O fiasco da era Severino, que acabou após 218 dias com a sua renúncia na quarta-feira 21 em meio a um confronto entre estudantes e a segurança da Câmara, deu ao governo Lula a chance de recomeçar zerando o jogo e tentando eleger um presidente da Câmara sintonizado com o Planalto. Diferentemente de fevereiro, quando assistiu inerte à derrota de dois deputados do PT, Lula agora resolveu agir e impor sua liderança. Obrigou o petista Arlindo Chinaglia (SP) a renunciar à sua candidatura ao cargo pelo partido e comandou pessoalmente a operação para a escolha do ex-ministro da Coordenação Política Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Como na eleição passada, esta também terá um candidato do governo, um da oposição, José Thomaz Nonô (PFL-AL), e um representante do chamado baixo clero, Ciro Nogueira (PP-PI). Mas o governo não estará dividido como antes.

Na manhã de quinta-feira 22, o presidente Lula chegou ao Planalto e não gostou do noticiário sobre a sucessão na Câmara. Convocou o líder de seu governo, o petista Arlindo Chinaglia. Na conversa com a presença do ministro Jacques Wagner, Lula indagou a Chinaglia: “Você se garante?” Ele afirmou que sim, mas sem muita convicção. O líder dava sinais de cansaço, após participar de uma reunião até as 3 h da manhã na casa do presidente nacional do PP, deputado Pedro Corrêa (PE). Lá, os líderes governistas se opuseram à sua candidatura. O líder do PTB, deputado José Múcio (PE), disse que pessoalmente gostava muito de Chinaglia, mas não havia a menor possibilidade de seu partido votar num petista. No mesmo embalo, o presidente nacional do PSB, ex-ministro Eduardo Campos (PE), também mostrou as dificuldades de apoiar Chinaglia. Um a um, todos os líderes governistas foram apresentando os motivos contrários ao nome do PT.

Essa era apenas a primeira reunião dos líderes governistas. Enquanto o PT insistia em manter candidato, Lula, angustiado, telefonou para o presidente do Senado, Renan Calheiros. Encontrou-se com ele em Fortaleza (CE) e disse que queria ter um nome para unir seus aliados. Declarou que não se opunha ao deputado Michel Temer (PMDB-SP). Mas Michel, um candidato forte para o consenso, perdeu o apoio do PSDB e, mesmo dentro de seu partido, a ala governista sinalizava que preferia apoiar outro nome. Um dia depois de a bancada se reunir na quarta-feira 21, para endossar por unanimidade sua candidatura, peemedebistas preparavam uma nota anunciando que Michel deveria retirar seu nome, pois não havia conseguido a adesão dos tucanos. O líder do PSDB, Alberto Goldman foi taxativo: “O que está definido é que votamos em Nonô.” O também tucano Eduardo Paes foi além: “Nonô conseguiu algo inusitado no ninho. Os três presidenciáveis do PSDB, José Serra, Aécio Neves e Geraldo Alckmin, estão com ele e não abrem.”

Convencido de que a sucessão presidencial havia começado, Lula resolveu mudar sua postura. Telefonou para os ex-ministros Eunício Oliveira e Eduardo Campos e falou muitas vezes ao dia com Aldo Rebelo. Os líderes aliados também faziam a sua parte. O então candidato do PSB, o vice-líder do governo Beto Albuquerque (RS), avisava: “Enquanto o PT tiver candidato, não teremos unidade na base aliada. O PT precisa fazer um movimento.” E foi isso que o petista Arlindo Chinaglia fez ao final da quinta-feira 22, após participar da terceira reunião no mesmo dia com os líderes aliados. Segundo o líder do PCdoB, Renildo Calheiros, “Chinaglia fez um grande gesto político em prol da unidade. Ele havia sido escolhido por unanimidade dentro do seu partido, e abriu mão de sua candidatura para unir a base aliada”. Com a desistência de Chinaglia, o presidente Lula se comportava diferente da derrota para Severino Cavalcanti. “Agiu como um verdadeiro líder”, dizia entusiasmado o líder do PSB, Renato Casagrande (ES), já acreditando que a candidatura de Aldo Rebelo vai empolgar e vencer.

Mas o acirramento da corrida pela vaga de Severino Cavalcanti é inegável. O atual 2º vice-presidente da Mesa Diretora, deputado Ciro Nogueira (PP-PI), se lançou na noite de quinta-feira, após uma reunião em seu gabinete com o também pepista Francisco Dorneles (RJ). “Eu só serei candidato de consenso. Se for para haver disputa, vá você em frente”, liberou Dorneles. Ciro Nogueira não perdeu tempo. Mandou fazer bótons para distribuir entre seus aliados com o slogan “513 líderes e um compromisso: trabalhar pelo Brasil”. Em campanha aberta, não aceita a pecha de candidato do baixo clero.