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O afegão Khaled Hosseini, 42 anos, era apenas um médico da região de San José, no norte da Califórnia, quando a sua mulher começou a mexer em seus escritos e descobriu um esboço de romance que a emocionou. Contava a história de duas crianças afegãs expulsas dos doces anos da infância com a ocupação russa do país e a chegada ao poder dos talebãs. Aconselhado pela mulher, Hosseini mandou os originais para as editoras. O resto da história todo mundo conhece. Publicado em 38 países, O caçador de pipas já emocionou mais de oito milhões de pessoas ao redor do planeta desde a sua publicação, em 2003, e em novembro sua adaptação cinematográfica chega às telas americanas trazendo o padrão de qualidade da marca DreamWorks, a produtora de Steven Spielberg. Com o sucesso, veio a pergunta: Hosseini sobreviveria ao segundo livro? A julgar pela recepção de A cidade do sol (Nova Fronteira, 368 págs., R$ 39,90), há dois meses em primeiro lugar na lista dos best sellers dos EUA, onde vendeu mais de um milhão de exemplares em apenas três semanas, o afegão tem vida longa na literatura.

Dona dos direitos de publicação dos livros de Hosseini no País, a editora Nova Fronteira pensa da mesma forma e no dia 10 vai abastecer as livrarias com 300 mil exemplares do novo romance, uma tiragem nada desprezível. Ainda no topo da lista dos mais vendidos, O caçador de pipas já ultrapassou a casa do milhão de exemplares. Esse fenômeno em torno de Hosseini tem uma explicação óbvia: depois do 11 de setembro, o mundo inteiro ficou interessado em conhecer melhor a cultura dos países islâmicos e assim entender as raízes do radicalismo e do terrorismo islâmicos. A tese sociológica, no entanto, não é suficiente para explicar a sua boa estrela. É que, mesmo sendo um escritor de poucos recursos (ele escrevia em farsi, depois passou para o francês e agora escreve em inglês), Hosseini sabe contar uma história, envolvendo o leitor com doses exatas de informação e emoção.

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Como se ambicionasse traçar uma grande tapeçaria da história de seu país, Hosseini concebeu A cidade do sol como uma espécie de contraponto a O caçador de pipas. Se no primeiro livro ele abordou o universo masculino, na nova obra ele volta os olhos para as mulheres. Hosseini, radicado nos EUA desde 1980, diz que já tinha o livro na cabeça há muito tempo. Mas teve a convicção de que precisava escrevê-lo quando esteve em Cabul em 2003 e viu de perto a condição feminina no Afeganistão. “Vi mulheres de burca com cinco, seis crianças pedindo esmolas. Estive com muitas delas e ouvi casos muito tristes, alguns terríveis. Todas essas histórias voltaram na minha mente quando eu comecei a escrever o livro em 2004”, disse Hosseini numa recente entrevista.

Uma das passagens do livro descreve a iniciação de uma garota de quinze anos nessa forma repressiva de vestimenta. Ela sente-se nervosa por perder a visão periférica e sufocada com a pressão do tecido em sua boca. Seu nome é Mariam, uma das protagonistas da história, filha de uma criada e um rico proprietário de uma pequena cidade vizinha a Cabul. Casado com mais três mulheres, seu pai não a reconhece como filha. Quando a mãe dela se mata, o homem apressa-se em casá-la com um sapateiro 30 anos mais velho, justamente aquele que a obriga a usar a burca em locais públicos. Abarcando 30 anos de história, o livro acompanha a vida de Mariam, uma mulher simples, e também a trajetória de outra mulher, Laila, mais esclarecida, que se vê obrigada a também casar-se com o sapateiro na época da invasão russa. A princípio rivais, elas tornam-se amigas.

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Com a habilidade de dosar emoções, Hosseini criou mais uma trama de leitura fácil e perfeita para ser levada ao cinema. Não à toa, seus direitos de filmagem já foram comprados por Scott Rudin (produtor de A rainha, entre outros) e o filme baseado na obra já está previsto para 2009. O cinema, aliás, é um dos assuntos freqüentes de Hosseini nos dois livros. Fanático por faroestes (ele afirma que seu sonho de infância era ser Clint Eastwood), Hosseini pensou em chamar A cidade do sol de Sonhando em Titanic city. O título tinha duas razões de ser: primeiro porque Cabul havia simplesmente naufragado depois da ditadura dos talebãs; segundo porque o filme Titanic, com Leonardo DiCaprio, foi uma verdadeira febre em meio à tragédia pela qual passava o país. Numa das partes engraçadas do livro, Hosseini conta como o filme era pirateado via Paquistão, “muitas vezes dentro das cuecas”. Havia de tudo nos mercados: tapetes, perfumes, pastas dentais, desodorantes e – ironia das ironias – até burcas Titanic.


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