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FRUTOS DA IMAGINAÇÃO Patrícia Osses (acima), Nino Cais e João M odé (abaixo) têm a casa como tema

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JOHN’S HOUSE – PATRÍCIA OSSES/ Galeria Leme, SP/ até 20/6

INVISÍVEIS – JOÃO MODÉ / Fundação Eva Klabin, RJ/ de 24/5 a 25/6

DÉCOR – NINO CAIS/ Galeria Virgílio, SP/ até 6/6

Para o dramaturgo John Osborne (1929- 1994), o jardim e a natureza circundante de sua casa compunham a paisagem mais bela de toda a Inglaterra. O bosque de Shropshire e a casa do século XVIII – que teve o escritor britânico como seu último morador e estava fechada há cinco anos – foram habitados pela artista chilena Patrícia Osses, por dois meses. A artista foi bolsista da Arvon Foundation, que oferece residências de criação literária a escritores.

A partir de sua vivência do local e do estudo da obra do autor de "Look Back in Anger" (1956), marco do teatro moderno britânico, ela ocupou a casa abandonada construindo situações fictícias: fotografou seus espaços vazios através do reflexo de um espelho côncavo e passeou pelos cômodos e pelas trilhas dos bosques deixando no caminho um rastro de 50 metros de seda violeta. A vivência da casa gerou três ensaios fotográficos e um vídeo que hoje estão expostos na Galeria Leme, em São Paulo.

O artista carioca João Modé teve uma experiência similar à de Patrícia, ao habitar a casa em que a colecionadora carioca Eva Klabin (1903 – 1991) morou durante 30 anos, na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Artista convidado do Projeto Respiração – que propõe a artistas contemporâneos a produção de obras ou intervenções a partir do contato com a coleção de mais de mil peças guardadas na casa-museu de Eva Klabin -, Modé morou por quase duas semanas em um dos sótãos que estavam fora do circuito de visitação. "Nesse lugar, João Modé se permitiu conviver com a ambiência da casa para se deixar levar pelo seu imaginário e descobrir novas paisagens físicas e mentais. Trouxe de volta os sons, os discos que ela escutava; os aromas, seu perfume predileto (Joy, de Jean Patou) e sua flor predileta (antúrio).

Experimentou o que é viver na penumbra, já que Eva Klabin trocava o dia pela noite", conta o curador Márcio Doctors. Além disso, em sua intervenção "Invisíveis", o artista destacou todos os objetos duplos encontrados na casa, evidenciando o espelhamento como um dos hábitos de Eva Klabin.

Já a exposição "Décor", de Nino Cais, não resgata a memória de uma casa específica, mas trabalha com a ideia da casa como um fruto da imaginação. Ele divide a Galeria Virgílio, em São Paulo, em três ambientes: quarto, sala e jardim. Na sala, revestida de papel floral, estão expostas fotografias em que o artista se relaciona física e afetivamente com alguns objetos domésticos: flores, cabaças, cestos, esponjas.

Em operações de transmutação, incorpora objetos de decoração. "A sala dos fundos, mais intimista, simula um quarto, escritório ou gabinete, onde ficam em exposição trabalhos em papel: desenhos e colagens mais delicados, além de fotos que mostram o artista concentrado, equilibrando-se sobre objetos de vidro", diz a curadora Thaís Rivitti. Nesse ambiente de vistas de interiores, a televisão é a janela para o mundo. E o jardim da casa imaginária de Nino Cais é a paisagem de um encarte de vendas imobiliárias.

Circuitos no mundo

A performance da bruxa

 

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Última parada antes da Bienal de Veneza, onde realizará uma obra inédita, o artista carioca Cildo Meireles esteve na semana passada na cidade de Metz, leste da França, instalando sua obra " La Bruja" (1977-2007), parte da exposição "À Contre-corps – Oeuvre de Dévoration". Mesmo que desde os anos 1960 tenha experimentado com os mais diversos materiais e estratégias, Meireles nunca foi reconhecido como um artista da performance, já que essa modalidade artística prevê o corpo como o foco da ação.

Mas sua passagem por Metz altera sensivelmente essa condição. Independentemente de ser realizada diante de um público ou não, uma performance pode ser definida como uma obra artística em que se combinam o gesto e a intenção de ocupação de um espaço (às vezes de forma improvisada). E isto é, precisamente, o que acontece na instalação da obra "La Bruja" (foto) no espaço 49 Nord 6 Est – Frac Lorraine, em Metz.

Meireles não fez sua instalação em público, mas deixou os rastros de sua exploração do espaço tortuoso e labiríntico do edifício medieval onde está situado o 49 Nord 6 Est – Frac Lorraine. Pronunciando- se sobre o muro da fachada, invadindo tubulações, preenchendo o pátio interno, subindo as escadas da torre, perseguimos os quatro mil quilômetros de barbantes negros, antes que esse percurso termine inesperadamente em uma vassoira encostada à parede, ao fundo da grande sala de exposição. Esta montagem de "La Bruja" pode ser interpretada como um acontecimento performático, já que se dá de maneira imprevista, ocupando o prédio como um corpo vivo.

Segundo a curadora Béatrice Josse, a exposição foi construída em torno do trabalho de Meireles, que se cerca de três obras de duas outras artistas brasileiras. "Canibalismo" e "Baba Antropofágica" são registros fotográficos de performances realizadas por Lygia Clark, com a participação de estudantes da Sorbonne, em Paris, em 1973, e "In-Out Antropofagia" é um vídeo de Ana Maria Maiolino, de 1973, que pertence à coleção do Fundo Regional de Arte Contemporânea (Frac).

Além de circundar Meireles, a mostra articula-se também em torno do "Manifesto Antropofágico" (1928), de Oswald de Andrade. Mas atrás dos barbantes da bruxa brasileira, escondem-se outras tradições locais: uma escolha do Frac Lorraine por privilegiar uma arte feminina ou feminista – e também por obras "imateriais" – e a presença sugerida de Joana d’Arc, heroína da região de Lorraine.