"O modelo de transporte público no Brasil está falido e este é o momento de colocarmos a questão na agenda de prioridades sociais do País.” Com esse discurso, o prefeito de Salvador, Antônio Imbassahy (PFL), liderou e foi anfitrião de um encontro com 11 prefeitos de capitais na quarta-feira 24. Durante duas semanas, Imbassahy telefonou para administradores municipais de várias capitais e cidades com mais de 200 mil habitantes convidando-os a elaborar uma proposta de redução das tarifas de ônibus. Se de um lado os empresários do setor exigem aumento para investir, de outro está a população. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 50 milhões de brasileiros não têm dinheiro para utilizar nenhum meio de transporte. Os cofres municipais não suportam subsidiar o setor sem apoio estadual ou federal. A única saída, portanto, é pedir socorro a Brasília.

Da discussão entre prefeitos saiu uma carta com propostas para viabilizar a redução das tarifas com apoio federal. As principais medidas são: reduzir 50% do preço do óleo diesel para empresas de ônibus, tratar os insumos de transporte como itens da cesta básica, que têm tributação diferenciada, e aplicar 75% dos recursos da Cide, o imposto sobre os combustíveis, no Fundo Nacional de Transportes. Dessa verba, os prefeitos querem que 25% sejam reservados para subsidiar o transporte público. Um grupo formado por Imbassahy e mais cinco prefeitos foi a Brasília na quinta-feira 25 para entregar o documento aos parlamentares, no lançamento da Frente Nacional de Transporte Público, e ao ministro da Casa Civil, José Dirceu.

Desde o final do mês de agosto, Imbassahy enfrenta manifestações
de estudantes que exigem a redução da tarifa de ônibus – no começo
de setembro, a prefeitura aumentou a passagem, de R$ 1,30 para
R$ 1,50. De calça jeans e camiseta branca, com poucos cartazes nas mãos, os estudantes sentam no asfalto para impedir o trânsito em avenidas de grande movimento. Numa dessas, no último dia 3, o estudante Marcos Chaves de Jesus, 13 anos, que segundo o pai tinha
ido só olhar a manifestação, morreu atropelado por um ônibus que tentava passar por uma via interditada pelos estudantes, no centro de Salvador. Depois de negociar com as lideranças do movimento, o prefeito aumentou a cota dos passes escolares (que custam a metade do preço) e liberou o desconto para ser usado também em finais de semana, nos feriados e nas férias. Mas ainda não foi suficiente. Os estudantes continuam nas ruas. O aumento de tarifas na capital baiana tornou-se
um verdadeiro transtorno para Imbassahy, que agora se encontra numa sinuca de bico. “Se você não corrige a tarifa, não tem como os empresários investirem. Resultado: ônibus sem manutenção, motoristas mal pagos, segurança em risco e queda na qualidade dos transportes.
Só que, por outro lado, passagem muito cara tira do cidadão o direito constitucional de ir e vir”, salienta o prefeito.

Não é só em Salvador que acontecem manifestações contra o aumento de tarifas de transportes. No dia 2 de junho, manifestantes depredaram 22 ônibus em protesto pelo reajuste da passagem em Contagem (MG). Quase três meses depois, no dia 5 de setembro na cidade de São José dos Campos (SP), cerca de mil estudantes secundaristas fizeram um ato pelo passe livre e contra um possível aumento da tarifa de R$ 1,60 para R$ 2,80. Em Florianópolis (SC), a história se repete. Lá, manifestantes foram às ruas para reclamar do anúncio de aumento das passagens, que podem subir de R$ 1,50 para R$ 1,90. A prefeita da capital catarinense, Ângela Amin (PP), esteve na reunião em Salvador, assim como
César Maia, do Rio (PFL), Fernando Pimentel (PT), de Belo Horizonte, Cassio Taniguchi (PFL), de Curitiba, e Cícero Lucena (PSDB), de João Pessoa, que também enfrentou protestos na capital paraibana nos
últimos meses, entre outros.

Os prefeitos concordam que as propostas apresentadas em Brasília são capazes de viabilizar a redução das tarifas. “Se o preço do diesel para ônibus urbanos cair para a metade, por exemplo, é possível baixar em 10% o valor das tarifas”, calcula César Maia. Em contrapartida à perda
de receita para os cofres federais, com a baixa do óleo o grupo chegou
a admitir um reajuste de 3% do valor da gasolina nas bombas. Teoricamente, quem tem carro ajudaria a bancar a passagem de quem não tem. “O diesel subiu 100% nos últimos dois anos. Só o combustível representa 20% da tarifa dos ônibus”, explica Imbassahy. A outra proposta é usar parte da verba da Cide para investir em transporte público. Só em 2002, o governo federal arrecadou R$ 9 bihões com a contribuição. Em geral, esse dinheiro é destinado a obras e investimento em rodovias. O prefeito Imbassahy brinca, justificando a proposta de usar a verba para investir em transporte urbano: “A Cide é como cabelo de freira. Todo mundo sabe que existe, mas ninguém vê.”
 

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