No ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se pode condenar a falta de sinceridade. Desde que entregou a faixa presidencial a Dilma Rousseff, ele sempre lamentou a dificuldade para “desencarnar” da Presidência da República. Para alfinetar o eterno rival FHC, Lula dizia ainda que seria o melhor “ex” que o Brasil já conheceu, mas o fato é que está se convertendo, aos poucos, no ex-presidente mais presidente de todos os tempos. Resumindo, ele reencarnou.

Tudo ficou escancarado na última semana. A um só tempo, Lula assumiu a gestão da crise em torno da Casa Civil. Com a autoridade de quem realmente manda no País, ele decretou: Antônio Palocci fica. E disse ainda, num jantar com senadores, que “não se pode pôr o Pelé no banco de reservas”. Oficialmente, Lula falava de Palocci, mas houve quem desconfiasse de que falasse em primeira pessoa. Afinal, o ministro Gilberto Carvalho também já se referiu a Lula como um Pelé no banco de reservas – e louco para entrar em campo, marcar seus gols e correr para a torcida.

Dias depois, lá estava Lula novamente reunindo-se com os dois principais líderes do PMDB: Michel Temer, vice-presidente da República, e José Sarney, presidente do Senado. Com a sabedoria e a experiência de quem já enfrentou crises políticas bem mais pesadas, Lula deu um conselho bem claro a Dilma: o de que entregasse rapidamente os cargos nos ministérios e nas estatais aos aliados. E “aliados” não são apenas os partidos da base, como PMDB, PP e PSB. Isso vale para o próprio PT, pois na sigla de Lula e Dilma também há muita gente soltando rojões e comemorando o inferno astral de Palocci. A frase mais ouvida nas hostes petistas é sintomática: “Há males que vêm para o bem.”

O resumo da ópera é simples. De agora em diante, o Executivo terá de ser mais humilde e descer do pedestal. Será obrigado a governar com o Congresso e, como dizia Michel Temer, a “repartir o pão” com os aliados. Semelhante ao que ocorreu no próprio governo Lula, quando o então capitão do time, José Dirceu, foi alvejado pelas primeiras denúncias. Embora tenha caído apenas em 2005, depois do escândalo do mensalão, ele começou a sangrar um ano antes, no caso Waldomiro Diniz.

Tanto no passado como agora, a regra é a mesma. O Congresso tem mais apreço por ministros frágeis, mantidos no cargo graças aos favores dos parlamentares, do que por superministros. Lula já sabe disso e, reencarnado, passou a mensagem a Dilma. O pão será repartido e a conta final será mais cara.