Elas nadam rapidamente, saltam e mergulham novamente sem provocar o barulho que se espera de animais de suas proporções. Navegam para a frente flexionando a cauda para cima e para baixo, em vez de movê-las lateralmente como a maioria dos peixes. Elas são especiais e surpreendentes. Para mudar de direção, por exemplo, movimentam as suas nadadeiras peitorais da mesma forma como os aviões inclinam suas asas. Todo esse quadro seria somente um alegre espetáculo da natureza se não estivéssemos falando de uma espécie animal que atualmente se move nos mares num desesperado mecanismo instintivo de sobrevivência. Trata-se das baleias, o maior e mais pacífico mamífero do mundo, que estão sendo obrigadas a enfrentar uma arriscada e mais longa rota de migração em busca de alimento, devido ao derretimento das geleiras que cobrem a Antártica. Não é sem motivo, portanto, que biólogos e ambientalistas de todo o mundo, que tanto as admiram, também alertem com insistência para o risco de sua extinção.

Longe de seu habitat e nadando no limite da exaustão, elas procuram novas regiões marinhas geladas em busca de alimentos e da sobrevivência

Como uma fileira de peças de dominó em que a queda de uma derruba as demais, os cientistas vêem o planeta atravessar cada vez mais o caos ambiental por causa do efeito estufa. O recuo da camada de gelo na Antártica, fenômeno provocado pelo aquecimento da atmosfera terrestre, coloca assim em perigo incessante as já ameaçadas baleias migratórias ao reduzir suas áreas de alimentação. O mais recente sinal vermelho foi dado na semana passada pelo Worldwide Found for Nature (WWF), entidade que cuida da preservação de animais em todo o planeta. Mais: os biólogos já estimam que o gelo que cobre o oceano Antártico desaparecerá nas próximas quatro décadas, e entre tudo aquilo que hoje se tenta salvar para minimizar a degradação ambiental do planeta estão as baleias. Ou melhor: está o seu principal e mais imprescindível alimento, o krill, um tipo de microcamarão que, por sua vez, vive graças às algas que proliferam em águas geladas. Sem essas águas não haverá mais esse tipo de camarão e, sem ele, as baleias não conseguem se nutrir. Como se disse, trata- se de um efeito dominó. Baleias das espécies jubarte e minke, por exemplo, chegam a viajar sete mil quilômetros fugindo das águas quentes e buscando o pólo Antártico para se alimentar de krill. Agora, esse percurso ficou ainda maior e elas têm de se arriscar em mais 500 quilômetros para encontrar alimentos. "Chegam exaustas a seu destino, no limite de suas energias. Sem dúvida, muitas não resistirão", diz Stephen Palumbi, professor de estudos marinhos da Universidade Stanford.

7500 quilômetros é a nova distância média percorrida pelas baleias
para se livrarem do derretimento das geleiras

Pesquisadores e cientistas de diversos países afirmaram na semana passada que a redução de krill é "extremamente prejudicial para 80% das baleias do mundo que se alimentam nos oceanos do sul". A longo prazo, essa alteração das rotas migratórias poderá ser mais desastrosa do que se imagina. "Essencialmente, o que estamos vendo é que as baleias associadas ao gelo, como a espécie minke-antártica, enfrentam mudanças dramáticas em seu próprio habitat", diz Heather Sohl, dirigente do WWF. A sua preocupação faz sentido: se naturalmente elas vivem em média 60 anos, é provável que muitas nem cheguem a completar esse ciclo biológico de vida em conseqüência da quebra de sua cadeia alimentar. Segundo o relatório apresentado pelos especialistas, o prolongamento de 500 quilômetros nas rotas de migração das baleias não apenas as desgasta fisicamente como também reduz a temporada de permanência na região de alimentação – já que se levou muito mais tempo na "viagem". Entre as baleias mais ameaçadas pelo derretimento do gelo na Antártica encontram-se a baleia-azul (o maior animal do mundo, com 30 metros de comprimento, chegando a pesar 110 toneladas) e a cachalote. Recentemente, essas espécies começaram a ser protegidas pelos governos de diversos países depois de terem estado à beira da extinção no século XX, em virtude da caça desenfreada no Japão e na Noruega. Agora, mais uma vez, elas estão em situação crítica: faltam-lhes alimentos e fôlego para irem atrás de regiões marítimas mais distantes onde possam encontrar seus nutrientes naturais