Não deu tempo para enxugar as lágrimas. Em menos de cinco meses o PT perdeu dois prefeitos de grandes cidades e estrelas ascendentes: Toninho, de Campinas, e Celso Daniel, de Santo André. Entre um crime e outro, uma sucessão de ameaças de morte e atentados, especialmente em São Paulo, onde o PT governa 37 cidades, instalou-se o pavor dentro do partido. “É desesperador. Não sabemos quem está querendo nos matar”, desabafou o prefeito de Embu (SP), Geraldo Cruz, que em novembro sofreu um atentado à bomba e passou a andar com um PM 24 horas. “Ainda não tenho colete à prova de bala.” Mas há quem já tenha providenciado isso, como Antonio Palocci, prefeito de Ribeirão Preto, alvo em potencial. Palocci reforçou a segurança, mas prefere não falar nisso. “Tenho certeza que está em curso uma operação contra o PT. Mas não somos só nós os ameaçados, e, sim, toda a sociedade.” Também está na mira Elói Pietá, prefeito de Guarulhos, que integrou a CPI do Narcotráfico na Assembléia paulista. “Das quatro maiores cidades administradas pelo PT no Estado (São Paulo, Guarulhos, Santo André e Campinas), dois prefeitos já morreram”, disse Pietá, que armou a Guarda Municipal.

“Moro em casa e pretendo mudar para um apartamento”, contou o prefeito de Bebedouro (SP), David Peres. Ele foi um dos vários que receberam, em novembro, cartas da suposta Frente de Ação Revolucionária Brasileira (Farb), que assumiu o assassinato de Toninho na primeira correspondência. O grupo tenta passar a idéia de que seria de extrema esquerda, o que não é levado a sério pelos serviços de inteligência. No PT, a convicção é de que o crime organizado está por trás das ameaças. Em vários casos, após o envio das cartas, aconteceram atentados. Celso Daniel havia recebido duas cartas. Na noite de sábado 19, o presidente nacional do PT, deputado José Dirceu, recebeu um e-mail: “Não despreze a Farb. Eu estou com o prefeito de Santo André e não vou matar ele. Nós avisamos a ele. Ele não acreditou. Vamos deixar ele vivo para mostrar nossa força. Mas da próxima vez não terá oportunidade.” No dia seguinte, o corpo de Celso Daniel foi encontrado. Na terça-feira 22, o deputado e pré-candidato ao governo de São Paulo José Genoíno recebeu três e-mails da Farb. Depois do crime, chovem ameaças e o terror aumenta no PT.

Os petistas alertaram o ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, no dia 6 de dezembro, de que estavam na mira do crime organizado e pediram investigação sobre a Farb. Entregaram relatório sobre a violência contra o PT de 1998 até 2001: 12 assassinatos, 15 atentados, e 52 ameaças de morte. A situação é tão grave que a Agência Brasileira de Informações (Abin) passou a investigar os assassinatos e ameaças de morte. “Cumprimos nossa obrigação e alertamos. O governo precisa acordar antes que seja tarde. É preciso derrotar o crime organizado, que está infiltrado nas instituições”, afirmou Dirceu. A Anistia Internacional defendeu a investigação dos ataques políticos ao PT. A entidade recebeu, há duas semanas, relatório da Comissão de Direitos Humanos da Câmara sobre a violência política e cópia de matéria de ISTOÉ, intitulada Cheiro de Pólvora, publicada em dezembro, sobre os ataques, ameaças e assassinatos contra o PT.

Ameaças concretizadas

Desde setembro, lideranças políticas do PT estão na mira do crime:
CAMPINAS – Na noite de 10 de setembro o prefeito de Campinas Antônio da Costa Santos, o Toninho, é morto com quatro tiros. Campinas é rota do crime organizado. A suposta Farb assumiu a autoria do assassinato em carta enviada em novembro.

RIBEIRÃO CORRENTES – No dia 11 de novembro a fazenda de Aírton Montanher foi invadida por três homens armados. Eles queriam “buscar a cabeça” do prefeito. “Vamos pegar essa petezada”, ameaçaram. A polícia evitou o sequestro, mas eles fugiram. Ribeirão Correntes encabeça a lista das cidades que constam nas duas cartas da Farb. Na segunda carta, o aviso: “Só coincidimos o primeiro crime com a primeira cidade para vocês verem que não estamos de brincadeira.” Com quatro mil habitantes, a principal atividade econômica da cidade é a cafeicultura.

CATANDUVA – No dia 12 de novembro o prefeito Félix Sahão Júnior recebe a carta da Farb. À noite, homens numa Cherokee dispararam tiros em sua casa, habitada pela sogra. Catanduva, com 107 mil habitantes, foi eleita pelo Instituto Fernand Braudel a cidade mais tranquila do Brasil, por seus baixos índices de violência.

BEBEDOURO – O prefeito David Peres Aguiar recebeu três cartas. A primeira foi no dia 13 de novembro. Logo depois, colocaram uma cruz na frente da sede do PT municipal e seu sogro recebeu ameaça por telefone. Na cidade, há grupos de periferia que praticam violência. Além disso, aumentou o consumo de crack na região.

EMBU DAS ARTES – O prefeito Geraldo Cruz já registrou sete boletins de ocorrência referentes às ameaças de morte por cartas. Mas nenhum caso foi esclarecido. Desde 1997, Cruz denuncia mau uso de dinheiro público na prefeitura e na Câmara, onde 18 dos 19 vereadores foram afastados em 1999. Só ficou um do PT. “Em 27 de novembro recebi o recado de que eu corria risco de vida porque havia contrariado interesses de perueiros e taxistas. Na mesma noite, colocaram uma bomba na minha casa e na casa do meu secretário de governo”, contou.