i107141.jpgA reunião do G-20, grupo das 20 maiores economias do mundo, realizada em Londres, deixou claro algumas ironias da crise. O Fundo Monetário Internacional (FMI), que foi execrado por sua atuação em diferentes crises internacionais no passado recente (Ásia, Argentina, Brasil, México, etc.) e que muitos analistas, principalmente de esquerda, consideravam uma instituição anacrônica e decadente, foi a grande ganhadora do encontro. Recebeu a promessa de um aporte adicional de recursos da ordem de US$ 500 bilhões, ou seja, teve seu capital multiplicado por três. Este aumento de recursos pode ser considerado uma espécie de reconhecimento pelos bons serviços prestados pela organização à comunidade econômica internacional no passado.

O FMI, que sempre primou pelo cuidado com que gerenciava seus recursos, anunciou uma linha de empréstimos aos países praticamente sem condicionalidades, em outras palavras, sem que os países que irão receber o dinheiro tenham de se comprometer com políticas que tornem mais provável o retorno destes recursos ao Fundo. Para não perder o costume, um país latino-americano foi o primeiro a utilizar esta linha, mas as notícias são de que a fila é grande. Afinal, dinheiro barato sem contrapartida é sempre muito bem-vindo.

A origem dos novos recursos do Fundo ainda não está totalmente clara, mas um país que se declara comunista se dispôs a fazer parte do conjunto de países que irão cooperar. Da mesma forma, um país emergente com um governo que se declara de esquerda e que até há pouco tempo não escondia seu desprezo pelo FMI saudou o aumento de recursos da instituição. Ou seja, o aumento de recursos para que o principal símbolo do capitalismo mundial possa aumentar seus empréstimos terá origem, entre outros, no maior país comunista do mundo e em um país com um governo que se considera de esquerda.

Os países que mais provavelmente irão necessitar destes novos recursos do FMI são os do Leste Europeu, que, a 20 anos anos atrás, eram comunistas. Provavelmente devido à pouca experiência com as nuances de uma economia de mercado, estes países se endividaram em excesso em euros e em dólares e hoje não têm condições de honrar seus compromissos externos, necessitando de recursos do Fundo para evitar uma catástrofe econômica.

Ao mesmo tempo, o principal líder entre os países capitalistas, que sempre defendeu políticas fiscais e monetárias responsáveis e controle sobre a dívida pública, advogou um aumento generalizado dos déficits fiscais no mundo e a implementação de políticas monetárias agressivamente expansionistas. Estes objetivos somente não foram obtidos porque dois países europeus, um deles nem sempre comprometido historicamente com a responsabilidade fiscal e monetária, resistiram às pressões das autoridades do líder do capitalismo mundial.

Por outro lado, ao contrário do país comunista e do país emergente que se dispuseram a contribuir para o aumento dos recursos do FMI, o líder do mundo capitalista ainda não se comprometeu a contribuir.

Enfim, o mundo está mudando. Se na direção correta, é ainda impossível afirmar. Por um lado, economias que até há pouco tempo faziam apologia do planejamento centralizado e atacavam o mercado hoje dão apoio incondicional ao ícone do capitalismo (FMI). Por outro, economias que sempre se pautaram por respeitar e valorizar as regras de mercado começam a utilizar o Estado como muleta para resolver seus problemas. São as ironias da crise.

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