O presidente Lula disse na semana passada que muitos estão torcendo pela volta da inflação. Errou no diagnóstico e no foco do adversário. Levou a discussão ao palanque como se o fato da volta da carestia fosse uma trama diabólica urdida nos gabinetes de adversários políticos. Sabe que não é, mas, sem maiores alternativas de combate à mão, saiu pela tangente. Deixou de explicar o básico: como vai partir para a frente desse mais novo e real problema que já maculou com números negativos nas pesquisas a imagem do seu governo? O Ibope registrou na segunda-feira 30: os eleitores temem a disparada dos preços. Pelos números, 65% deles acham que a inflação vai aumentar. O índice com tal opinião é o maior já verificado durante os seis anos de gestão de Lula. Em março passado, cerca de 50% dos entrevistados acreditavam nesse cenário. Hoje a maioria está reprovando a forma de combate ao maior de todos os fantasmas econômicos. Lula se surpreendeu com a avaliação, mas sabe que o calvário inflacionário está muito além das picuinhas políticas. Sabe também que nenhuma torcida organizada pode, lucidamente, apoiar esse descalabro. O Ministério da Economia parece fazer vista grossa ao assunto. Guido Mantega chegou a comentar que as expectativas estão muito alarmantes. Novamente, vai além de meras expectativas. O Dieese informou que a cesta básica já subiu quase 30% no semestre, por conta, em especial, dos alimentos. Ou seja, com o mesmo dinheiro, o trabalhador brasileiro está comendo 30% menos do que no início do ano. Treze alimentos de primeira necessidade tiveram seus preços remarcados em 14 das 16 capitais pesquisadas pelo instituto. Todos os investimentos financeiros no período já renderam abaixo da inflação semestral. E a corrida atrás do prejuízo pode recomeçar na base da ciranda da correção monetária. As remarcações em cascata são um veneno contra o qual não são eficazes bravatas ou brados demagógicos. No passado, o presidente Collor já chegou a dizer que debelaria a inflação com um único tiro. O presidente Sarney recorreu a mirabolantes planos de choques heterodoxos. Nada serviu. A estabilidade foi conquistada na base da confiança nas medidas que o real propiciou ao mercado. Lula, mais uma vez, só tem esse antídoto. E nele deve estar combinado controle do gasto público e incentivo à produção. Do contrário, mexendo apenas com os instrumentos monetários de juros e câmbio, pode colocar tudo a perder. E não vai haver torcida que dê jeito.

CARLOS JOSÉ MARQUES,
DIRETOR EDITORIAL