Chega o verão e o País inteiro tem a mesma idéia: deitar numa praia deserta, longe do relógio e da confusão da cidade. Recarregadas as baterias, na volta para casa o visitante traz quase sempre uma “infração ambiental” no currículo e nenhuma culpa. Quem nunca enterrou na areia uma ponta de cigarro, um papel amassado ou um copo de plástico, torcendo para não ser pego no flagra? Na maioria dos casos, não há intenção de poluir e destruir o planeta. Imagina-se que o mar é grande demais, a Terra é grande demais e uma lata de refrigerante no mato não trará tantos danos assim, mesmo que demore mais de 100 anos para se decompor. Desculpável ou não, a falta de educação obrigou o Brasil a se defender dos turistas.

O Ministério do Meio Ambiente, o Estado e o município do Rio de Janeiro acabam de assinar o Termo de Ajustamento de Conduta Ambiental para salvar a Ilha Grande, uma das maiores reservas de Mata Atlântica do Rio, com 106 praias de águas cristalinas espalhadas por 187 quilômetros quadrados. O termo prevê remoção de lixo, instalação de redes de esgoto, reflorestamento, fiscalização de pousadas e acampamentos, criação de programas de educação ambiental e, talvez, a mudança mais controversa, a limitação do número de turistas. A ilha abriga cinco mil moradores e recebe cerca de dois mil aventureiros nos fins de semana. Paulistas, cariocas, mineiros e argentinos são os frequentadores mais assíduos.

O turismo desordenado e predatório, aliado à ação dos nativos que alteram o ambiente para sobreviver, constitui a maior ameaça à preservação dos santuários ecológicos. Acontece em Morro de São Paulo, na Bahia, Jericoacoara, no Ceará, e Porto de Galinhas, em Pernambuco. Localizada a uma hora e meia de barco do município de Angra dos Reis, Ilha Grande não foge à sina. No Carnaval de 2001, ela recebeu 20 mil pessoas, sem ter estrutura para tanto. Na Praia do Abraão, onde desembarca e hospeda-se a maior parte dos turistas, há quatro valas de esgotos e um lixão sendo tratados pela Prefeitura de Angra. Das 67 pousadas, 27 são ilegais. Há 17 acampamentos irregulares. Alguns abrigam até 400 barracas, aterram o lixo na areia e oferecem um banheiro para 30 pessoas.

Limpeza – Em maio deve começar a primeira etapa do projeto ecológico orçado em R$ 1,5 milhão, que inclui tratamento de esgoto, aquisição de reservatórios para embalar o lixo e de uma barcaça para transportar dejetos para o Lixão do Ariró, em Angra. “Vamos intensificar o trabalho de educação nas escolas, nos barcos, no porto e com os moradores”, planeja o gerente de meio ambiente da prefeitura, Lício da Fonseca. O advogado e ex-deputado estadual Aloisio Oliveira propõe que policiais florestais fardados multem os infratores. “Poderíamos seguir o exemplo de Bonito, no Mato Grosso do Sul, onde o turista vai e volta acompanhado pelo guia”, observa.

Quem busca o prazer da exploração solitária vai chiar. O controle de acesso, previsto para 2003, também promete choradeira. A farra na Ilha Grande hoje é garantida por barcas que atravessam o mar de Angra de domingo a domingo, em três horários ao dia, com lotação de mil passageiros cada uma. Embarcações particulares para até 90 passageiros e pequenas traineiras estão por todos os cantos. O prefeito de Angra dos Reis, Fernando Jordão (PSB), reconhece que é tarefa árdua monitorar o acesso, mas, em ano de eleição, trata de abrandar o discurso. “Vamos primeiro estudar a capacidade de carga da ilha para estabelecer um sistema de controle envolvendo hotéis, marinas, barcos e guarda costeira. Não vamos proibir ninguém. Se a ilha estiver lotada, é bom se preparar para ir e voltar no mesmo dia”, avisa Jordão. O secretário estadual de Saúde, André Corrêa, não descarta a possibilidade de se adotar um imposto ecológico, como o cobrado na ilha de Fernando de Noronha, em Pernambuco, e no Parque Marinho de Abrolhos, na Bahia, para manutenção e limpeza. Em Fernando de Noronha, a taxa de preservação ambiental é progressiva. Começa com R$ 22 no primeiro dia da estadia e em um mês totaliza R$ 1,7 mil. O acesso é por avião, apenas duas companhias operam a linha e no aeroporto o turista preenche uma ficha de controle migratório informando aonde vai e por quanto tempo. Em Abrolhos, há 15 embarcações credenciadas para transportar turistas. Cada uma tem capacidade para 15 passageiros, que pagam R$ 10 para dormir no barco, já que não há hotéis no arquipélago. Como as mudanças em Ilha Grande, por enquanto, se resumem a um compromisso no papel, os moradores dizem que só acreditam vendo. Mas torcem pelo projeto: é a forma de manter intacto o paraíso onde vivem.

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