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Com o título de primeira-dama da França, a cantora italiana Carla Bruni, 40 anos, reúne todos os requisitos para brilhar no Palais de L’Elysée, residência oficial do presidente Nicolas Sarkozy. Nascida numa família de industriais de Turim, que no intervalo dos negócios se dedicavam à arte (mãe pianista e pai compositor de ópera), ela estudou em colégios da Suíça e aprendeu desde cedo como se portar em situações formais e diplomáticas. Ex-modelo, sabe também como vestir com naturalidade uma alta-costura (era a preferida do exigente Yves Saint Laurent) e se dá bem com mídia e holofotes. Fala quatro idiomas: italiano, francês, inglês e espanhol. Alternando-se nos três primeiros, Carla quase não canta, sussurra na melhor tradição da chanson nos discos Quelqu’un m’a dit e No promises, que a gravadora ST2 lança esta semana no Brasil. A língua francesa, aprendida aos quatro anos de idade, lhe permite se expressar de maneira precisa tanto nas composições quanto em questões polêmicas. Foi o que aconteceu quando Carla deu a sua primeira entrevista como mulher de Sarkozy à revista semanal L’Express. Ela acusou o site de uma outra revista francesa, o Nouvel Observateur (que insinuara uma reconciliação de Sarkozy e sua ex-mulher com base numa suposta mensagem de celular), de se comportar como os colaboracionistas na época da ocupação nazista: “Se esse site tivesse existido durante a guerra, o que aconteceria com a denúncia de judeus?”. O diretor de redação do Nouvel, Michel Labro, não deixou por menos: qualificou a declaração de “patética, perfeitamente imbecil.

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Juntamente com a sua primeira saia-justa, a cantora disse que gostaria de marcar sua diferença em relação às madames Mitterrand e Chirac, respectivamente mulheres dos ex-presidentes François Mitterand e Jacques Chirac. “Da mesma forma que Nicolas não se parece em nada com seus antecessores, eu também, com todo respeito pela função, gostaria de imprimir minha personalidade”, disse ela. Determinação nesse sentido é o que não lhe falta. Carla vendeu dois milhões de cópias do disco de estréia, Quelqu’un m’a dit, em 2002, cantando músicas folk com sua voz pequena. Mesmo assim, quando entrou no estúdio no ano passado para gravar o segundo trabalho, No promises, dispensou os requintes de grande produção e manteve a suavidade folk (blues branco, segundo ela). Mas a personalidade salta aos olhos na proposta do disco: ela simplesmente musicou o melhor da poesia em língua inglesa, clássicos que incluem W. B. Yeats, Emily Dickinson, Dorothy Parker e W. H. Auden. Ela começou a escrever algumas letras em inglês, “apenas pelo lado lúdico”, passou a ler poemas para se inspirar e acabou se encantando pelo que lia.

Nesse ponto, Carla Bruni não nega a ascendência francesa de sua avó materna: adora literatura e faz questão de citar nomes e nomes de grandes autores: “A escrita depende enormemente da leitura. Dois anos antes de gravar Quelqu’un m’a dit eu li todo o Marcel Proust.” Como uma francesa de temperamento moderno, trata com a mesma leveza a alta e a baixa cultura, alinhando entre seus artistas preferidos, por exemplo, Bob Dylan e Charles Baudelaire, ou Lou Reed e William Shakeaspeare. Ao charme discreto de mulher culta, some-se o humor refinado. Já entrou para o repertório das lendas atuais o seu encontro com Sarkozy: ao ser elogiada pelo presidente depois de um show em um jantar, Carla perguntou se ele estava de carro. Sarkozy, meio sem jeito, disse que sim: ele não estava com um carro, mas, isso sim, estava acompanhado de uma frota de veículos pretos.

O rápido casamento a pegou de surpresa na finalização de um novo trabalho, que ela pretende levar até o final: “Decidi doar todo o faturamento desse disco. Não sei ainda para qual causa porque o sofrimento está por toda parte”, disse na entrevista ao L’Express. Com uma nova agenda pela frente (o primeiro encontro oficial é com a rainha da Inglaterra, Elizabeth II), Carla cancelou as apresentações que faria em Paris nos próximos meses. Não pretende, porém, abandonar a carreira. “Não vou me privar de escrever e compor, mas até o final do mandato de meu marido não gravarei mais nenhum disco”, diz ela. Nos poucos dias de experiência no papel de primeira-dama, Carla já arrisca uma opinião sobre seu novo mundo: “A política suscita pulsões primitivas, ao passo que a arte liberta pulsões mais sutis, mais refinadas e civilizadas.