que comprou – o restante está dividido entre a Fundação Transbrasil, ainda presidida por Cipriani, e o mercado acionário.

Fonseca afirma que não é milionário e jura que obteve uma linha de crédito de US$ 25 milhões para quitar dívidas de curto prazo e fazer os cinco aviões que restaram na frota da empresa decolarem nas próximas semanas. Não diz quem é o investidor por conta de uma “cláusula de sigilo”. Outros R$ 200 milhões já estariam disponíveis para os próximos 180 dias. Mais uma vez, a origem do dinheiro não é revelada.

Funilaria – Uma parceria com a Dodson, empresa americana de manutenção de aeronaves, teria sido fechada para dar garantias técnicas aos futuros vôos. A Dodson é conhecida por trabalhar com peças recondicionadas, inclusive de aviões acidentados, o que é proibido pela legislação brasileira. Sobre a dívida de R$ 1 bilhão, Fonseca é vago. “Vamos analisá-la e pagar na medida do possível.” Em transações desse porte, a primeira providência dos compradores é realizar uma análise do papagaio. Quanto ao seu próprio histórico de devedor, o empresário diz apenas que seus advogados estão cuidando dos casos. Seu débito com a Receita Federal, segundo ele, “é de apenas uns R$ 1 mil”.

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Uma das poucas certezas de Fonseca é que a Target, empresa de táxi aéreo de Cipriani, vai continuar operando nos hangares da Transbrasil em Congonhas, mediante pagamento de aluguel. Essas instalações eram cobiçadas por todas as outras companhias aéreas pela escassez de posicionamentos no aeroporto.

Durante a entrevista, Fonseca brandia um documento emitido pelo Departamento de Aviação Civil (DAC) que lhe dá autorização para assumir a empresa. Horas depois, o órgão informava que, sim, havia autorizado a transferência do controle, pois o empresário reúne as condições básicas para isso. Mas, para voltar a voar, a empresa ainda precisa apresentar um plano de trabalho e comprovar uma boa saúde financeira para, aí sim, tentar a autorização definitiva. É quase um sonho. Ou melhor, um pesadelo.


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