O tenista Fernando Ariel Meligeni, nascido em Buenos Aires há 32 anos, filho dos argentinos Oswaldo e Concepción, é um dos brasileiros mais festejados do momento. E não há nenhum erro nesta informação. Fininho – apelido criado pelo corpo esguio, hoje com 65 quilos e 1,80 metro – chegou ao Brasil com quatro anos e “escolheu o País”, como costuma dizer. Na final de tênis dos Jogos Pan-Americanos 2003, no domingo 10, em Santo Domingo, na República Dominicana, ele deu mais uma prova de que a escolha é sincera. Após uma batalha de 2h45min, combinou um jogo firme de fundo de quadra com muita raça, sua marca registrada, para bater o chileno Marcelo Rios, ex-número um do mundo, de virada, com dois tie breaks, por 3 a 2 – 5/7, 7/6(8/6) e 7/6(7/5). O empenho e a emoção de Fininho, um dos mais simpáticos atletas brasileiros, comoveram
o País. Semifinalista em Roland Garros em 1999 e quarto colocado
nos Jogos de Atlanta em 1996, ele fez do Pan a sua despedida
das competições internacionais e dos torneios profissionais. Nesta
entrevista, Fininho fala sobre a opção pelo Brasil e o prazer de ter
encerrado a carreira com o ouro no peito.

ISTOÉ – A sua garra é argentina ou brasileira?
Fernando Meligeni
– Brasileira, definitivamente. Não nasci no Brasil, mas escolhi o Brasil. Acho isso relevante. A garra vem de uma combinação de temperamento com os ensinamentos de casa. Meu pai, Oswaldo, fotógrafo de publicidade, e minha mãe, Concepción, vieram para cá depois dos 30 anos. Ralaram como uns loucos e me ensinaram o valor da perseverança. Eles são argentinos convictos, obviamente. Mas eu sou brasileiro. Amo o País e adoro representá-lo. Pan, Olimpíadas, Copa Davis, tudo isso é comigo mesmo. Ou melhor, era…

ISTOÉ – Numa bonita crônica em sua homenagem, o jornalista Renato Maurício Prado, de O Globo, comentou que você se incomoda com o fato de ser tratado pela imprensa como “o tenista argentino naturalizado brasileiro”…
Meligeni
– Agora a coisa diminuiu um pouco. Mas, antes, isso me chateava. Se tivesse nascido na antiga Tchecoslováquia e vindo para cá aos quatro anos, garanto que não iriam me chamar de “o tenista tcheco naturalizado brasileiro”. Mas, enfim, é a rivalidade pesada entre Brasil e Argentina. São dois grandes países. Eu tinha a impressão de que lembravam o tempo todo que eu nasci na Argentina para, eventualmente, relacionar esse detalhe a alguma atitude negativa que eu pudesse tomar em relação ao Brasil, algo que nunca aconteceu e jamais acontecerá. Mostrei meu amor ao País e, hoje, recebo muito carinho por isso. Meu pai fala, em tom de ironia, que minha mãe deve ter sido brasileira na outra encarnação para ter gerado “um argentino tão brasileiro como eu”.

ISTOÉ – Você estava realmente comovido no pódio…
Meligeni
– Olha, fiquei tão emocionado que, ao chegar ao Brasil,
disse que, se um dia meu filho ou meu neto perguntar quem eu fui
nas quadras, responderei: “Veja a gravação da final dos Jogos Pan-Americanos de 2003 e você terá o resumo de toda a minha carreira.” Precisava encerrar com a imagem de um vencedor, de um grande lutador do tênis. Foi o jogo mais dramático da minha vida. Perder aquele jogo seria demais para mim. Aquela batalha toda e, depois, eu ali, com
o ouro no peito… Foi simplesmente sensacional.

ISTOÉ – Marcelo Rios é tido como um dos mais antipáticos do circuito. Como é o seu relacionamento com ele?
Meligeni
– Ele é técnico, sempre mostrou determinação e também
queria muito aquela medalha. Como eu, promete sair do circuito e
queria se despedir com uma conquista. Marcelo e a imprensa não
se entendem, mas temos um bom relacionamento. Na quarta-feira 6, treinamos juntos um set. Ele me massacrou por 6 a 2. Mas, no domingo, senti que ele estava ficando nervoso com os erros. Como meu
astral estava ótimo, tirei proveito.

ISTOÉ – E essa história do São Paulo-Meligeni no futebol?
Meligeni
– Depois da final do Pan, algumas pessoas brincaram
dizendo que o time atual do São Paulo tem um estilo semelhante
ao meu. Essa comparação me enche de orgulho, mas é um exagero evidente. Até admito que o técnico Roberto Rojas pensa de forma parecida, gosta da equipe que não desiste nunca. Mas estender essa comparação ao time? Pelo amor de Deus! Sou um jogador com técnica limitada que cresceu pela dedicação. Já o São Paulo tem um histórico
de refinamento e de classe, que o levou a três títulos brasileiros, dois
sul-americanos e dois mundiais. Enfim, um império da técnica. Mesmo esse time aguerrido do Rojas possui muitos jogadores talentosos. Não
sei se os que ainda não sabiam perceberam, mas sou são-paulino. Alucinado. Olhe, se eu continuar a falar do meu São Paulo, acho
que a gente vai esquecer do tênis (risos)…

ISTOÉ – De volta ao tênis, então. Você afirmou que não joga mais como profissional. É para confiar?
Meligeni – Vou fazer partidas de exibição, realizar palestras e organizar torneios como a 1ª Copa Fino de Tênis Juvenil, no final deste ano. Quero trabalhar com a molecada e ajudar a revelar novos talentos. Além disso, pretendo aprender mais sobre televisão, já que apresento o MTV Sports, um programa de esportes radicais na MTV. É duro, dói um pouco, mas, como profissional, pode dizer aí que acabou.