Num movimento desesperado, a Associação da Indústria Fonográfica Americana (Riaa) deu início a uma feroz caçada aos piratas da internet, os usuários que baixam e distribuem arquivos de música e imagem sem pagar direitos autorais. As gravadoras alegam que cada canção representa um prejuízo de até US$ 150 mil. Para reverter esse quadro, o plano é identificar os usuários assíduos e enviar advertências intimidadoras com o intuito de coibir sua ação. Ainda que ninguém tenha explicado como punir jovens de 12 anos, que estão entre os maiores adeptos das músicas em formato digital mp3.

Os primeiros pedidos de indenização devem começar a aparecer nos tribunais nos próximos dois meses. Estima-se que 2,6 bilhões de músicas e filmes sejam trocados pelos computadores mensalmente. Punir os usuários é a saída mais fácil, já que os
arquivos são trocados diretamente entre milhões de computadores espalhados pelo mundo.

Há dois anos, a Riaa conseguiu tirar do ar o Napster, precursor e mais famoso dos sites de música online. Outros endereços surgiram à mesma velocidade com que se navega na rede, entre eles o KaZaA – que registrou mais de 230 milhões de downloads –, o Grokster, o Gnutella e o Lime Wire. Apesar de estarem na mira das autoridades, esses sites vieram para ficar. Os internautas perceberam que podiam ter acesso a milhares de canções de graça e fazer a sua discoteca com as músicas mais difíceis de se encontrar. “Pela internet achei verdadeiras raridades de jazz”, diz o empresário Felipe Camarneiro, 26 anos, diretor da Gama Produtora, dono de um acervo com 1,5 mil músicas baixadas da rede e cerca de 200 CDs originais.

Algumas gravadoras resolveram combater a pirataria oferecendo aos consumidores aquilo que eles queriam: a oportunidade de baixar música pela internet, com a diferença de ser uma transação legal. A fabricante de computadores Apple se uniu às grandes gravadoras, como BMG, EMI, Sony Music e Warner, e colocou no ar em final de abril o iTunes Music Store, serviço de venda de músicas a US$ 0,99 por faixa. Foram 3 milhões de downloads no primeiro mês.

No Brasil, o site iMusica oferece um cardápio de 20 mil canções
nacionais a R$ 0,99 cada. “A internet é mais uma forma de divulgação. Quanto mais dos nossos CDs houver em sites ou em lojas, melhor”, diz André Szajman, sócio da Trama, uma das gravadoras associadas. Prova disso é que os fãs do cantor Ed Motta puderam comprar, durante 15 dias, seu novo CD pela metade do preço das lojas. O número de acessos à faixa promocional Tem na van, baixado por 1,5 mil pessoas, dá
uma noção do sucesso dessa revolução sem volta. Quem lucra é o consumidor, que consegue promover uma festa particular num
apertar de tecla de computador.

Na contramão está o site Radiostudio, que desde 1999 seleciona trabalhos de artistas pouco conhecidos e os coloca à disposição
dos internautas, que fazem o download por R$ 2 cada música. Para o baixista Celso Pixinga, que tem 13 discos gravados e já tocou com Gal Costa, Evandro Mesquita e Jane Duboc, a internet é uma senhora agente. “Não existe divulgação de música instrumental no Brasil. Pela Radiostudio, tive retorno de pessoas da Rússia, Japão e Argentina”, comemora Pixinga. A discussão sobre a legalidade desses programas ainda vai longe. “Para haver crime é preciso ter intenção de se violar
a lei. Se isso não ficar provado, não há como punir”, diz a advogada Paula Moreira Indalecio. “Quando baixo arquivos da internet não penso em violar a lei. Quero apenas encontrar boas músicas, tanto que não deixei de comprar CDs”, garante Camarneiro.

A partir de setembro, quem tiver um computador com internet de
banda larga vai poder fazer o download de seus filmes brasileiros preferidos, de maneira legal, e com a mesma qualidade de um DVD.
As empresas iMusica e TeleImage são responsáveis pela primeira plataforma de distribuição de vídeo online da América Latina, onde
os usuários poderão apenas “alugar” o filme, pelo mesmo preço de
uma locação comum, ou comprá-los por um preço ainda não definido. Baixar filmes e videoclipes pela internet, de graça, não é novidade
entre os internautas, mas nem sempre a qualidade do que chega à tela do computador é boa. “A indústria cinematográfica está dando uma resposta mais rápida à pirataria”, diz Alexandre Agra, vice-presidente do iMúsica. Como se vê, a tecnologia de entretenimento virtual veio para ficar. Resta saber até quando a indústria vai ter forças para manter a sua posição de caçadora de bruxas.

 

Filme nas pistas

Cidade de Deus, o filme de Fernando Meirelles inspirado no romance homônimo do escritor Paulo Lins, não foi indicado ao Oscar, mas pode se tornar um marco na história da sétima arte. Além da trilha ter sido remixada pelos principais DJs da cena eletrônica, uma das faixas da coletânea Cidade de Deus Remix – lançado na semana passada em 25 países – é o primeiro VJ remix do cinema. Traduzindo: assim como as músicas do filme ganharam versões dançantes, as imagens foram modificadas com a ajuda de uma parafernália eletrônica. “O VJ remix é uma reorganização visual com o uso de colagens de vídeo e truques digitais”, explica o videojóquei
Alexis Anastasiou.

À primeira vista, o trabalho lembra os clipes de tevê. O que torna o VJ remix mais atraente é a interferência nas imagens originais, que vão desde a cor até a sequência do filme. O desenrolar da trama evolui de acordo com a música Dadinho, do DJ Periférico. Quem frequenta raves e festas de música eletrônica já conhece o trabalho de Alexis. Ele é o primeiro VJ do País e sua trajetória se confunde com a cena eletrônica nacional. Depois de assistir ao show da banda Kraftwerk em São Paulo, em 1998, e ver a sincronia de som e imagem num telão, ele abandonou a chance de se tornar diplomata. “Estamos mudando o conceito de pista de dança, que antes era só com música. Hoje é música e imagem”, explica, sem modéstia.

Dolores Orosco