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SEPARAÇÃO
AlessandraNegrini em “Olhos nosOlhos”,
filme baseado em Chico Buarque

João de Santo Cristo deixa sua vidinha no interior, vai para Brasília, torna-se um criminoso, se redime pelo amor de Maria Lúcia, mas a perde para seu rival, o traficante Jeremias. Ao final, os dois se enfrentam num duelo do qual nenhum sairá vivo. Poderia ser a história de um filme, mas é de uma canção: “Faroeste Caboclo”, lançada pela banda Legião Urbana em 1987. Por ter uma letra tão cinematográfica, a canção vai virar filme sob a direção do estreante em longas René Sampaio. Também já está em finalização outra adaptação para o cinema de um sucesso popular, a música “Olhos nos Olhos”, de Chico Buarque, cujos versos ganharam enredo pelas mãos do cineasta Karim Aïnouz, com a atriz Alessandra Negrini no papel principal. São exemplos de uma cinematografia rara. Se o cinema, que sempre foi devedor da narrativa literária, passou a se inspirar em brinquedos e videogames, por que não se valer do universo sugerido por uma canção?

Mesmo no Exterior, há poucos casos desse tipo de adaptação. “Mona Lisa” (1986), de Neil Jordan, nascido da canção homônima de Nat King Cole, e “Veludo Azul”, de David Lynch, que veio de “Blue Velvet”, hit de Bobby Vinton, são bons exemplos. Mas a tendência promete crescer. Está em franca negociação o projeto de levar para as telas “Thriller”, de Michael Jackson. “Transformar uma música em filme exige mais do que adaptar ­literatura ou teatro, quando tudo já está na obra original”, diz o cineasta Jeremias Moreira, diretor de duas versões de “O Menino da Porteira” (1977 e 2009), de “Mágoa de Boiadeiro” (1978) e “Fuscão Preto” (1980), todos baseados em sucessos radiofônicos.

No Brasil existem ainda casos isolados como o de “Veja Esta Canção” (1994), de Cacá Diegues, filme em quatro episódios baseados em composições de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Ben Jor e, novamente, Chico Buarque. “Elas foram cedidas pelos compositores pela relação pessoal que tinham com o Cacá”, diz Zelito Viana, produtor do longa. Os músicos, no entanto, nem sempre são consultados. Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, remanescentes da Legião Urbana, nem sequer foram procurados pela equipe de “Faroeste Caboclo”. Como em qualquer adaptação, o desafio é se manter fiel ao espírito da obra original. Nos anos 1990, quando se teve a ideia de filmar essa música, Renato Russo sugeriu que o personagem João de Santo Cristo (que a letra sugere ser negro) fosse loiro. “Lembro que ele queria um personagem lindo e galã”, diz Dado Villa-Lobos. No fim, valeu o bom-senso: Fabrício Boliveira, negro, viverá o protagonista.

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