Pelo andar da carruagem, o Brasil pode ter, em 2010, a mais monótona eleição presidencial da história. A se confirmar a polarização entre José Serra e Dilma Rousseff , os debates presidenciais terão menos audiência do que aqueles programas para venda de facas e sofás infláveis pela tevê. Olhando de perto os dois candidatos, eles bem que poderiam formar a verdadeira chapa puro-sangue, com a qual os tucanos andaram sonhando.

Serra tem as pistas do Rodoanel, Dilma o PAC. Serra tem um passado de luta contra a ditadura, Dilma também. Um venderá gestão, o outro idem. Até nas condições materiais, tudo será semelhante. Tempo de tevê, marqueteiros, doações de campanha… Nada que um tiver faltará ao outro. Carisma e simpatia também não são pontos fortes desses presidenciáveis, que, com tantas afinidades, correm até o risco de se apaixonar num desses debates da madrugada. Dois candidatos perdidos numa noite suja.

Até nos erros, Serra e Dilma se parecem. Contra os dois, pesa a suspeita de serem intervencionistas demais na economia. O governador paulista critica a política do Banco Central e a ministra da Casa Civil também não morre de amores por ela. Ambos tomam partido em grandes negócios empresariais, quando isso não é, exatamente, papel de governos. E, ao que tudo indica, os dois gostam de dourar suas biografias. Dias atrás, soube-se que o site da Casa Civil mentia sobre a formação da ministra.

Ao contrário do que se dizia, ela não concluiu mestrado nem doutorado. Dilma reconheceu o erro, mas seus acólitos espalharam que José Serra também não teria terminado o curso de economia – o que o governador paulista não desmentiu. No fundo, uma grande bobagem, pois o presidente Lula está aí para provar que diploma nunca lhe fez falta.

No fundo, a diferença será o apoio presidencial. Dilma poderá dizer: "Eu tenho Lula, você não tem." Em função disso, começou a correr o boato de que Serra desistiria da disputa presidencial, contentando-se com uma reeleição paulista. Ele só entraria no páreo nacional com certeza de vitória, o que não é seguro se o adversário for seu clone de saias, carregado por um presidente com 80% de popularidade.

No entanto, eleições não foram feitas para marcar o encontro de almas gêmeas, como Dilma e Serra, mas sim para propiciar o choque de ideias. Quando o eleitor se deparar com as fotos dos dois na urna eletrônica, poderá pensar que cairiam melhor num convite de casamento do que numa disputa. E é por isso que algo de novo talvez possa desabrochar. Como diria o poeta mineiro Augusto Frederico Schmidt, há um sussurro, um murmúrio que denuncia o que ainda não se revelou.