Enquanto caminha pelo meio da plantação e arranca o mato que insiste em crescer entre as hortaliças, o agricultor paraibano José Cardoso da Silva, 56 anos, orgulha-se dos vistosos canteiros de alface, coentro, couve e quiabo, além das dezenas de pés de macaxeira, milho, banana, feijão e cana-de-açúcar plantadas nos dez hectares de sua propriedade. E esbanja felicidade quando mostra um enorme tanque cheio de água construído no quintal, onde cria patos e peixes. O cenário dessa fartura fica no assentamento Santa Helena, localizado no município de Cruz do Espírito Santo, a 40 quilômetros de João Pessoa (PB). Lá moram Silva, sua esposa, a também agricultora Maria Odete da Silva, 55 anos, e os dois filhos Marcondes, 23, e Ednalva, 22. “Já passamos por muitas privações, mas hoje a vida é outra. Tudo o que precisamos para comer está plantado no quintal. E toda semana minha mulher vai até a cidade vender hortaliças, verduras e frutas. Ganhamos até R$ 350 semanalmente”, conta Silva.

O alimento que hoje supre as necessidades e traz renda para a família do agricultor é resultado de um programa implantado há um ano pela Agência Mandalla de Desenvolvimento, uma ONG com sede em João Pessoa (PB), que criou um sistema de irrigação de baixo custo para facilitar a produção de alimentos de subsistência em assentamentos e comunidades rurais. Essa fórmula permite que as famílias tenham uma renda mensal de até R$ 1,7 mil com a venda da produção excedente. “As mandalas são símbolos sagrados concentradores de energia. E, aqui, elas também trazem esperança porque garantem o sustento. O nosso objetivo é apoiar e orientar as famílias promovendo a auto-sustentação para garantir a permanência no campo”, afirma Willy Pessoa, administrador de empresas e idealizador do projeto.

Na prática, a mandala é um tanque com capacidade para até 30 mil litros de água, abastecido por cisterna ou açude. São cultivados ao redor – em canteiros – alimentos básicos como feijão, arroz, mandioca, batata, hortaliças e frutas. Do reservatório sai a água que irriga os canteiros, por meio de tubos e com a ajuda de uma bomba. O tanque ainda é aproveitado para a criação de peixes e marrecos. Com suas fezes ricas em minerais, como fósforo, esses animais transformam a água em adubo orgânico, ideal para a plantação. “Essa técnica pode ser aplicada em qualquer pedaço de terra. Sempre acreditei que a saída para acabar com a fome estava na agricultura. Mas não é só dar a terra. É preciso ensinar a lidar com ela”, diz Pessoa.

O projeto foi testado durante três anos no assentamento de Acauã, município de Aparecida, a 428 quilômetros da capital paraibana, em 64 mandalas de fundo de quintal. “Cada uma custou R$ 300. E foram feitas em parceria com a comunidade. Depois, tivemos o apoio do Incra e do Sebrae, que doaram os materiais”, conta o administrador, que é parceiro da Ashoka (organização que apóia empreendedores sociais). Comprovada a eficiência, o desafio de Pessoa, agora, é ampliar o atendimento a outras 84 famílias. Serão construídas três mandalas comunitárias com capacidade para 75 mil litros de água, numa área de 2,5 mil metros quadrados. Cada uma custará R$ 4,5 mil. Uma delas já saiu do papel, graças ao investimento de R$ 300 mil que a ONG recebeu da empresa Bayer CropScience. “O recurso vai facilitar a ampliação. Também incluímos no projeto a criação de bibliotecas e salas de informática nas escolas”, relata Marc Reichardt, presidente da empresa para a América Latina. O trabalho da Agência Mandalla já ganhou dimensão nacional. Foi implantado em nove Estados brasileiros, entre eles Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Norte. Em 2003, ganhou o prêmio de Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil.