Num país onde 40 milhões de brasileiros passam fome, milhares de toneladas de alimentos são jogados no lixo todos os dias. Essa contradição aponta que antes de tentar matar a fome é preciso combater um outro mal: o do desperdício. Mas enquanto a cultura do consumo consciente não se estabelece, iniciativas bem-sucedidas criadas por entidades da sociedade civil mostram como transformar esse mal em um grande aliado no combate à fome e à desnutrição. O Serviço Voluntário de Assistência Social (Servas), uma organização não-governamental de Belo Horizonte (MG), desenvolve desde 1998 o programa Vitasopa – um complemento alimentar que enriquece a comida de milhares de crianças e adultos em creches, escolas e asilos. São 672 entidades beneficiadas no Estado, entre elas a Santa Casa e as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae).

A sopa é feita com os excedentes de legumes, verduras e cereais doados por comerciantes do Ceasa e por produtores rurais mineiros. O que antes iria para o lixo, embora adequado para o consumo, é esterilizado e transformado numa mistura pastosa de alto valor nutritivo. “Ela pode ser usada também no preparo de outros alimentos, como carne, frango ou ovos. Serve ainda como ingrediente para dar sabor às massas de pães e pizzas. O resultado é uma refeição saborosa e rica em nutrientes. Esse trabalho tem ajudado a combater três graves problemas brasileiros: a fome, a desnutrição e o desperdício”, afirma Andrea Neves da Cunha, presidente do Servas e irmã do governador mineiro Aécio Neves (PSDB). A Vitasopa é distribuída gratuitamente em latas e rende até 40 refeições.

Segundo ela, o programa é mantido graças a parcerias com entidades
empresariais, que financiam parte dos custos, e com o governo do Estado,
que disponibiliza transporte para recolhimento dos alimentos e distribuição
do produto já industrializado nas instituições conveniadas. Também veio do
governo estadual a instalação da fábrica que produz o Vitasopa. O êxito do pro-
grama do Servas – que hoje chega a 217 municípios mineiros – levou a ONG a ampliar as opções de seu cardápio. Além da sopa, serão produzidos conservas (cenoura e batatas) e doces de frutas. O Centro Universitário de Belo Horizonte, outro parceiro do programa, estuda desidratar o suplemento, o que facilitará a distribuição. A previsão é que essa nova produção seja feita já nas três novas fábricas que a instituição quer construir até o final do ano. Elas serão feitas em parceria com as prefeituras dos municípios de Montes Claros, Janaúba e Uberaba e com o governo estadual, que irá financiar os equipamentos. “Com isso, mais pessoas poderão ser beneficiadas”, assegura Andrea.

Setenta e oito crianças da escola infantil Educar, em Contagem (MG), já provam do alimento desde o ano passado, quando a mistura foi adicionada ao cardápio da instituição. Filhos de funcionários do Ceasa, a maioria apresentava problemas de desnutrição. Uma dieta balanceada fortalecida pelo uso da sopa está ajudando a mudar a realidade dessas crianças. “Usamos a Vitasopa como um ingrediente a mais no preparo das refeições. Adicionamos o suplemento até em tortas e pães que preparamos para os lanches”, conta a psicóloga Maria Dalva Garcia Pacheco, coordenadora pedagógica da escola que já começa a observar resultados. “Eles estão ganhando peso e com uma cor de pele mais saudável.”