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TRANSFER_CULTURA URBANA. ARTE CONTEMPORÂNEA. TRANSFERÊNCIAS. TRANSFORMAÇÕES / Santander Cultural, Porto Alegre / até 28/9

Transfer é a manobra em que o skatista se desloca de uma rampa para outra. A palavra é perfeita para traduzir o fluxo de informações e referências entre os expoentes da arte urbana. Transfer_cultura urbana. arte contemporânea. transferências. transformações coloca em cena grafiteiros que fazem filmes, DJs que pintam cenários, videoartistas que criam HQs, fotógrafos que arquitetam pistas de skate. Todos autodidatas, multidisciplinares e skatistas. "A exposição busca uma afinidade estética que atravessa suportes e gerações", afirma Lucas Ribeiro Pexão, redator de revista de skate, fundador de uma das primeiras galerias focadas em arte urbana do Brasil e um dos curadores da mostra. "Vejo influências e raízes comuns, mas o que é realmente novo é a maneira como o skate está protagonizando essa história."

SK2.jpgA mostra reúne mais de 100 obras de brasileiros e estrangeiros. Na entrada, uma "instalação de arquitetura skatável", desenhada pelo arquiteto Pedro Mendes da Rocha em parceria com o coletivo Noh não deixa dúvida: o foco é o skate como expressão criativa. Além de apresentar jovens talentos, como o grafiteiro curitibano Rim, a artista e roqueira Silvana Mello ou o designer Bruno 9li, que cruza referências da alquimia, ufologia, calendário maia e de personagens da Disney, a mostra rende homenagem aos ícones desse movimento ligado ao grafite e à musica independente. Entre eles, o grafiteiro Herbert Baglione, o skatista-performer Mark Gonzales, "inventor do skate de rua e o primeiro cara que deslizou sobre um corrimão", segundo Pexão, e o designer paulistano Billy Argel, integrante de banda punk e ilustrador de capas de disco e de pranchas de skate nos anos 80. O evento terá ainda seminários e mostras de cinema e documentário, com filmes de cineastas como Spike Jonze, Mike Mills e Larry Clark. A exposição mostra a efervescência de um movimento com raiz na atitude punk, mas que abrange a cultura urbana sem preconceitos, influenciando o cinema, a moda e a publicidade. "A publicidade funciona como um meio de difusão, é uma maneira de abastecer nossa rede independente", diz Pexão. Billy Argel é designer gráfico e tipógrafo de grandes agências, Mark Gonzales é patrocinado pela Adidas e Rim desenhou um modelo de tênis para a Nike.

Crítica
 
Sombra e luminosidade
por FERNANDA ALBUQUERQUE
IBERÊ CAMARGO – MODERNO NO LIMITE
Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre/ até 31/8

Sempre que visitamos uma exposição, percebemos as obras em relação com o espaço onde estão inseridas. Em Iberê Camargo – moderno no limite, mostra que inaugura a nova sede da Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, essa condição se vê potencializada. Em primeiro lugar, porque o prédio projetado pelo português Álvaro Siza é tão autoral em suas soluções quanto as pinturas, desenhos e gravuras que abriga. A presença imponente do átrio central, o branco que domina o espaço e as linhas sinuosas contrastando com os ângulos retos fazem do local não apenas um receptáculo, mas um componente ativo da exposição. Em segundo, porque é a primeira vez que entramos em contato com o museu, o que faz com que a pouca familiaridade com suas formas as tornem ainda mais destacadas. E, em terceiro, porque o contraste das obras com o espaço reforça o partido que a curadoria de Mônica Zielinsky, Sônia Salzstein e Paulo Sérgio Duarte toma: o de evidenciar o drama e o sentido trágico da produção de Iberê Camargo.

Em meio à luminosidade da arquitetura, a atmosfera densa e sombria dos trabalhos se vê destacada. O desencanto com a condição humana e a profunda consciência da gravidade do viver, aspectos centrais na constituição da obra de Iberê, são trazidos à tona por um recorte, sobretudo de pinturas, que privilegia os tons rebaixados da paleta do artista, a densidade e o caráter revolto da matéria pictórica, bem como a ambiência de inquietude, solidão e abandono característica de suas criações – traços que se contrapõem à claridade do espaço e à precisão e afirmatividade de seu desenho. Organizada de modo não cronológico, a exposição oferece uma amostra vigorosa do universo poético do artista, fazendo conviver, lado a lado, o adensamento e dilaceramento de umas de suas formas mais caras, os carretéis, e a tragicidade dos personagens que habitam suas telas a partir dos anos 1980: os ciclistas e as idiotas.

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Fernanda Albuquerque é jornalista, curadora e crítica de arte

Ciclista, de Iberê Camargo