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Quando esteve no Brasil, em maio, Bento XVI concentrou a atenção da mídia, mobilizou multidões e fortaleceu a imagem da Igreja no maior país católico do mundo. Apesar disso, um dos pontos mais caros ao Vaticano – a condenação do aborto – não encontrou eco entre os brasileiros. É o que sugere pesquisa feita pelo Ibope e encomendada pelo grupo Católicas pelo Direito de Decidir (CDD), uma entidade de defesa dos direitos das mulheres. Uma semana após a visita do papa, foram ouvidas duas mil pessoas sobre temas relativos à sexualidade. O resultado: 76% dos católicos se declararam favoráveis ao aborto nos serviços públicos de saúde, um assunto que tem sido debatido na Câmara Federal.

Embora a amostra seja pequena, a pesquisa serviu para o CDD confirmar que há uma clara falta de sintonia entre Igreja e sociedade. “Quisemos conferir se a presença de Bento XVI teve influência sobre a opinião dos católicos. Os pensamentos são bem diferentes”, diz a socióloga Dulce Xavier, coordenadora do grupo. Segundo o Ibope, 80% dos católicos concordam com o aborto no caso de risco à vida da mulher e 75% o apóiam se o feto apresentar poucas chances de sobrevivência. Em abril – antes da visita do sumo pontífice –, uma pesquisa do Vox Populi apontou que 45% dos mais de dois mil entrevistados discordavam da Igreja por ela condenar qualquer tipo de aborto. No trabalho encomendado pelo CDD, o índice é maior: 59%. “A visão conservadora do papa e suas afirmações polêmicas têm gerado antipatia, o que afasta as pessoas”, completa Dulce. O aborto foi abordado apenas genericamente por Bento XVI em sua passagem pelo País.

Os números surpreenderam o secretário- geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, dom Dimas Lara Barbosa: “As últimas pesquisas que temos mostravam aumento na rejeição do aborto.” Os dados do Ibope podem provocar mudanças nas estratégias da Igreja, cujo tema da Campanha da Fraternidade em 2008 será a defesa da vida. Em outubro, um encontro do Instituto Brasileiro de Marketing Católico (que presta serviços a bispos, padres e leigos) discutirá como aproximar o discurso dos fiéis. “O papa veio, houve o impacto natural de alguém com carisma, mas a postura da sociedade não se alterou. Temos de fazer um mea-culpa”, diz o teólogo Antônio Kater Jr., coordenador do instituto.