"Um novo capítulo na história da Indonésia foi escrito ontem. Todos nós, indonésios, estamos em uma sala de espera, aguardando apreensivos e esperançosos pelo novo presidente.” Assim estampou um dos principais jornais da capital Jacarta no dia seguinte à primeira eleição direta para presidente, realizada na segunda-feira 5. É um feito e tanto para um país que somente há seis anos viu terminar a ditadura do general Mohammed Suharto (que governou o país por 32 anos). O sucesso da consolidação do processo democrático é visto com muito interesse pela comunidade internacional, pois a Indonésia congrega a maior população muçulmana do mundo. Dos 220 milhões de indonésios, 190 milhões seguem o islamismo. Conhecida pela interpretação mais tolerante do islã, a Indonésia pôde mostrar ao mundo – mais incisivamente ao Iraque – a viabilidade da junção do islamismo à democracia. E quem saiu à frente na disputa eleitoral foi o general de reserva Susilo Bambang Yudhoyono, numa demonstração de que o militarismo ainda é uma força no país, mesmo após três anos do governo civil de Megawati Sukarnoputri. Nos resultados preliminares, Yudhoyono, do Partido Democrata, obteve quase 34% dos votos contra 26% de Megawati, do Partido da Luta Democrática Indonésio (PDI-P), que briga por um segundo mandato. De acordo com a Comissão Eleitoral da Indonésia, o resultado oficial será conhecido até o dia 15 de julho. Se confirmado um segundo turno entre os dois, como é bem provável, será realizado em setembro.

Yudhoyono, 54 anos e conhecido pelas iniciais SBY, fez parte do gabinete de Megawati como ministro da Segurança até março último, quando renunciou por divergências com a chefe. Ele ficou conhecido internacionalmente pelo papel que desempenhou no combate ao fundamentalismo islâmico, responsável pela explosão de uma casa noturna em Bali que deixou 202 pessoas mortas em 2002. Também poeta e cantor nas horas vagas, a imagem de integridade e liderança que os indonésios têm do ex-general se contrapõe à da atual presidente Megawati, que evita dar entrevistas coletivas e fazer discursos. Mesmo tendo sido aliado militar da era Suharto, a imagem de SBY não está vinculada ao autoritarismo do ex-ditador (o que lhe valeu o apelido de Teflon) e não abala a simpatia que a população tem por ele. A mesma simpatia que Megawati teve em 2001 ao assumir a Presidência por ser filha de Achmad Sukarno – general que declarou a independência da Indonésia em 1949 – e que agora lhe falta na tentativa de reeleição.

A erradicação da corrupção será um dos principais desafios do próximo presidente. Segundo um estudo da Transparência Internacional (TI), o arquipélago é o décimo país mais corrupto e ostenta o triste título de ter sido governado pelo ditador que mais desviou dinheiro no mundo. Para a TI, Suharto desviou uma quantia estimada entre US$ 15 bilhões e US$ 35 bilhões dos cofres públicos. A própria Procuradoria-Geral admite que a corrupção suga do país US$ 2 bilhões por ano. “A corrupção é um problema notório na Indonésia e uma das razões para o mau desempenho eleitoral de Megawati é que ela fez muito pouco para combatê-la. Mas só o fato de ter havido uma corrida presidencial livre já é um bom sinal”, afirmou a ISTOÉ Robert Barnes, da Universidade de Oxford. Qualquer que seja o futuro governante, uma coisa é certa: além de combater a corrupção, o próximo mandatário indonésio terá a difícil missão de sufocar o fundamentalismo islâmico e manter unido um país dividido por diversas tensões étnicas.