A criatividade é um dos quesitos mais solicitados em entrevistas de emprego. Hoje, todas as empresas querem em seus quadros profissionais que possam encontrar saídas inéditas tanto para os conflitos internos da companhia quanto para os desafios externos do mercado. Mas será possível desenvolver esta qualidade? Para os especialistas da Universitá dell’ Immagine, de Milão, na Itália, sim – desde que a percepção do mundo seja aguçada. Ou seja, os outros sentidos, além da visão e da audição, que são os mais utilizados, devem ser trabalhados para se obter novas possibilidades de linguagem. A proposta foi trazida a São Paulo pelo Senac, que promoveu, há duas semanas, o evento Criação e Sentidos, com seminários e workshop desenvolvidos pela universidade. A intenção é formar no Brasil profissionais multiplicadores da metodologia criada pela escola, que dá treinamento a quem deseja potencializar a criatividade no trabalho e na vida. A universidade italiana faz parte da Fundação Indústria, comandada por Fabrizio Ferri, um renomado fotógrafo publicitário, e é financiada por grandes empresas como a rede inglesa de cosméticos The Body Shop. No curso de dois anos, experimentações e exercícios – como descobrir temperos e ingredientes de receitas e andar descalço por um tapete especial para identificar materiais e texturas – “acordam” os sentidos dos alunos. A idéia é que só se pode criar algo diferente se todas as “antenas” estiverem ligadas para aumentar o campo de percepção e o entendimento das coisas comuns. Graduada em música, a diretora-geral da universidade, Tania Gianesin, 37 anos, explica como nasceu a universidade e seus princípios básicos.

ISTOÉ – O que é ser criativo?
Tania –
É ser sensível e curioso em relação aos estímulos, reagir a eles e produzir um resultado diferente, seja ele uma idéia, uma atmosfera, um projeto, um produto, um contexto. Não necessariamente inovador, mas adequado às necessidades do momento.

ISTOÉ – Como nasceu a universidade?
Tania –
Nosso fundador e presidente é Fabrizio Ferri, um fotógrafo italiano que sempre se preocupou com o significado da imagem e como ela se construía. Ele não é só fotógrafo. É também músico, trabalhou com moda e sempre achou que a imagem é algo complexo. Em uma frase, podemos dizer que a imagem é a harmonia resultante da integração dos cinco sentidos. Nós não fomos os primeiros a discutir a importância dos sentidos para a criatividade, mas talvez os primeiros a pensar em um processo educativo, uma metodologia baseada na capacidade sensorial.

ISTOÉ – Pode-se dizer que conscientização dos sentidos é olhar o que se vê todo dia de modo diferente? É sair do piloto automático?
Tania –
Um exemplo pode ilustrar isso. Certa vez, para fotografar um perfume, Fabrizio disse ao diretor de arte que queria experimentá-lo. O diretor não entendeu. Fabrizio disse: se devo fotografá-lo, preciso conhecer um pouco sobre ele, não por prazer, mas para dar coerência à imagem. Essa é a idéia. Nós nascemos com os sentidos apurados e aos poucos priorizamos alguns – hoje principalmente a visão e a audição. Ao trabalharmos com pessoas privadas de alguns sentidos, tentamos entender como eles percebem o mundo. Uma pessoa cega não substitui a vista pelo tato, mas aguça esse sentido e cria outro senso, mais complexo. Ela cria significados diferentes para o tato.

ISTOÉ – Os cursos são direcionados a que tipo de profissionais?
Tania –
O ideal seria que todos fossem criativos. No entanto, a
escola atende principalmente pessoas que tenham o processo de
criação em seu trabalho, como publicitários e designers. Mas uma
famosa universidade de economia da Itália nos procurou para melhorar
a sensibilidade nos relacionamentos e o gerenciamento de recursos humanos. Isso aprimora a comunicação e faz com que todas as
cadeias da indústria funcionem bem.

ISTOÉ – Também acontece de algumas pessoas se redescobrirem profissionalmente depois do curso e mudarem de área de atuação?
Tania –
Muitas pessoas mudam de profissão depois de aguçar sua sensibilidade porque as percepções, antes adormecidas, colocam em evidência as emoções. Em geral, depois disso dificilmente alguém consegue trabalhar se não tiver paixão pelo que faz.

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ISTOÉ – É verdadeira a idéia de que uma pessoa criativa é necessariamente avessa a regras, horários e disciplina?
Tania –
Não, absolutamente. O criador parte da essência, que pode
até ser o caos e a desordem, mas o ato de criar exige disciplina
e empenho para organizar informações, além de dedicação para
pesquisas sobre o objeto de criação.

ISTOÉ – Costuma-se dizer que bons resultados vêm de muita transpiração e apenas um pouco de inspiração. Seria isso?
Tania –
Exatamente.
 


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