Nos anos 80, o ator Jack Palance virou sucesso mundial apresentando um programa de casos incríveis. Rituais de acasalamento de tribos zulus, animais de três cabeças e outras bizarrices eram mostradas em blocos, finalizados com o desafio: “Acredite se quiser.” Nesta semana, Silvio Santos teve dias de Jack Palance. De férias em sua casa no condomínio de Celebration, em Orlando, nos Estados Unidos, o dono do SBT concedeu à revista Contigo! uma entrevista por telefone. Em tom irônico, o respeitável senhor de 72 anos, dono de uma fortuna de R$ 880 milhões, relatava ter “apenas mais seis anos de vida”. Contou
ter emagrecido 11 quilos e dizia estar numa cadeira de rodas, tendo de receber transfusões de sangue. Tudo por causa de “uma doença atípica nas coronárias, chamada ataque cardíaco em seis anos”. Para completar, disse que pretende ficar nos EUA “até o dia em que tiver de ir para a eternidade” e por isso teria vendido o SBT para o grupo mexicano Televisa e para o ex-consultor da Rede Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni.

A informação de que o dono da segunda maior rede de televisão do País estaria à beira da morte causou comoção. Durante toda a quinta-feira 10, programas de fofoca não falaram em outra coisa. Entre os familiares e amigos, porém, a fala de Silvio Santos foi recebida como piada. Seu sobrinho, Guilherme Stoliar, diretor comercial do SBT, conta que até 15 dias atrás, quando o viu pela última vez, ele parecia muito saudável. Sua ex-mulher, Ivani, é vizinha da família Abravanel em Celebration e riu muito da história. Hospedado na casa dela, Rogério Calegari, filho de Luciano Calegari, antigo braço direito de Silvio Santos, declarou a ISTOÉ que o empresário está bem. “Eu o vi hoje (quinta-feira 10) e garanto que não está doente, nem em cadeira de rodas, nem recebendo transfusão”, afirmou Calegari, aos risos.

Em depoimento à agência Reuters, Boni descreveu o episódio como “a pegadinha do ano”. Um dos mais respeitados executivos do meio publicitário, Daniel Barbará, da agência DPZ, afirma que desde o início os anunciantes sabiam que tais notícias eram infundadas. “Ninguém dá crédito ao que o Silvio declara porque ele vive soltando frases de efeito e mexendo na programação ao seu bel-prazer. Todo mundo sabe que há uma grande distância entre o que ele fala e o que de fato acontece na área comercial da empresa”, diz.

Com o mesmo cardiologista há 35 anos, Silvio Santos jamais teve problemas coronários. Em 2001, passou por um exame preventivo, chamado cateterismo, e constatou que suas artérias não apresentam nenhum comprometimento. Desde então, só liga para o médico em época de check-up. Nabil Goraieb, um dos maiores cardiologistas brasileiros, diz que o mal descrito pelo empresário é pura invenção. “Em cardiologia, não se especula sobre a expectativa de vida do paciente. Além disso, não existe nenhuma doença cardíaca que exija transfusões de sangue”, afirma.

Em plena forma profissional, há dois meses Silvio Santos teve um encontro com diretores da Televisa. Queria renegociar um contrato de co-produção de telenovelas, afetado pela alta do dólar. Há tempos, o grupo mexicano almeja adquirir parte do SBT, mas só em dezembro o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou a medida provisória que abriu as telecomunicações ao capital estrangeiro. O consultor Marcos Amazonas, especialista em legislação, explica que a lei dá aos grupos internacionais a possibilidade de adquirir até 30% das ações das redes de tevê aberta. “Mas os investidores estrangeiros acham pouco”, comenta. “Eles querem que o limite avance para pelo menos 51%, para que possam efetivamente mandar na emissora que comprarem.”

No primeiro semestre, o consultor de telecomunicações José Roberto Maluf, ex-vice-presidente do SBT, chegou a ser consultado pela
Televisa, que queria saber sobre a legislação. As negociações com
o dono da emissora, porém, não evoluíram. “O problema é que Silvio nunca decide. Uma hora diz querer vender e no momento seguinte
volta atrás”, narra uma fonte ligada ao empresário. A Televisa confirma ter opção de compra de até 30% das ações do SBT, mas nega que a negociação esteja efetivada.

O mais curioso é que esta não é a primeira vez que Silvio Santos mobiliza a mídia em torno de um trote. Em 1971, a revista de celebridades Melodias consultou o empresário sobre a possibilidade de fazer uma matéria sobre sua calvície. Achando graça na história, ele topou posar para uma fotomontagem em que aparecia careca. Naquela semana, as vendas da revista saltaram de 100 mil para 500 mil exemplares. Mais recentemente, durante a apresentação do programa Casa dos artistas 2, ele blefou ao dizer que o espectador iria escolher os integrantes do jogo.

Desde maio, quando ficou pronta a sua casa no condomínio de Celebration, a 30 minutos de Orlando, o empresário tem passado 15 dias por mês nos Estados Unidos. No restante do tempo está no Brasil gravando programas como Qual é a música e Sete e meio. Sua presença na tevê tem sido cobrada pelos anunciantes. Depois da Nestlé, a fabricante de celulares Nokia e a operadora TIM fecharam um patrocínio para o Show do milhão. Stoliar, responsável pela área comercial, garante que esse contrato deve prender SS no Brasil. “O programa reestréia em agosto e deve durar até quatro meses. As pessoas vão responder às perguntas ao vivo pelo celular. Não há como Silvio se ausentar”, diz. Sobre os boatos de que a crise financeira poderia forçar o tio a se desfazer da emissora, Stoliar é enfático. “Apesar de a economia brasileira estar num momento difícil, conseguimos ser a empresa de comunicação brasileira em melhores condições financeiras”, diz. “No primeiro trimestre, tivemos uma queda de 4% a 5% na receita publicitária, mas, desde abril, não temos déficit.” De acordo com Stoliar, a previsão é de que o SBT fature este ano o mesmo que em 2002: R$ 550 milhões. Os números não mentem nunca. Já o dono do SBT…