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Os Big Brothers, os reality shows em que uma dezena de pessoas convive confinada numa casa vigiada por câmeras 24 horas por dia, são um fenômeno de audiência mundial. O público vibra com os romances, diverte-se com as armações e, ao final, escolhe o merecedor do prêmio milionário. Em geral, vence o participante com mais virtudes, aquele que pareceu mais honesto e menos egoísta aos olhos do telespectador. Pois bem, pesquisadores alemães concluíram, em estudo publicado na última edição da revista Science, que este comportamento altruísta é resultado do fato de estar sendo observado.

A força do olhar do outro é tão grande, segundo eles, que uma simples imagem de um par de olhos estilizados numa tela de computador pode mudar a forma de agir de uma pessoa. Da mesma maneira, o desenho de olhos numa caixa de gorjeta de uma lanchonete tende a tornar os clientes mais generosos do que se a imagem fosse uma flor – e se estiverem encarando diretamente o observador, pode apostar, o total arrecadado será ainda maior.

O curioso do estudo dos pesquisadores Manfred Milinski, do Instituto Max-Planck de Ecologia Evolutiva em Plön, e de Betina Rockenback, da Universidade de Erfurt, ambos na Alemanha, é que até os animais agem assim. “Pássaros respondem muito à imagem de olhos, especialmente quando estão sendo encarados”, afirmam na pesquisa. Segundo eles, o cérebro está programado para reagir assim.

Ao observar um congênere pode-se descobrir como se comportar em um encontro futuro. Até os peixes conseguem inferir a posição social do outro e fazer uso desta informação. Por isso, não é de surpreender que tentemos passar a melhor imagem possível quando sabemos que estamos sendo vigiados. Isso pode trazer ganhos futuros. “Ninguém faz nada de graça. O benefício pode ser financeiro, afetivo, sexual”, diz o psiquiatra Arthur Kaufman, professor da Universidade de São Paulo. Quem nunca tentou impressionar uma namorada ou um chefe?

Pesquisas anteriores já mostravam que, quando a reputação está em jogo, seres humanos e animais tendem a se comportar de forma altruísta porque esta é a forma de agir socialmente valorizada. Por isso, quando não queremos ser reconhecidos por atitudes não desejáveis, cobrimos o rosto, seja num baile de Carnaval, seja num roubo a banco. “Quando alguém vai transgredir e acredita que não está sendo visto, isso tem muito menos força”, diz o psicoterapeuta Ari Rehfeld, do Departamento de Psicologia da PUC-SP. “O olhar externo exige da pessoa o seu melhor. Ele expressa o que você projeta nos outros.” O resultado deste jogo entre observador e observado, segundo o estudo, é uma espécie de “corrida armamentista” em que um tenta ludibriar o outro. Ganha quem consegue disfarçar melhor suas intenções. É puro reality show.

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VIGILÂNCIA CONSTANTE
O clima de Big Brother permeia a humanidade há muito tempo. Centenas de anos atrás na América do Norte, totens eram colocados em lugarejos em posição de vigilância constante. Em geral, eram representações de animais selvagens, mas tinham olhos “humanos”, com a região da íris destacada, ressaltando a direção do olhar. Esculpidos em altos pilares ou postes de cedro, eram cultuados como deuses.