Foi provavelmente tomando um tradicional chá inglês que os amigos Charles e Henry decidiram emprestar seus sobrenomes para criar a centenária Rolls-Royce. O encontro histórico, que ocorreu num hotel em Manchester, na Inglaterra, se deu no início do século XX. Desde então, status e poder são qualidades indissociáveis da famosa estatueta “espírito de êxtase” afixada no capô dos carros. O tal encontro teve um quê de visionário: os sócios queriam mesmo era construir veículos para uso em terra, na água e no ar. Mais do que um desejo, a ambição de Charles Rolls e Henry Royce virou realidade no centenário da empresa. A Rolls-Royce, que nasceu como montadora em 1904, transformou-se, em 2004, numa empresa de energia. Hoje, são mais de 54 mil turbinas a gás fornecendo energia. O comprimento de todos os dutos que as alimentam seria suficiente para três voltas em torno da Terra.

Como um gigante de 35 mil funcionários espalhados por 48 países, a mega-empresa deixou de produzir carros há 31 anos. Por US$ 70 milhões, a Rolls-Royce vendeu os direitos do nome e do uso da marca para a BMW. A empresa, que um dia produziu carros para a elite de sangue azul, agora está emprestando a força e a potência de sua marca para turbinas a gás. “Nossos motores são tão poderosos que uma só lâmina de turbina, com apenas dez centímetros de comprimento, é capaz de gerar a mesma potência de um carro de Fórmula 1”, orgulha-se seu presidente mundial, John Rose. A empresa é hoje a segunda maior fabricante de motores militares do mundo e, em 2003, seu faturamento foi de aproximadamente US$ 1 bilhão. Nesse mundo dos negócios, só mesmo a americana General Electric para fazer frente ao poderio turbinado da concorrente inglesa.

Em 100 anos de história, nem sempre a vida da empresa foi próspera. Nos anos 70, por exemplo, sofreu um processo de estatização na Grã-Bretanha. Problemas financeiros levaram-na às mãos do governo inglês. Foi só no fim da década seguinte que a Rolls-Royce voltou ao controle privado e tomou-se a decisão de promover uma cisão empresarial. Data dessa época a idéia de vender para terceiros a fabricação dos carros que um dia fizeram a fama e o glamour da empresa. “Temos orgulho do nosso passado e dos carros que fabricamos, mas estamos focados com os desafios do futuro”, comenta o diretor-presidente para a América do Sul, Francisco Itzaina. É do seu escritório no centro do Rio de Janeiro que esse uruguaio comanda as operações da empresa para os países do Cone Sul. O Brasil é a menina-dos-olhos da empresa.

“É que a demanda de energia no Brasil está crescendo muito mais rápido que o produto interno bruto nacional”, comemora o executivo, que calcula um aqueci mento do setor em torno de 4% a 6% ao ano. Antes mesmo de o governo anunciar as diretrizes para o programa de co-gestão de energia, a Rolls-Royce já acertara com a Petroquímica União a implantação de uma termelétrica em Santo André, no ABC paulista. “Só estamos esperando as regras serem anunciadas para entrarmos em operação”, comenta Itzaina, que se recusa a informar o volume de investimento no projeto.

O setor naval é outro que está aquecendo os negócios da empresa no Brasil.
Dos 33 petroleiros encomendados pela Petrobras, 27 exibem a marca inglesa –
dos equipamentos de propulsão à cadeira do capitão. Além disso, a companhia
venceu três licitações para construção de plataformas de petróleo.

Os dois únicos grandes projetos do setor de aviação civil também estão sob a tutela da Rolls-Royce. Caberá à empresa desenvolver os motores para os aviões Airbus A-380 e 7E7 da Boeing. O desejo visionário dos amigos Charles Rolls e Henry Royce de fornecer energia e veículos para uso em terra, na água e no ar já foi realizado. A meta para os próximos 100 anos é manter viva essa onipresença empresarial.