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ORIGEM
A palavra vigarice teria surgido do religioso
testamentário de heranças inexistentes

 

Teria sido o poeta português Fernando Pessoa quem, pela primeira vez, explicou a expressão conto do vigário. Seu comentário aparece em uma crônica publicada no jornal “O Sol”, em 1926, sobre a façanha de um pequeno proprietário rural chamado Manuel Peres Vigário. Ele teria comprado animais para a sua fazenda e pago aos negociantes de gado com notas falsas de 100 mil réis, episódio que ficou conhecido como os contos de réis do Manuel Vigário e mais tarde apenas como os contos do Vigário. Esta e muitas outras histórias que elucidam como a nobre designação religiosa terminou por derivar na palavra vigarista foram reunidas no livro “Os Contos e os Vigários – Uma história da Trapaça no Brasil” (Leya), uma interessante e divertida pesquisa realizada pelo historiador José Augusto Dias Júnior.

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Outra hipótese sobre as origens da expressão, apresentada pelo autor, parte da própria figura religiosa do vigário. No final do século XIX e início do XX operou na Espanha, em Portugal e no Brasil uma quadrilha que enviava cartas a famílias abastadas relatando passagens dramáticas e comoventes e, no meio de tanto choro, informava que havia uma herança vultosa em seu nome. Tudo isso com a chancela de um idôneo religioso, os devidos selos e carimbos, aparentando autenticidade. No Brasil, há pelo menos três registros documentados de pessoas que receberam a tal correspondência, todas assinadas pelo vigário espanhol Manuel Suarez Lopes, da suposta Iglesia Parroquial de Santa Maria, na província de Pamplona, na Espanha. Para cuidar dos trâmites legais do testamento, os beneficiados mandavam um valor em dinheiro. E nunca mais ouviam falar do tal religioso. Em um relato da época pode-se ler: “O conto do vigário é um laço armado com habilidade à boa-fé do próximo ambicioso. É o caso em que os espertos se fazem de tolos e o tolo quer ser esperto.”

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PESQUISA
O historiador José Dias Júnior resgatou os
casos de trapaça em delegacias do Sudeste

 

Para o autor, trata-se de uma definição lapidar desse tipo de trapaça que sempre apela para o desejo da vítima de se dar bem e levar vantagem, ainda que imponha certo risco. Esse padrão se repetirá em muitas outras situações no decorrer do século XX e sempre deve muito à fluência e habilidade quase teatral do enganador ao vender o seu peixe. Um caso verídico do gênero ocorreu em julho de 1969, enquanto a Apollo 11 fazia sua viagem à Lua. Um jovem sergipano chamado José Alves dos Santos levou para alguns fazendeiros do interior de Minas Gerais um mapa detalhado da superfície lunar e oferecia-lhes lotes no espaço. Ele fechou dois negócios e ainda trazia dinheiro em sua valise ao ser interrompido pela ação da polícia. Em Paris, pouco antes da Segunda Guerra Mundial, um famoso vigarista conhecido como conde Victor Lustig vendeu a dois empresários parisienses pedaços da Torre Eiffel. Na área das finanças, o primeiro espertinho de que se tem notícia é o italiano Carlo Ponzi. Ele começou a trapacear nos EUA com os seus próprios conterrâneos. Elegante e com fala fluente, qualidades fundamentais de todo o bom golpista, se apresentava como funcionário bancário e se oferecia para enviar somas em dinheiro dos imigrantes para seus familiares na Itália, sem a cobrança de taxas. Embolsava todo o dinheiro. A maracutaia foi descoberta e ele preso. Mas depois desse embaraço com a Justiça voltou ao crime em grande estilo e passou a atuar como especulador financeiro. Emprestava dinheiro e prometia devolver uma soma 50% mais elevada. Alguns vizinhos, amigos e donos de estabelecimentos comerciais desconfiaram, mas decidiram experimentar. Depois de alguns retornos vantajosos, mais pessoas passaram a participar e foi o princípio de uma ciranda financeira que chegou à considerável quantia de US$ 2 milhões em plenos anos 1920. A vigarice lhe custou 11 anos de prisão. E deixou, infelizmente, um legado que perdura até hoje.

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Leia um trecho do livro :

Lula, Wall Street e a revolução

Durante sua campanha eleitoral, Lula tampouco ajudou muito a ganhar simpatias em Washington. Como era um político espontâneo, que falava sobre qualquer tema a qualquer hora, quase não passava uma semana em que não dissesse algo que molestasse os conservadores que governavam em Washington.Nos meses anteriores à campanha, quando o entrevistei em Brasília, Lula ainda falava da Alca como de um “projeto de anexação da economia brasileira aos EUA”. Propunha não pagar a dívida externa brasileira e romper com o FMI — postura que mudou poucas semanas antes da eleição — e proclamava com orgulho seu apoio à ditadura cubana. Claro que boa parte dessas afirmações era para satisfazer a ala radical de seu partido, e contê-la à medida que se aproximava cada vez mais da classe empresarial e da economia de mercado. Mas suas declarações caíam mal nos EUA, especialmente no Congresso, onde não estavam tão enfronhados nos detalhes da política interna brasileira.
Quando perguntei a Lula, em Brasília, sobre os temores de Washington a respeito de suas ligações com Cuba, ele respondeu: “Estive em Cuba muitas vezes nos últimos vinte anos, e me considero um amigo de Cuba e um admirador do povo cubano, um povo com enorme auto-estima, que não recuou diante dos problemas e das adversidades, e que paga um preço muito alto por isso.”
Intrigado, perguntei como ele sabia o que o “povo cubano” quer, se este não pôde votar livremente em quatro décadas. Além disso, como podia um sindicalista como ele, que lutou contra a ditadura em seu país, continuar avalizando uma ditadura que não permitia sindicatos independentes?, perguntei. Lula retrocedeu um pouco: “Obviamente o fato de ser amigo de Cuba não significa que eu e o Partido dos Trabalhadores estejamos de acordo com tudo o que fazem. Em uma de minhas últimas viagens, tive a oportunidade de dizer publicamente a Fidel Castro que, para nós, Cuba não é um modelo, como tampouco são modelos os EUA ou a França”, respondeu. 9

 

 


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