Talvez a proposta do encontro DNA Brasil – organizado pelos empresários Ricardo Semler e Horácio Lafer Piva – de “se debruçar sobre o que deve ser feito para que o País tenha um futuro melhor” seja ambiciosa demais. Talvez a intenção seja mesmo a de provocar. Mas o fato é que o resultado final do evento, que reuniu 50 brasileiros notáveis das mais variadas áreas, na semana passada, em um luxuoso hotel em Campos do Jordão (SP), causou certo desapontamento. Afinal, estiveram presentes pessoas de relevância, como os economistas André Lara Resende e Luiz Carlos Bresser-Pereira; o educador Cândido Mendes; o diplomata Celso Lafer; o padre Júlio Lancelotti e o filósofo José Arthur Gianotti, entre outros intelectuais. O objetivo de alcançar um “denominador comum” que se transformasse em propostas viáveis e concretas para o desenvolvimento do Brasil esbarrou justamente na principal qualidade do encontro: a heterogeneidade do grupo reunido. “Não devemos buscar o consenso, o grupo é muito diverso”, pediu o líder do Movimento dos Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, insatisfeito com o esforço dos organizadores em buscar a unidade. O próprio tema central escolhido pela organização – “Somos ou estamos corruptos?” – deixou evidente a discordância do grupo mais Porto Alegre (sede do Fórum Social Mundial) do que Davos, a cidade suíça do Fórum Econômico Mundial.

“Elevar a corrupção a esse nível de importância é inadequado. O importante é a educação”, afirmou o arquiteto Joaquim Guedes. O biólogo Victor Nussenzweig chegou a dizer que tudo aquilo “era perda de tempo. Afinal, corrupção não é causa, é conseqüência”. Segundo os organizadores, a intenção do evento era justamente promover a discussão, também com toques de polêmica. “Queremos construir um outro tipo de fórum, que não existe no País. Aqui, ou é setorial ou é temático. Os grandes temas não cabem sozinhos em nenhum fórum”, justificou Semler. De fato, a polêmica correu solta. Incomodado com a escolha do sujeito da pergunta do tema central (nós), o jornalista Paulo Markun indagou: “Nós quem, cara pálida? Na linha Penha-Lapa de ônibus de São Paulo não existe corrupção. Eles não
têm oportunidade para isso.” Talvez tenha faltado ainda, mesmo com a presença
dos cinco brasileiros do povo, uma visão mais profunda da realidade do País.

Afinal, em uma plenária, quando se discutia corrupção, havia um questionamento geral sobre declarar ou não um imóvel vendido a R$ 450 mil pelo preço venal. Coube ao brasileiro real Antônio Dias dar um choque de realidade: “Onde moro custaria R$ 20 mil.” Com isso, o documento final do encontro (disponível em www.dnabrasil. org.br), ainda que tenha adquirido um lado social (“educação e criação de empregos são instrumentos de combate à corrupção”), oscilou entre propostas eleitorais (“instituir fidelidade partidária e voto distrital misto”) e propostas gerais e vagas, como “redução drástica da burocracia estatal e simplificação do sistema tributário”. Como disse um “brasileiro real”, tudo muito bonito e teórico, mas precisa sair do papel.