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LISTA
Agenda (abaixo) estava no bolso de trás do sargento
Guilherme do Rosário, morto na explosão acidental da bomba

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No momento em que se completam três décadas da explosão ocorrida no estacionamento do Riocentro, pavilhão localizado na zona oeste carioca, novas evidências confirmam: a apuração do caso não passou de uma farsa. Na noite de 30 de abril de 1981, em uma trapalhada histórica, o capitão Wilson Dias Ma­chado e o sargento Gui­lherme Pereira do Rosário transportaram bombas até o local, onde milhares de pessoas se aglomeravam para assistir a um show de músicos brasileiros em comemoração ao Dia do Trabalho e clamar pelo fim do regime militar. Seria um atentado contra a massa. Acidentalmente, um dos artefatos explodiu no colo de Rosário, que morreu na hora. Machado sobreviveu. A primeira apuração do caso, conduzida pelos próprios militares, não culpou ninguém e a segunda foi arquivada com base na Lei de Anistia.

Agora, 30 anos depois, surgem novas evidências de que provas im­portantes ficaram de fora das duas investigações. O jornal “O Globo” teve acesso a uma agenda que pertenceria ao sargento Rosário. Nas anotações, nomes de autoridades do governo que faziam parte da repressão militar e passaram a usar seus conhecimentos em empresas privadas ao fim da ditadura. O documento não entrou no inquérito. “Eu não tive conhecimento dessa agenda, ela não estava nos autos”, confirmou à ISTOÉ o juiz Edmundo Franca de Oliveira, que conduziu o julgamento do primeiro Inquérito Policial Militar (IPM) a tratar do caso. “Houve fortes pressões da comunidade de informações e do ministro do Exército, general Walter Pires, para que fosse aceito o relatório do coronel Job Lorena de Sant’Anna, que presidiu o inquérito”, disse Oliveira.

Na época, a primeira atitude das Forças Armadas foi responsabilizar extremistas de esquerda pela explosão. Essa tese caiu por terra diante das evidências, mas a manipulação das investigações não permitiu caracterizar oficialmente a explosão no Riocentro como um ato de terrorismo de Estado. Além disso, a impunidade permitiu que o capitão Wilson Machado não tivesse sua culpa provada na Justiça, o que lhe permitiu nos últimos anos exercer cargos com remuneração oriunda do setor militar. Atualmente, ele trabalha como prestador de serviço no Instituto Militar de Engenharia e é responsável pela “análise funcional dos cargos de engenheiro militar” na instituição. “O arquivamento do processo, em 1981, foi um grande erro do Superior Tribunal Militar”, avalia o almirante Júlio Bierrenbach, ex-ministro do STM, único a votar contra na época. “No segundo IPM, os dois foram considerados culpados, mas acabaram indevidamente beneficiados pela Lei de Anistia, que tratava de crimes praticados apenas até 1979.” A cientista política Maria Celina D’Araujo, da PUC-RJ, avalia que há provas, hoje, de que o inquérito foi feito de maneira descuidada, sem levar em conta documentos importantes. “A intenção era acobertar os envolvidos”, analisa Maria Celina. “Para resgatar a imagem das Forças Armadas, é preciso que as autoridades militares reconheçam que erraram.”