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Quando completou 80 anos de idade, em dezembro, a carioca Sonia Roiter decidiu escrever sua autobiografia. Ao olhar para o passado, teve certeza de que tinha vivido acontecimentos tão díspares, interessantes e comoventes que, sem dúvida, dariam um livro. 

E deu. Com o inequívoco nome de “Minha Vida”, sua história ganhou uma bonita edição de 40 exemplares, bancada por um dos filhos e distribuída entre irmãos, sobrinhos e netos. “Temos na nossa cabeça diversas gavetinhas. No momento em que você abre uma, descobre tanta coisa que sente o impulso de vasculhar as outras”, explica Sonia.

A facilidade com que qualquer pessoa pode, hoje, lançar livros – graças aos recursos tecnológicos que barateiam a impressão e pequenas tiragens é um dos principais motivos que aquecem o mercado de biografias de anônimos, tanto no Brasil quanto no Exterior.
 
Quem não se dispõe a escrever de próprio punho, como fez Sonia, pode contratar um profissional.
 
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EMOÇÃO José Moreira e Eulália: livro de presente dos filhos. Sonia Roiter escreveu sua autobiografia

 
A Association of Personal Historians (algo como Associação de Historiadores Pessoais) reúne mais de 600 profissionais no mundo. Aqui, até a Ediouro tem um selo que publica obras de ilustres desconhecidos sob encomenda, o Singular. “As motivações são variadas”, diz o editor carioca João Baptista Pinto, da pequena Letra Capital, que também se dedica a esse filão.
 
Pode ser por estímulo de parentes ou amigos, vaidade ou para deixar sua versão de fatos mal contados. E há, do outro lado, quem se profissionaliza no setor, como o escritor mineiro Osias Ribeiro Neves, sócio do Escritório de Histórias, com clientes no Brasil inteiro. “A trajetória da pessoa pode não ser tão interessante, mas a gente faz o possível para que pareça ser”, explica.
 
Os filhos do casal de portugueses Eulália, 78 anos, e José Moreira, 76, contrataram uma escritora para entrevistar os pais e fazer um livro sobre a vida deles – sem que eles soubessem qual era o objetivo dos depoimentos, pois ela estava disfarçada de pesquisadora universitária. O livro “José e Eulália – Uma História de Amor” foi entregue a eles num jantar. “Nunca suspeitamos, nem quando minha filha apareceu na minha casa pedindo emprestadas algumas fotos”, lembra Eulália.

Diretora do Museu da Pessoa, que reúne depoimentos em áudio de gente desconhecida em São Paulo, a historiadora Karen Worcman vê com otimismo a iniciativa. “A coisa mais singular que a gente tem é a nossa história e o fato de poder contá-la é muito gratificante.” Que o diga dona Sonia: impulsionada pelo sucesso domésticode sua autobiografia, ela escreve nova obra, um suspense policial ambientado num orfanato inglês. Nasce uma escritora.

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