19/01/2011 - 12:18
As enxurradas e os deslizamentos de terra provocados pelo excesso de chuva na região serrana do Rio de Janeiro entre os dias 11 e 12 de janeiro já causaram a morte de 727 pessoas. Segundo o último levantamento divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde e Defesa Civil nesta quarta-feira, 345 pessoas morreram em Nova Friburgo, 298 em Teresópolis, 63 em Petrópolis e 21 em Sumidouro.
Os números da secretaria, entretanto, não contabilizam para São José do Vale do Rio Preto três mortes confirmadas pela Defesa Civil municipal. O balanço do Estado também não confirma uma morte em Bom Jardim, registrada pela Polícia Civil. De acordo com os dados oficiais, 6,4 mil pessoas estão desabrigadas ou desalojadas em Petrópolis, 5.190 em Nova Friburgo e 2.240 em Teresópolis.
Inmet
As chuvas que atingiram a região serrana do Rio na última semana estão entre as mais intensas já registradas na localidade e as de maior índice pluviométrico da história de Nova Friburgo, a cidade mais afetada. Em Petrópolis e Teresópolis, no entanto, o índice ficou abaixo dos recordes anteriores. A informações são da chefe da Seção de Previsão do Tempo do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) no Rio de Janeiro, Marlene Leal.
Segundo a meteorologista, em razão da intensidade pluviométrica das chuvas e da abrangência das áreas onde elas ocorreram a “catástrofe era inevitável”. “Na proporção e na intensidade com que as chuvas caíram não havia como evitar que uma tragédia acontecesse. Eu confesso que a proporção atingida – em uma área tão extensa, região montanhosa, de vale, aliada àquelas cabeças d’água que se formaram descendo em velocidade montanha abaixo em uma área imensa – me surpreendeu.”
Somente em Nova Friburgo a concentração pluviométrica chegou a 182,8 milímetros em um período de apenas 24 horas. Ela explicou à Agência Brasil que ocorreram três momentos de chuva forte em Friburgo: entre as 4h e as 5h choveu 30 milímetros, em seguida, houve outra pancada de chuva que concentrou 60 milímetros e, na sequência, mais 18 milímetros.
“E depois a chuva continuou até chegar, em um período de 24 horas, aos 182,6 milímetros de concentração pluviométrica, um recorde – o maior volume pluviométrico da história de Friburgo desde que os registros são feitos. É preciso lembrar, ainda, que já havia ocorrido uma chuva na véspera de mais de 90 milímetros, o que já havia deixado o solo encharcado”, explicou.
De acordo com a meteorologista, o recorde anterior em Nova Friburgo havia sido de 113 milímetros em um período de 24 horas, registrado em 24 de janeiro de 1964. “Acho que a extensão abrangida pela chuva é que foi um dos principais problemas. Por isso, a proporção da catástrofe foi imensa. Dificilmente se poderia evitar o que aconteceu diante da intensidade da chuva. A gente passou o aviso, mas não esperávamos que fosse nas proporções que atingiu.”
A formação do relevo da região também contribuiu para a catástrofe. “O volume pluviométrico altíssimo levou a formação daquelas cabeças d’água. Aliadas à topografia da região e a ocupação desordenada em algumas regiões, e que não é coisa de agora, não haveria nenhum aviso meteorológico ou alerta da Defesa Civil que resolvesse o problema.”
O Inmet, segundo ela, não tem autoridade para divulgar alertas meteorológicos – um papel da Defesa Civil, de acordo com a especialista. Ao Inmet cabe divulgar Aviso Meteorológico Especial com a previsão e as possibilidades de chuva de maior ou menor intensidade. Ela garantiu que na tarde do dia 11 o Aviso Meteorológico continha dois informes: um com a possibilidade de chuvas moderadas a forte, atingindo a divisa de Minas Gerais com o Rio de Janeiro, a região serrana, o Vale do Paraíba e a região do litoral sul da Costa Verde. O outro enfocava justamente a possibilidade da ocorrência de um acumulado significativo de chuva. “O que para nós significa um volume pluviométrico acima de 100 milímetros em um determinado período de tempo relativamente curto.”
A meteorologista diz que é preciso lembrar que, no final do ano – quando as pessoas estavam preocupadíssimas com o tempo para a noite do dia 31 – O Inmet alertou a população sobre a preocupação com as chuvas dos primeiros dias do ano. “E elas poderiam cair no litoral sul, na região dos lagos ou na serrana como acabou acontecendo”, disse. “A gente já via claramente a proporção das chuvas que cairiam nos dias que se seguiriam e eu alertei sobre esse risco”, completou.
Banco Mundial
O Banco Mundial (Bird) vai liberar um empréstimo de 485 milhões de dólares para apoiar um programa de construção e prevenção de desastres no estado do Rio de Janeiro, afetado por chuvas devastadoras na última semana, anunciou a instituição na noite de terça-feira (18). "Esperamos que a primeira parcela do empréstimo, no valor de 290 milhões de dólares, seja aprovada nas próximas semanas", afirmou o diretor do Bird para o Brasil, Makhtar Diop.
A ajuda foi anunciada ao fim de uma reunião em Brasília do vice-presidente do Banco Mundial para a Redução da Pobreza, Otaviano Canuto, com a presidente Dilma Rousseff, representantes do governo do Rio de Janeiro e do governo federal. Uma primeira ajuda de 20 milhões de dólares, que originalmente estava destinada a um programa rural no Rio, foi deslocada em regime de urgência para obras de emergência.
Outro programa de assistência técnica, de 30 milhões de dólares, está sendo preparado para melhorar a capacidade institucional dos estados para enfrentar este tipo de desastre. O Bird prepara uma nova estratégia de empréstimos para o Brasil que deve ser aprovada em julho, e que terá como um dos eixos principais a prevenção de desastres naturais.
Plano de alerta
Mais de 24 horas depois do anúncio oficial, a criação do Sistema Nacional de Alerta e Prevenção de Desastres Naturais seguia nessa terça-feira (18) sem autorização de gastos para começar a sair do papel. O projeto aprovado pela presidente Dilma Rousseff (PT) prevê a compra de 15 radares meteorológicos e 700 pluviômetros, além de um complexo mapeamento de 800 áreas de risco do País.
Para começar a funcionar na próxima temporada de chuvas, o sistema vai precisar de autorizações extras no Orçamento de 2011, no momento em que o governo analisa cortes de gastos. Responsável pelo plano, o ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, não divulgou estimativas. Na reunião com Dilma, falou-se em R$ 480 milhões.
O mapeamento das áreas de risco exigirá aeronaves equipadas com sensores a laser, segundo o projeto ao qual o Estado teve acesso. O documento sugere a convocação de Batalhões de Engenharia do Exército para o trabalho, que o texto chama de tarefa "hercúlea". O Ministério da Integração Nacional encomendou um levantamento das áreas de risco à Universidade Federal de Santa Catarina.
Bolsa Família
Os beneficiários do Bolsa Família de cinco cidades atingidas pelas chuvas no Rio de Janeiro e em Minas Gerais já têm, desde essa terça, o dinheiro do programa disponível para saque. Os municípios beneficiados com a antecipação do pagamento são Areal, Sumidouro, São José do Vale do Rio Preto e Bom Jardim, na região serrana do Rio – onde o número de mortos, segundo a Defesa Civil, é de 712 -, e Cuparaque (MG).
As cinco cidades possuem cinco mil famílias atendidas pelo Bolsa Família. Os valores totais de benefícios chegam a R$ 434 mil. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, mesmo quem perdeu o Número de Identificação Social (NIS) do Bolsa Família ou todos os documentos poderá receber o dinheiro – o beneficiário deve procurar a prefeitura para obter uma declaração que atesta a inscrição.
O ministério havia anunciado a mesma medida para Nova Friburgo, Petrópolis e Teresópolis. Esses três municípios fluminenses também terão a liberação imediata de cerca de R$ 2 milhões, verba que será destinada a amenizar o sofrimento de 84 mil moradores atingidos pelas chuvas e deslizamentos. Nas demais cidades, o pagamento será realizado conforme o cronograma do Bolsa Família. O benefício varia de R$ 22 a R$ 200, conforme o perfil de renda e a quantidade de filhos de até 17 anos em cada família.
Teresópolis desapropria fazenda
A prefeitura de Teresópolis (RJ) desapropriou nessa segunda-feira (17), em caráter emergencial, uma fazenda de 190 hectares, supostamente improdutiva, ao custo de R$ 24 milhões, para que sejam erguidas 500 residências. A previsão é começar a construir em fevereiro e entregar as casas até dezembro.
Além das casas, a obra prevê escola, creche, posto de saúde e área de lazer. O jornal O Estado de S. Paulo não conseguiu localizar um representante da Imobiliária Territorial Ermitage, dona da fazenda, para comentar a desapropriação, que se fundamentou no estado de calamidade pública em vigor. "Precisamos tomar medidas drásticas para restabelecer o direito de habitação e moradia digna dos cidadãos", disse o prefeito Jorge Mario Sedlacek (PT). "É preciso que saiam dos abrigos coletivos para abrigos intermediários, para que possam restabelecer os núcleos familiares."
Os 1.280 desabrigados de Teresópolis terão dificuldades para conseguir um novo teto. Segundo a prefeitura, já havia um déficit de mil residências antes da tragédia. Para agravar a situação, tampouco existe oferta de terrenos seguros para moradias. A prefeitura foi autorizada pela presidente Dilma Rousseff (PT) a fazer o pagamento de 2.500 aluguéis sociais, cada um em torno de R$ 400 ou R$ 500 mensais, até a entrega de casas populares.