Luchino Visconti (1906-1976) realizou grandes filmes centrados na miséria da classe operária, entre eles Obsessão e Rocco e seus irmãos. Mas foi retratando a decadência de sua própria classe, a aristocracia, que o cineasta italiano encontrou seu tema por excelência. Somente o fausto dos enredos crepusculares se adequava à sua visão operística da realidade, sempre arruinada pelas forças determinantes dos eventos históricos. Uma parcela desta fase magnífica sai agora em DVD na Coleção Luchino Visconti, da Versátil Home Video, reunindo os filmes Sedução da carne (1954), Noites brancas (1957), Violência e paixão (1974) e O inocente (1976). Paralelamente, a mesma Versátil coloca no mercado a edição especial de O leopardo (1963), trazendo a versão integral da fita – com 3h05 de duração – falada em italiano, pois até 1983, fora da Itália, só se conhecia a versão em inglês. Um disco extra ainda reúne 2h30 de material especial, com depoimentos de atores e técnicos.

Originário de uma nobre família milanesa da qual herdou o título de conde, Visconti era um comunista convicto, o que explica não apenas a sua atração pelos enredos neorealistas do início de carreira como a progressiva investida nas tramas decadentes de obras posteriores. Deste último grupo, dois filmes ganham lugar de destaque ao abordar o mesmo momento histórico, a unificação italiana, ocorrida no final do século XIX. Centrado nas lutas de libertação do Vêneto, no Norte do país, ocupado pela Áustria, Sedução da carne mostra o amor proibido entre a condessa Serpieri (Alida Valli) e o desertor austríaco Franz Mahler (Farley Granger). Embora seja um esplêndido melodrama histórico, o filme parece um ensaio para o grande épico O leopardo, sobre a revolução na Sicília. No melhor papel de sua carreira, Burt Lancaster encarna o cético príncipe siciliano Fabrizio Salina, que se vê obrigado a se aliar à burguesia ascendente, fazendo valer o mote do filme – é preciso que tudo mude para que as coisas fiquem como estão.

O mesmo espírito desencantado de quem assiste à agonia de seus valores reaparecerá mais tarde em Violência e paixão – com cópia original falada em inglês –, apesar de a ação estar centrada no terrorismo dos anos 1970. Não à toa, o protagonista é vivido pelo mesmo Lancaster. Ele encarna um solitário professor cuja vida passa por uma reviravolta ao alugar o andar superior de seu apartamento para o ex-ativista de esquerda Konrad (Helmut Berger), agora amante de uma marquesa. Saído de um derrame que imobilizara o lado esquerdo de seu corpo, Visconti quis fazer um filme com poucos personagens e rodado entre quatro paredes. Mais tarde, mesmo na cadeira de rodas, enveredou pelos espaços suntuosos de O inocente – seu último filme – sobre um nobre do século XIX que mata o filho de sua mulher com um amante. Foi o brilho derradeiro de uma obra que o filósofo francês Gilles Deleuze comparou, com toda propriedade, a um cristal em decomposição.