Diante da profundidade da crise internacional, a economia brasileira tem reagido de forma bastante positiva. Ainda que não seja uma "marolinha" (o PIB caiu 4,4%, a produção industrial caiu quase 10% e os investimentos caíram mais de 14%), o efeito sobre a economia brasileira tem sido menos drástico do que sobre a maioria das outras economias. Se, no curto prazo, nosso desempenho parece bom, o que devemos esperar para o longo prazo (crescimento e desigualdade)?

O comportamento da economia nesta crise decorre de um conjunto de políticas econômicas implementado desde o final dos anos 80. Entre estas, devemos destacar a abertura da economia, as privatizações (CSN, Vale, telefonia, energia, transportes, etc.), as reformas da previdência, ainda que incompletas, e do mercado de crédito, a política de ajuste fiscal, a geração de superávits primários, a redução da relação dívida/PIB, a política de câmbio flutuante e a autonomia operacional do Banco Central (BC).

Ainda que todos estes fatores sejam fundamentais, três deles merecem particular atenção: as privatizações, a queda da relação dívida/PIB e a autonomia do BC. Empresas estatais tendem a ser menos eficientes do que empresas privadas por razões estruturais. Portanto, a atuação do Estado deve se restringir àqueles setores em que, apesar de serem considerados fundamentais para o desenvolvimento do País, o setor privado não tem interesse em atuar. A privatização dos serviços de utilidade pública (telefonia, energia, transportes, etc.) foi particularmente importante para gerar ganhos de produtividade da economia.

Equilíbrio fiscal e relação dívida/PIB sob controle são fundamentais para que o serviço da dívida seja compatível com a capacidade de arrecadação do Estado. Caso contrário, a taxa de juros se torna muito elevada, gerando um ciclo vicioso que, no limite, pode levar ao calote da dívida, gerando desconfiança quanto à sustentabilidade do endividamento público.

A autonomia do BC é importante para evitar que o governo utilize a emissão de moeda para financiar seu déficit e gerar inflação. Inflação alta e menos previsível significa taxas de juros mais altas. Ou seja, Estado muito grande, desequilíbrio fiscal e inflação elevada geram aumento das taxas de juros. O principal efeito de taxas de juros mais elevadas, no longo prazo, é uma menor taxa de investimento. Como a taxa de crescimento da economia depende da taxa de investimento (em capital físico e em capital humano), o resultado é menor crescimento no longo prazo.

Manter estes fundamentos é essencial para que o País tenha um desempenho positivo quando a economia mundial retomar o crescimento. Na verdade, também em 1929, o Brasil foi um dos primeiros países a sair da crise. Enquanto a economia americana retomou o crescimento somente nos anos 40, já em 1933 o Brasil voltava a uma trajetória de crescimento positivo. Apesar disso, o desempenho de longo prazo da economia brasileira (nos 80 anos seguintes) não pode ser qualificado como muito brilhante.

Parte importante da explicação para esta má performance decorre de uma estratégia de crescimento que favoreceu o fechamento da economia, a excessiva participação do Estado, o desequilíbrio fiscal e a não autonomia do BC. A outra parte do resultado decorre da baixa importância que a sociedade brasileira deu à educação e a instituições microeconômicas pouco amigáveis ao investimento. Estas foram as lições que não aprendemos com a crise dos anos 30. Será que vamos aprender desta vez?

José Márcio Camargo é professor do departamento de economia da PUC/Rio e economista da Opus Gestão de Recursos