Só no ano passado, os computadores brasileiros foram alvo de 75 mil ataques pela internet. Em apenas dois meses, uma empresa nacional de segurança identificou mais de quatro mil fraudes. O alarmante é que oito em cada dez crimes digitais são praticados por jovens. O relatório anual do FBI, a polícia federal americana, calculou que os danos com crimes digitais somam US$ 130 milhões, sendo US$ 43 milhões só com vírus. A insegurança está no breve espaço de um clique. Na luta pela proteção da informação já tínhamos os bandidos. Faltavam os mocinhos.

Assim nasceu a Hackerteen, uma escola feita para quem parece ter nascido diante do computador. Ali os adolescentes são educados para virar empreendedores da informática. Recebem aulas de ética e segurança da informação e se preparam para dominar um mercado saturado de invasões, fraudes e espionagens digitais. Quando o empresário Marcelo Marques percebeu a queda no desempenho escolar de seu primo de 14 anos, resolveu ter uma conversa franca com o garoto. “Apesar de passar o dia todo jogando, percebi que ele não tinha conhecimento técnico. Fui a lan houses e vi que a maioria dos garotos não conhecia informática muito bem”, conta. A partir daí nasceu o Hackerteen, curso com duração de 18 meses e mensalidade salgada, de R$ 416, feito para a garotada de 14 a 19 anos que queira se tornar um profissional qualificado no sistema Linux.

O primeiro diferencial está na sala de aula. Tudo acontece em uma sala de bate-papo (chat), onde a turma se reúne com os professores. Quatro em cada cinco aulas são a distância. Quando se encontram no curso, num bairro da zona sul de São Paulo, os jovens testam seus conhecimentos ao desvendar os crimes digitais de uma trama virtual. A metodologia baseia-se em desafios, mangás – as histórias em quadrinhos japonesas –, jogos RPG (Role Playing Games) e palestras.

Desmistificar o termo “hacker” é um dos objetivos do curso. Ao contrário do que muitos pensam, hacker não é ‘cracker’, o pirata que surrupia dados sigilosos. “Diferentemente do criminoso que invade sistemas, o hacker é um apaixonado
pela informática”, diz Marcelo Marques, sócio e professor do Hackerteen. Para separar o joio do trigo, a saída foi submeter os adolescentes a testes psicológicos. “Quase a metade deles não é aprovada porque só quer aprender a invadir computadores”, diz Marques.

Assim como um lutador de judô, os conhecimentos dos futuros heróis digitais são classificados por faixas: branca, amarela, verde, azul e preta. Para chegar à faixa preta, é preciso ter desde uma postura física correta diante do computador até montar um plano de negócios. “Queremos despertá-los para esse mercado de trabalho, mostrando histórias de gente que começou bem jovem”, conta Marques. Para o faixa azul Lucas Teske, 13 anos, a aula mais difícil é a de ética. “É bem puxado, o professor é exigente e dá provas depois de passar todo o conteúdo. Temos que estudar bastante.” A paixão de Lucas pelos computadores começou cedo, aos três anos, quando ele aprendeu a ler e escrever usando softwares educativos, antes de entrar para a escola. O fato de seu pai, Werner Teske, ser técnico em eletrônica contribuiu. “O Lucas era fechado, gostava de fazer tudo sozinho. Agora ele faz provas em grupo e aprendeu a ser mais responsável”, orgulha-se o pai.

O curso de piratas do bem é uma oportunidade para quem quer fazer de sua fissura por jogos uma profissão. Além de se especializar em segurança e administração de redes, os alunos podem se preparar para tirar a certificação LPI – Linux Profissional Institute. Válida mundialmente, ela está entre as dez mais procuradas nos EUA e é um aval de competência técnica do aluno. Empresas como IBM e HP reconhecem os profissionais certificados pela instituição. O mais jovem aprovado nesse teste é o brasileiro Adriano Rutka, 16 anos, faixa verde no Hackerteen. “Tive que estudar muito. O certificado prova o que sei e vai me ajudar na hora de procurar emprego”, imagina o garoto. A primeira turma se forma em novembro, mas o melhor aluno de faixa preta já tem emprego garantido. Não é o único. Outras empresas estão de olho no passe desses futuros heróis digitais.