Três verões (Bertrand Brasil, 458 págs., R$ 49), obra de estréia da americana Julia Glass – que em 2002 venceu o National Book Award, um dos mais importantes prêmios literários do
cenário internacional –, tem uma narrativa que em nada fica a dever a autores mais experientes na arte de dar vida e credibilidade aos personagens
e seus dramas. E eles não são poucos. A trama começa com o patriarca de uma tradicional família escocesa, Paul McLeod, viajando pela Grécia em junho de 1989, após a morte da esposa com quem teve três filhos. Num de seus passeios, ele se apaixona por uma jovem artista e assim rememora os detalhes de seu próprio casamento e da rotina morna com a qual se envolveu. Anos depois, os filhos se reúnem na mansão familiar para chorar a morte do pai e confrontar suas próprias diferenças. Fenno, o mais velho, é um intelectual homossexual, que optou por viver em Nova York, onde mantém uma pequena livraria. David e Dennis são gêmeos. O primeiro é um veterinário medíocre e rude, e o segundo trabalha como chef de um pequeno restaurante na França, após recuperar-se de um breve período de dependência química.

Em meio à incerteza sobre o que fazer com as cinzas do velho McLeod, cria-se uma situação insólita que abala algumas das convicções mais íntimas de Fenno. A parte mais delicada e bem construída do livro, entretanto, é a que mostra a difícil transição da efervescente Nova York dos homossexuais assumidos para o universo em que a Aids introduz pânico e morte. Amores culpados, reprimidos ou não, e a mudança de humores provocada pela pesada carga de acompanhar os amantes na reta final da doença, numa época em que os coquetéis ainda não eram utilizados em larga escala, são trabalhados com uma elegância e sensibilidade notáveis. Os encontros e desencontros dos personagens caminham para um desfecho nada previsível e, o melhor de tudo, perfeitamente coerente. Afinal, a vida prega mesmo essas peças.’