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MARKETING Secches e Furlan mostram a marca da Brasil Foods na camisa do Corinthians

O Lequetreque, frango-mascote da Sadia, agora está abraçado ao coração com dois perdizes, símbolo da Perdigão. Depois de uma longa negociação, nasceu a maior produtora mundial de carnes processadas: a Brasil Foods, fruto da fusão da Perdigão com a Sadia. Foram cinco meses de discussões, que envolveram o BNDES e exigiram muito jogo de cintura. Do lado da Perdigão, que é controlada por fundos de pensão, sentou-se à mesa o megaexecutivo Nildemar Secches, que já foi diretor do banco de desenvolvimento estatal. Pela Sadia, o negociador foi Luiz Fernando Furlan, ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que defendeu os interesses das famílias Fontana e Furlan. O mercado acompanhou atento as idas e vindas, que acabaram pondo sob o mesmo comando marcas consagradas, como as margarinas Qualy e Doriana. A nova gigante surgiu na terça-feira 19 com 42 fábricas, 119 mil funcionários, mais de R$ 10 bilhões em exportações por ano, 42% do que produzem, e faturamento anual líquido de R$ 22 bilhões. Trata-se da segunda maior indústria alimentícia nacional e a terceira maior exportadora brasileira, atrás somente de Vale e Petrobras. "Estamos criando um campeão que será o maior exportador de carne do mundo", disse Furlan, que dividirá a presidência do conselho de administração da Brasil Foods (BRF) com Secches. "A época das alfinetadas entre as duas empresas acabou. Agora é só amor", acrescentou Secches, mostrando-se afinado.

"Estamos criando um campeão que será o maior exportador de carne do mundo"
Luiz Fernando Furlan, da Sadia

A Sadia, que é uma das cinco empresas de melhor reputação do mundo de acordo a revista inglesa The Economist, será o carro-chefe da Brasil Foods. A Perdigão levará seu eficiente modelo de gestão e o CNPJ. E ambas já incorporaram o discurso de que a nova empresa é uma gigante brasileira que fará de tudo para manter a confiança do consumidor. "As marcas têm vida própria e, para o consumidor, ficará tudo igual", garante Secches. Os analistas, porém, preocupam-se com os riscos de concentração do mercado. No setor de margarinas, a Sadia tem 47,5% do mercado e a Perdigão, 18%. Juntas, elas possuem 53% do setor de carnes refrigeradas, 71,3% de carnes congeladas, 84% do segmento de massas e 64,8% de pizzas prontas. Quase sem concorrentes, teme-se o efeito sobre os preços e a extinção de algumas marcas. Mas há divergências nas avaliações. Enquanto a Pro Teste e o Idec, órgãos de defesa do consumidor, avaliam que o negócio aumentará os preços dos produtos, reduzirá as opções de escolha e prejudicará a concorrência, outros, como o coordenador do Núcleo de Estudos de Varejo da ESPM/SP, Ricardo Pastore, não acreditam na alta generalizada de preços. Ciente das desconfianças, Furlan diz que a intenção é ampliar o mercado pela redução de preços. "Vamos ser mais eficientes e o consumidor vai sentir. Onde for possível, vamos ter preços acessíveis porque queremos atrair mais consumidores."

Pelo sim, pelo não, a Brasil Foods contratou o escritório do advogado Paulo de Tarso Ramos, ex-ministro da Justiça do governo Fernando Henrique, especialista em direito econômico, para defender a nova estrutura no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). "Espero que até o final do ano seja possível uma decisão, embora seja muito difícil fazer hoje uma previsão muito precisa", diz o presidente do Cade, Arthur Badin. Segundo ele, a análise vai além da simples soma de participação do mercado. Mas o órgão já sofre pressão: "As regras antitruste têm que ser iguais para todos. Ou o Brasil é um país sério ou não é", diz o presidente da Nestlé, Ivan Zurita. Até hoje a Nestlé briga na Justiça para não vender a Garoto como determinou o Cade. Mas o ex-presidente do Cade Rui Coutinho adianta que o conselho pode aprovar a operação com restrições, como fez com a AmBev, que foi obrigada a vender a marca Bavária e outras cinco fábricas. "O Cade deve exigir que as operações das duas empresas fiquem separadas até o julgamento", explica Coutinho. Como a BRF está presente em 110 países e tem cinco unidades no Exterior, a união também será submetida aos órgãos de defesa da concorrência na Europa. Daí, no primeiro ano, as mudanças serão apenas na logística e distribuição, que vão resultar em ganhos de R$ 2,2 bilhões. Haverá também o lançamento de ações no valor de R$ 4 bilhões, dos quais o BNDES deverá abocanhar 40%.

A grande multinacional brasileira, que tem capacidade de abate de 1,7 bilhão de aves por ano e de dez milhões de suínos, também preocupa os produtores, que temem perder o poder de barganha. No setor de supermercados a preocupação é a mesma. Apesar desses temores, a fusão tem um grande aliado. Em viagem na comitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, fez questão de comemorar: "Vamos ampliar as exportações brasileiras de frango. E não haverá problema com os órgãos de defesa da concorrência."

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