09/07/2003 - 10:00
Itália assumiu a presidência semestral da União Européia na terça-feira 1º de julho e o premiê italiano, Silvio Berlusconi, debutou como presidente da UE em estilo macarrônico. Ainda não acostumado ao jeito todo peculiar de fazer política do magnata italiano, o Parlamento Europeu entrou em alvoroço durante o discurso em que a Itália apresentou suas prioridades para seu mandato à frente do bloco europeu, realizado na quarta-feira 2 em Estrasburgo (França). Após o término da explanação de Berlusconi – seguidamente interrompido por vaias e manifestações de deputados europeus –, seguiu-se uma rodada de perguntas. Quando o parlamentar social-democrata alemão Martin Schulz questionou o mandatário italiano sobre o conflito de interesses entre seu cargo e o fato de controlar um gigantesco grupo de mídia, il Cavalieri, como o premiê é conhecido, demonstrou todo o seu talento para o histrionismo: “Na Itália estão fazendo um filme sobre os campos de concentração nazistas. Eu gostaria de sugerir que você fizesse o papel do capo (guarda) nazista. Ficaria perfeito.”
A boutade do premiê italiano causou profunda indignação no plenário, tanto nos alemães quanto em outros parlamentares europeus. “Meu respeito pelas vítimas do fascismo me impede de aceitar esse comentário. É difícil aceitar um presidente do Conselho que faz tal tipo de declaração”, afirmou o deputado Schulz. Impassível, Berlusconi retrucou que Schulz é que o estava ofendendo, afirmando que sua tirada havia sido uma ironia ao gestual e ao tom de voz do deputado, ironia essa que talvez a tradução não tivesse captado. Schulz e o presidente do Parlamento, Pat Cox, exigiram que Berlusconi se retratasse. Diante da recusa deste, Cox suspendeu a sessão. Acuado, Berlusconi ainda ofendeu os parlamentares tachando-os de “turistas da democracia”.
Na Itália, as declarações do Cavalieri deixaram a esquerda indignada. “Berlusconi mostrou que não tem cultura democrática, sendo incapaz de enfrentar seus opositores sem agredir”, disse Piero Fassino, líder dos Democratas de Esquerda (ex-comunistas). Até a direita, aliada do premiê italiano, ficou perplexa com a desastrada estréia de Berlusconi no cenário europeu: “Ele caiu numa armadilha. É lamentável”, comentou o vice-premiê Gianfranco Fini, da ultradireitista Aliança Nacional.
O estrago causado pela arrogância desastrosa de Berlusconi, que acabou se desculpando com o chanceler alemão, Gerhard Schröder, levou lenha na fogueira das frequentes críticas que muitos europeus fazem sobre sua inabilidade para liderar o bloco europeu. Durante o mandato italiano, será trabalhada a entrada de dez novos países à UE em 2004, e a Constituição Européia, que está sendo elaborada, tem de avançar. “Na melhor das hipóteses, Berlusconi será um líder imprevisível em um momento crítico para a UE. Na pior, ele poderia precipitar novos conflitos”, sentenciava no dia 30 de junho o jornal conservador britânico Financial Times, porta-voz dos setores conservadores. Ninguém esperava que o vaticínio pudesse se concretizar tão cedo.
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