Desprezada e vítima de preconceito por décadas, chegou a vez de a cachaça trocar o botequim pelas galerias de arte. A Espírito de Minas, uma das melhores marcas do País, é a responsável pela transfiguração. A destilaria de São Tiago, cidadezinha colada à histórica São João Del Rey, lançou na ExpoCachaça, que começou na quinta-feira 18 e termina no domingo 21, em São Paulo, a série especial Artistas brasileiros. Inspirada em iniciativas como a da vinícola francesa Mouton-Rotschild – que homenageia artistas famosos em seus rótulos –, a Espírito convidou renomados pintores brasileiros para darem sua interpretação à famosa igrejinha que ornamenta suas garrafas.

O primeiro rótulo da série saiu dos pincéis do artista plástico cearense Aldemir Martins. O pintor ganhou notoriedade ao retratar paisagens e o sertanejo nordestino com muita cor e alegria. Aldemir criou um desenho vibrante, em que predominam os tons amarelo, verde e azul. Na parte inferior da pintura, reprodução de um óleo sobre tela, destaca-se um canavial que dá a impressão estar sustentando a edificação religiosa. O matiz harmoniza com o vibrante dourado da bebida. “Para mim, essa pintura foi uma viagem à minha infância. Fui criado no Vale do Acarape, uma região canavieira no Ceará. Em decorrência disso, a cachaça sempre fez parte da minha vida. E até hoje eu dou
meus goles”, diz o pintor, às vésperas de completar 81 anos. Depois
de Aldemir, que terá sua pintura na série por dois anos, será a vez do artista plástico paulistano Gustavo Rosa dar o seu tom às garrafas da marca. A única recomendação é que seja preservada a igreja, que é o verdadeiro espírito da destilaria.

Mas a arte dessa série especial não se resume apenas aos delicados traços de Aldemir Martins. A bebida recebeu um tratamento diferenciado. A cachaça da Artistas brasileiros é uma reserva especial. O líquido fica seis anos envelhecendo em barris de carvalho. Na tradicional, esse processo leva pouco mais de vinte e quatro meses. O longo período
de descanso suaviza a bebida e confere a ela um tom mais amarelado
que o da outra pinga da casa. Como toda jóia rara e preciosa,
essa “marvada” será para poucos. Apenas dez mil garrafas serão comercializadas. Todas elas serão numeradas: irão da 0001 a 9999. A venda será feita em estabelecimentos escolhidos a dedo. Cachaceiros,
no melhor sentido, de São Paulo e Brasília serão os primeiros a ter o privilégio de prová-la. Ao contrário do sabor, o preço promete ser amargo. Na ExpoCachaça, cada unidade saiu por R$ 50. Para alguns, pode parecer salgado. Mas é bom lembrar que pinga muito barata costuma dar dor de cabeça. Afinal, essa não é uma cachaça só para beber. É para se ver também. E alguém com enxaqueca teria dificuldade para apreciar o belo traço de Aldemir. Ou não?


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