A expressão inglesa home care, ao pé da letra, quer dizer cuidado em casa. Significa ter assistência médica em domicílio, um sistema de atendimento que cresce em vários países. No Brasil, existem diversos projetos na rede pública, e cerca de 250 empresas particulares, de vários portes, disputam um lugar ao sol. No entanto, por aqui o setor ainda está se organizando e o serviço é pouco conhecido. Essas razões explicam o fato de que, apesar do mercado brasileiro ser avaliado em cinco milhões de usuários potenciais, apenas 500 mil pessoas usam
a assistência.

A boa nova é que a regulamentação da atividade prometida pelo governo deve ficar pronta até maio. Não é sem tempo. Os próprios profissionais da área admitem a necessidade de especificar os serviços prestados para diminuir os atritos entre usuários, planos de saúde e prestadoras de serviço, comuns na hora da solicitação. Uma das dificuldades é entender a que se tem direito. “O nome home care é usado para vários tipos de atendimento domiciliar”, explica Luiza Dal Ben, diretora da empresa líder do setor, a Dal Ben. Há dois tipos principais de assistência incluídos na categoria home care. O primeiro é a chamada internação domiciliar e se caracteriza quando o caso exige cuidados semi-intensivos (incluindo equipamentos como camas hospitalares e respiradores). O outro consiste em esquemas de plantão de enfermeiras e visitas de médicos e fisioterapeutas.

O problema é que nem sempre essas diferenças ficam claras. Se não forem devidamente esclarecidas em contrato com os planos de saúde, o cliente pode achar que tem direito a uma mini-UTI em casa quando, na verdade, conta apenas com uma visita de um enfermeiro, por exemplo. Uma das consequências dessa falta de critérios é a oscilação da qualidade dos serviços. A dona-de-casa Efigênia Marcelino, de São Paulo, passou por essa experiência. Ela precisou de cuidados domiciliares para o marido, Antônio, paralisado depois de um derrame. “A primeira empresa que nos atendeu era ruim. A enfermeira se recusava a dar comida na boca para meu marido. Eu voltava às pressas do trabalho para fazer isso”, lembra. A situação mudou quando a assistente social da empresa empregadora de Antônio, que custeia o serviço, a informou que era possível trocar de prestadora. “Agora somos bem atendidos e estamos mais tranquilos”, diz.

A arte-educadora Nani Benute, 42 anos, também conhece o lado bom e os problemas associados ao home care. Nani guardara uma impressão positiva do atendimento dado a sua mãe no começo do ano passado. Pouco antes de dona Iracema, 83 anos, ter alta do hospital onde fora socorrida de um derrame, a família foi avisada de que o plano de saúde da idosa dava direito ao home care. “Foi um alívio, porque já tínhamos perdido o sono só de pensar como cuidar direito da mamãe, que voltava para casa sem andar”, lembra Nani. “Aprendemos o que fazer com o pessoal do home care”, comenta a outra filha, Edna. Recuperada com sessões de fisioterapia e de fonoaudiologia (paga pela família), dona Iracema voltou a andar, a falar e a sorrir. Meses depois, Nani precisou de um home care para o marido, o músico Maurício Lessa, 40 anos. Ele ficou 60 dias hospitalizado após um acidente que deixou fraturas múltiplas e, de acordo com o médico, tinha condições de receber cuidados semi-intensivos em casa. Seria, inclusive, uma forma de reduzir as chances de infecção hospitalar. Nani solicitou o serviço e foi informada pela atendente da Marítima – plano de saúde de Maurício – de que o home care da empresa era direcionado para idosos, mas submeteria o pedido a uma avaliação. Resposta errada, pois a empresa informou a ISTOÉ que o contrato de Maurício não dá direito ao home care. No entanto, a desinformação da atendente criou falsas expectativas, aumentando o stress da família. Infelizmente, esse tipo de equívoco é bastante comum. “Muitos consumidores se queixam de terem recebido informações erradas de atendentes”, diz Lúcia Magalhães, do Procon de São Paulo.

No setor público, a assistência domiciliar toma outro rumo, dando prioridade a portadores de doenças crônicas e a idosos. Trata-se de um modelo difundido pela Organização Mundial de Saúde. “A população de idosos e o número de pessoas com doenças crônicas e degenerativas crescem. Por isso, consideramos que esse tipo de home care é cada vez mais importante para dar mais conforto a essas pessoas e orientar quem convive com elas quanto aos cuidados necessários”, disse a ISTOÉ a diretora da entidade para a área de home care, Miriam Hirschfeld. Diversos programas seguem essas diretrizes. Há seis anos, pacientes de Aids participam do programa de Assistência Domiciliar Terapêutica, ligado aos Centros de Referência e Treinamento em Aids. Eles são atendidos em casa por uma equipe multidisciplinar, recebem remédios e transporte para a realizacão de exames. Além disso, o programa treina pessoas para desempenhar a função de cuidadores. Os resultados são positivos. “O atendimento domiciliar melhora a qualidade de vida do paciente”, sustenta a psicóloga Ester Affini, da Pontifícia Universidade Católica, autora de uma tese sobre o assunto.