Um forte espírito antiimperialista tomou conta da cidade mineira de Cataguases, na Zona da Mata, onde a população escolheu um dos lados na briga pelo controle da centenária Companhia Força e Luz Cataguazes-Leopoldina. Os controladores brasileiros e os fundos de investimento americanos Alliant Energy Holdings do Brasil e FondElec estão envolvidos em uma queda-de-braço que vai definir o futuro da empresa. Enquanto o conflito não se resolve, a companhia, responsável pela distribuição de 2% da energia elétrica consumida no País, perde o ritmo de crescimento.

A guerra começou quando os sócios americanos alegaram que tinham sido lesados pelo controlador Ivan Botelho, patriarca da família mineira. Foram dois anos sem pagar dividendos, já que a empresa vinha operando no vermelho com prejuízos acumulados de R$ 74 milhões entre 2001 e 2002. Para evitar um terceiro ano consecutivo sem lucro – o que, segundo a lei das sociedades anônimas, garantiria a mudança de controle –, os Botelho reestruturaram financeiramente a companhia, incorporaram o prejuízo e venderam ativos para gerar caixa e, assim, pagar dividendos. O que parecia ser a saída honrosa para colocar um ponto final na briga acabou se transformando numa disputa acionária de grandes proporções, que agora envolve toda a cidade.

“Estamos sendo vítimas de um golpe”, denuncia o vice-presidente Ricardo Botelho, acusando seus ex-sócios de desrespeitarem o acordo de acionistas. “São eles que estão descumprindo o contrato”, rebate Carlos Miranda, diretor da Alliant Energy. Para ele, os controladores estariam usando expedientes de xenofobia para constranger os sócios estrangeiros. As ruas de Cataguases, no dia da assembléia em que a redução de capital seria votada, foi coberta com faixas com mensagens antiimperialistas: “Fora gringos” e “Cataguases não é Iraque”.

O que era para ser mais uma entre as muitas brigas acionárias que movimentam o mundo dos negócios acabou resvalando para uma discussão sobre a capacidade ou não de o governo atrair investimentos estrangeiros. Há duas semanas, o vice-presidente internacional da Alliant, James Hoffman, esteve em Brasília para deixar o seguinte recado: novos investimentos no País vão depender da conclusão do caso Cataguazes. Foi recebido pelo vice-presidente José Alencar, mineiro e amigo dos Botelho. Hoffman tem um alto cacife: até agora, a Alliant despejou no Brasil cerca de US$ 450 milhões.

Um carnaval de liminares movimenta os corredores da Justiça e o número de pareceres emitidos chega a mais de 20. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) também foram acionadas. Segundo parecer da CVM, a xerife do mercado de capitais, tanto a operação de redução de capital quanto o pagamento de dividendos com a venda de ativos foram equivocados. A Aneel ainda estuda o caso, mas o fato de a CVM questionar a operação é um indício de que a agência vai seguir o mesmo caminho. Enquanto a briga continua, a população permanece mobilizada com faixas e cartilhas, transformando em assunto de interesse nacional uma disputa de caráter privado.