O achado arqueológico foi revelado em Memphis, como convém. Não no velho sítio histórico de Memphis, Egito, mas naquela cidade do Estado americano de Tennessee. Depois de ficar sepultada por quase 40 anos, uma canção inédita de Elvis Presley, intitulada I’m roustabout, finalmente veio a público na sexta-feira 15. Apenas uns poucos privilegiados reunidos pela gravadora BMG/RCA para um pré-lançamento ouviram a preciosidade. O restante dos milhões de fãs – que consideram o achado equivalente a uma importante descoberta arqueológica – vai ter de esperar até o dia 6 de outubro, quando a gravadora lançará a coleção Elvis 2nd to none, incluindo a música nova. O álbum segue a receita vencedora de Elvis 30 # 1 hits, lançado em 2002, que vendeu nove milhões de cópias, 250 mil só no Brasil. À maneira do disco milionário, também estão reunidas 30 músicas que alcançaram os primeiros lugares nas paradas de sucesso. Na receita certeira, igualmente repete-se a esperta cartada de marketing de remixar uma canção menos conhecida, como aconteceu no ano passado com A little less conversation, remixada pelo DJ holandês JXL. Desta vez, o DJ e produtor inglês Paul Oakenfold é quem fez a funilaria e pintura no rock Rubberneckin’, cujo single com três versões está previsto para sair em setembro. Mas é I´m a roustabout que provoca o maior frisson, mesmo sem ter estreado nas rádios.

Traduzir a expressão I’m a roustabout é complicado, pois ela é idiomática e encontra poucos paralelos em português – uma versão livre poderia ser sou um zoador. O título vem do filme de mesmo nome, que no Brasil se chamou Carrossel de emoções (1964). Nele, Elvis faz um trovador motoqueiro sem rumo, que acaba num circo-parque de diversões. A canção de Winfield Scott – autor de mais de 260 músicas e cujo maior sucesso é a balançadíssima Return to sender, que vendeu 14 milhões de cópias – foi encomendada como carro-chefe da fita pelo produtor Hal Wallis. “Elvis gravou esta versão. Mas Wallis não gostou da letra em que Elvis manda o patrão enfiar o emprego em seu ouvido. A frase, obviamente, tinha outras conotações”, conta Scott. Irreverência perpetrada, o acetato foi direto para o fundo do baú do compositor. “Numa entrevista a um jornal de Nova Jersey, eu mencionei que ainda guardava esta cópia. Dias depois, o produtor Mikael Jogensen, da BMG, me ligou”, lembra o autor.

Trilha sonora – A versão original, diga-se, é superior à música completamente diferente do filme, que só ganhou o mesmo nome para puxar a trilha sonora. I’m a roustabout é um rock compassado, no melhor estilo do Elvis Presley jovem. A letra também traz brincadeiras e duplos sentidos. Na verdade, a canção de Scott poderia ter sido a melhor coisa da fita bobinha, bobinha. Com Barbara Stanwyck no papel de uma dona de circo, o enredo infantil acaba sendo desculpa para o desfile de baladas e rocks cantados pelo astro sob as mais absurdas justificativas. Mesmo assim, é animador ver o garotão Elvis, vestido de couro preto do pescoço aos pés e ainda carregando a alegria que desapareceria no Elvis balofo dos últimos tempos de Las Vegas.

Elvis 2nd to none, é claro, já entra no mercado com a garantia de peça para colecionadores do ídolo morto em 16 de agosto de 1977. Ao que consta, desde o lançamento de A little less conversation, os fãs mais empedernidos não se incomodaram com as interferências dos DJs. Darlene Pedulli, por exemplo, presidente do fã-clube do cantor em Nova Jersey, garantiu que os remixes são bem-vindos. “A nova geração precisa ser apresentada à voz de Elvis. Se eles não estão acostumados com o rock de uma época passada ou com as baladas, a modernização pode ser a saída para corrigir esta lacuna. Se eles gostam de um ritmo mais para o lado do rap, não vejo por que não agradá-los”, disse Darlene a ISTOÉ. “O remix ainda serve para provar que Elvis é bom de qualquer jeito. Sua voz se encaixa bem em todos os ritmos.”

Além de Rubberneckin’ e I’m a roustabout, este Elvis 2nd to none
traz sucessos que ficaram de fora do álbum de 2002. That´s all right mamma, Blue suede shoes, Viva Las Vegas, Always on my mind e
outras marcas do Rei estão agora incluídas. Se a moçada clubber permanecer chacoalhando nas pistas como fizeram com A little less conversation, os fãs velhuscos não se importarem com as pequenas heresias e a obra de Elvis Presley continuar sendo revista dentro dos moderníssimos padrões de tecnologia, os cofres da gravadora ainda
vão tilintar por muitos e muitos anos.