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CORO
Para ser um bom Noel, é preciso aprender dicção, improvisação e postura

 

Nunca o Papai Noel teve tantos motivos para emitir seu famoso “Ho! Ho! Ho!” O espírito natalino dos consumidores está em alta e o número de eventos na agenda dos bons velhinhos deve bater recordes neste ano. Tanto que seus passes estão valorizados. Quem quiser contratar um profissional que se paramenta de vermelho e branco para entregar presentes nas residências poderá pagar até R$ 1 mil por meia hora de performance. Outro reflexo da atual ansiedade coletiva pela data é que o trabalho desses senhores começou mais cedo em 2010. Segundo Limachen Cherem, fundador da Escola de Papai Noel do Rio de Janeiro, onde já se formaram mais de 400 deles em 17 anos, normalmente, os alunos são requisitados a partir da segunda quinzena de novembro, mas, neste ano, o primeiro contrato foi firmado em 28 de outubro. A produtora paulista da Fábrica de Shows, Eliana Denine, também contabiliza prosperidade. Em 2009, ela fez cerca de 60 eventos com a presença de Papai Noel. Dezembro nem chegou e ela já tem 80 programas natalinos agendados, todos animados com o mítico senhor de barriga proeminente e barba branca.

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Mas um bom profissional precisa de muita preparação para convencer o público infantil, cada vez mais atento e exigente. Não basta ter um rosto que combine com o papel de bom velhinho e entrar na roupa vermelha com direito a enchimentos e barbas postiças. Os aspirantes necessitam de aulas de dicção, interpretação, improvisação e postura. Muitos começam a deixar a barba crescer em abril, inclusive. Há, obviamente, que ter muita, muita paciência com a criançada e também com os adultos mais alegres e alcoolizados. Os ganhos podem ultrapassar R$ 10 mil por Natal. É o que deve ganhar, neste ano, o Papai Noel da Xuxa, apelido recebido pelo carioca Alfredo Ramaciote, 57 anos, por conta de sua participação em um DVD da Rainha dos Baixinhos. Considerado top de linha – cobra o dobro do preço médio de mercado, até R$ 1 mil por uma visita de 30 minutos a residências –, sua agenda só tem espaço para 2011. “Devo faturar uns R$ 20 mil neste Natal”, calcula. O administrador de empresas aposentado Claudemir Carlos da Silva, 57 anos, que há cinco se veste de Noel, não chega a tanto, mas costuma receber muitas vezes mais que sua aposentadoria, de R$ 2 mil. No ano passado, faturou R$ 8 mil e acha que chegará a R$ 10 mil neste Natal. Ele afirma que a recompensa financeira é boa, mas que é movido também pela emoção de concretizar uma fantasia infantil. “Sabia que muitas crianças não pedem brinquedo? Pedem soluções de problemas, como trazer o pai delas de volta para casa”, conta Silva.

A produtora Eliana Denine, da Fábrica de Shows, diz que tem 30 apresentações marcadas para residências na capital paulistana na noite de Natal. Sua equipe conta com 20 Noéis, entre 50 e 68 anos, todos gordinhos e – detalhe! – com barba natural. No Rio, a novidade é o aumento da clientela de condomínios residenciais, como afirma a empresária carioca Glécia Cruz. “Em 2010, só de condomínios são 18. No ano passado, não teve nenhum.” Segundo ela, não basta vestir a fantasia para a pessoa encarnar o espírito de Noel. “Tem que ter comprometimento. Não pode beber, fumar nem aceitar nada. Não é qualquer pessoa que faz esse papel”, afirma.

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ASPIRANTES
Recém-formados na turma de bons velhinhos no Rio

 

Mas a vida de Papai Noel não é nada fácil. A começar pela roupa de veludo, quente demais para nosso clima e que chega a pesar dez quilos. “Depois de duas horas de trabalho o suor é tanto que o tecido fica encharcado e passa a pesar mais de 15 quilos”, adverte o contabilista aposentado Tales Ferreira da Silva, 67 anos, que começou a se vestir de Noel aos 18, para animar a festa da família. A carga horária também é pesada. Nos shoppings, os profissionais chegam a ficar entre seis e oito horas sentados num trono, tirando fotos com crianças no colo e recebendo cartas. “Uma menina com a cabeça enfaixada me deu uma na qual pedia uma tevê portátil. A acompanhante me contou que a garotinha estava em estágio terminal de câncer e ver o Papai Noel era um dos seus últimos desejos”, lembra o comerciário aposentado Sylvio Furtado, 65 anos. O maior sacrifício, no entanto, é outro. “A minha filha tem 21 anos e nunca passei um Natal com ela”, diz o veterano Limachen Cherem, fundador da escola citada no início da reportagem. “Papai Noel só passa o Natal com a família dos outros.”

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