11/11/2010 - 17:00
Em depoimento que acontece nesta quinta-feira no Fórum de Contagem (MG), o goleiro Bruno de Souza relatou a sua versão para o desaparecimento de Eliza Samudio. O ex-jogador do Flamengo disse que Eliza saiu do sítio de Esmeraldas (MG) às 17h do dia 10 de junho, sendo levada por Luiz Henrique Romão, o Macarrão, para um ponto de táxi, que não foi revelado. Desde então, segundo o goleiro, ela está desaparecida e ele não sabe o que aconteceu.
Bruno disse também ter sido procurado por Eliza no dia 8 de junho, quando ela teria pedido a ele que ficasse com o filho Bruninho por sete dias, pois ela teria que ir para São Paulo pagar algumas despesas com os R$ 30 mil recebidos dele em acordo feito para que ela não fizesse "escândalo" na imprensa. Bruno, então, afirmou que voltou para o sítio – ele estava na casa da avó materna, Luceli Aves de Souza – com Bruninho e entregou a criança para sua mulher, Dayanne Rodrigues.
O jogador falou ainda sobre a conversa que teve com Eliza Samudio dentro do seu sítio, à beira da piscina, no dia 7 de junho. Bruno afirmou que foi um momento em que pode realizar seu grande sonho.
"Ficamos conversando sobre o dia a dia, sobre a gravidez dela, que eu não acompanhei. Disse que tinha sido muito difícil, confusões do passado. O que ela falou na televisão. Esclarecemos muitas coisas. Debaixo de um pinheiro, numa mesa de vidro, fiquei brincando com o Bruninho. Criei uma paixão enorme por criança. Meu sonho era ter um filho, um menino. Então, era tudo normal", disse o goleiro.
A juíza Marixa Fabiane questionou o jogador se ele pretendia falar a verdade sobre o caso. "Quaresma (advogado) disse que o senhor (Bruno) ficaria preso uma semana. Depois, o Quaresma disse que nenhum cliente dele ficaria preso mais que 100 dias. O senhor está preso há mais de 120 dias. O senhor sabe que estão presos alguns amigos de infância, sua ex-mulher, sua ex-namorada. O senhor está disposto a declarar as verdades dos fatos?", perguntou. "Somente a verdade, excelência", respondeu o goleiro. "Foi você quem salvou a vida do Bruninho (filho de Eliza)?", questionou a juíza. "Em momento algum a vida do Bruninho ou da Eliza esteve em perigo, pois eles estavam sob os meus cuidados", disse Bruno.
Em seu depoimento, Bruno deu detalhes sobre a viagem de seu primo, Macarrão, e Eliza do Rio de Janeiro a Minas Gerais. "No dia 4 de junho, o Macarrão pegou o carro dele no Hotel Windsor, onde estava concentrado, para resolver um problema. No outro dia, um sábado, Macarrão voltou e falou que iria levar a Eliza para Minas Gerais", disse o jogador.
Ainda segundo Bruno, após perguntar a Macarrão o motivo da viagem, o amigo disse que depois responderia. "Eu falei ‘tudo bem’, mas fiquei pensando muito naquilo. Achei estranho, tanto que não me concentrei direito e por isso fui mal no jogo entre o Flamengo e o Goiás, no dia 5", disse.
Ao responder à juíza sobre seus dados pessoais, Bruno disse ter "duas filhas e possivelmente um outro filho". Questionado sobre quem seria o possível filho, o atleta respondeu: "o Bruninho".
Antes do depoimento, o advogado de Bruno, Ércio Quaresma, informou que o jogador responderia apenas às perguntas da juíza, negando-se a prestar esclarecimentos ao Ministério Público, aos assistentes de acusação e aos advogados de sua mulher, Dayanne de Souza, e seu primo, Sérgio Rosa Sales, o Camelo.
Quaresma afirmou que não permitiu que Bruno respondesse às perguntas porque os advogados de Dayanne e Sérgio não deixaram que seus clientes respondessem a suas perguntas.
Extorsão
José Arteiro Cavalcante, advogado da mãe de Eliza Samudio, Sonia de Fátima Moura, afirmou nesta quinta-feira (11) que, com base no depoimento do goleiro Bruno de Souza à Justiça de Minas Gerais, é possível determinar o motivo do assassinato da estudante: extorsão. "O Bruno disse que Eliza queria mais dinheiro, ele não concordou com isso. Está explicado o motivo que eles fizeram isso", afirmou o advogado no Tribunal do Júri de Contagem (MG).
Em depoimento à juíza Marixa Fabiane, Bruno afirmou que Eliza foi do Rio de Janeiro até seu sítio, em Esmeraldas (MG), para pedir um aumento no valor que recebia mensalmente para cuidar do filho que seria do jogador. Segundo o atleta, Eliza recebia em média R$ 1,5 mil todo mês, mas passou a pedir R$ 50 mil. Bruno relatou que, após a estudante ameaçar fazer um escândalo na imprensa, concordou em pagar R$ 30 mil.
Ainda de acordo com Bruno, Eliza pediu o aumento ainda no Rio de Janeiro, em conversa com o amigo do jogador, Luiz Henrique Romão, o Macarrão. O amigo teria afirmado não ter toda a quantia pedida, mas que teria R$ 30 mil em Minas Gerais. O dinheiro seria usado para pagar as despesas da viagem do time de futebol amador de Bruno. No dia seguinte à conversa, Bruno teria dito que depositaria o valor na conta da estudante, que afirmou, segundo o jogador, que não acreditava no goleiro e iria a Minas Gerais buscar o dinheiro.
Assim, Eliza embarcou no carro de Bruno com o filho, Macarrão, o primo adolescente e a namorada do jogador, Fernanda Gomes de Castro, e foi levada a Minas Gerais. Bruno confirmou que o jovem e Macarrão disseram ter havido uma briga durante o percurso, o que explicaria as manchas de sangue encontradas no veículo.
De acordo com Bruno, a briga teria ocorrido depois que Eliza começou a ofender o jogador. "Quem o Bruno acha que é, acha que é o Rogério Ceni?", teria dito a estudante, segundo o goleiro. O adolescente teria então defendido o primo e agredido Eliza, que teria revidado.
Elogios a Macarrão
Durante seu depoimento, Bruno criticou a postura de seus primos J. e Sérgio Rosa Sales, o Camelo, que afirmaram à polícia que o jogador seria o mandante do assassinato de Eliza. Sobre seu amigo Macarrão, entretanto, Bruno teceu elogios. "Macarrão é mais que um amigo para mim, é um irmão mesmo. Excelente pessoa, pai de família em quem confio totalmente", afirmou.
O goleiro falou que a vida dele "só começou a andar" depois que Macarrão passou a trabalhar com ele. De acordo com Bruno, o salário de R$ 120 mil mensais que recebia do Flamengo entrava diretamente na conta do amigo, que administrava os cartões e senhas bancárias do jogador.
Enquanto Macarrão assessorava Bruno em Minas Gerais, quem fazia a função no Rio de Janeiro era um amigo segurança, chamado de Marcelão. De acordo com Bruno, Marcelão não entregava a Eliza todo o dinheiro que ele enviava, o que quebrou a confiança que tinha no amigo. Para Bruno, o desfalque no dinheiro que devia ajudar nas despesas do filho de Eliza fez com que a estudante desconfiasse do jogador. Após a suposta traição de Marcelão, Macarrão assumiu as operações também no Rio de Janeiro.
Já Sérgio não dispõe do mesmo afeto do jogador. "O Sérgio, em 2006, vi quem ele era. Nesta época, saí do Atlético Mineiro e passei por um mês pelo Corinthians. O Sérgio se ‘perdeu’ no Rio de Janeiro, parecia que era ele o jogador de futebol", afirmou Bruno.
"Dei carro, dava R$ 1,2 mil todo mês, nunca trabalhou pra mim, eu ajudava ele e toda a família dele. Ele foi mais um que eu ajudei e quebrou a (minha) confiança", queixou-se. "Desde 2007 ele não mora mais comigo. (…) Ele jogou esta oportunidade fora, não quis estudar e perdeu a oportunidade de ser alguém na vida", disse o jogador.
Sobre J., seu primo de 17 anos, Bruno disse que o menor tem problemas mentais. "É um menino que veio morar comigo porque a mãe pediu. Ele tinha problemas com o tráfico em Niterói (RJ). Veio morar comigo e a Fernanda. Depois que a conheci, em abril, ela tentou levá-lo para a igreja, mostrar a ele um pouco de Deus. Mas ele se perdeu, parece que tem um distúrbio mental. Nem um psicopata inventaria as histórias que ele falou", afirmou, referindo-se às acusações de que Eliza teria sido esquartejada e tido partes do corpo arremessadas para alimentar cães da raça rottweiller.
Ciúmes
Bruno afirmou que sua relação com Macarrão é tão próxima que o amigo chegava a sentir ciúmes de sua noiva, a dentista Ingrid Oliveira. Segundo Bruno, ele, Ingrid, Macarrão e J. moraram por um período em um apartamento no Rio de Janeiro. "Tinha que administrar um certo ciúme do Macarrão em relação à Ingrid. Só o Macarrão tinha ciúmes de mim, o Jorge não", disse o jogador, motivando murmúrios do público que acompanhava a audiência.
Filho
Ao responder questionamentos da juíza Marixa Fabiane sobre seus dados pessoais, Bruno disse ter "duas filhas e possivelmente um outro filho". Questionado sobre quem seria o possível filho, o atleta respondeu: "o Bruninho" (filho de Eliza).
Segundo o advogado José Arteiro Cavalcante, Bruno pediu para ver Bruninho. A mãe de Eliza, Sônia de Fátima Moura, que detém a guarda da criança, não autorizou. "Ele (Bruno) não queria que a minha filha abortasse? Agora quer vê-lo? De jeito nenhum", afirmou.
O caso
Eliza desapareceu no dia 4 de junho, quando teria saído do Rio de Janeiro para Minas Gerais a convite de Bruno. No ano passado, a estudante paranaense já havia procurado a polícia para dizer que estava grávida do goleiro e que ele a agrediu para que ela tomasse remédios abortivos. Após o nascimento da criança, Eliza acionou a Justiça para pedir o reconhecimento da paternidade de Bruno.
No dia 24 de junho, a polícia recebeu denúncias anônimas dizendo que Eliza havia sido espancada por Bruno e dois amigos dele até a morte no sítio de propriedade do jogador, localizado em Esmeraldas, na Grande Belo Horizonte. Na noite do dia 25 de junho, a polícia foi ao local e recebeu a informação de que o bebê apontado como filho do atleta, de 4 meses, estava lá. A atual mulher do goleiro, Dayanne Rodrigues do Carmo Souza, negou a presença da criança na propriedade. No entanto, durante depoimento, um dos amigos de Bruno afirmou que havia entregado o menino na casa de uma adolescente no bairro Liberdade, em Ribeirão das Neves, onde foi encontrado.
Enquanto a polícia fazia buscas ao corpo de Eliza seguindo denúncias anônimas, em entrevista a uma rádio no dia 6 de julho, um motorista de ônibus disse que seu sobrinho participou do crime e contou em detalhes como Eliza foi assassinada. O menor citado pelo motorista foi apreendido na casa de Bruno no Rio. Ele é primo do goleiro e, em dois depoimentos, admitiu participação no crime. Segundo a polícia, o jovem de 17 anos relatou que a ex-amante de Bruno foi levada do Rio para Minas, mantida em cativeiro e executada pelo ex-policial civil Marcos Aparecido dos Santos, conhecido como Bola ou Neném, que a estrangulou e esquartejou seu corpo. Ainda segundo o relato, o ex-policial jogou os restos mortais para seus cães.
No dia seguinte, a mulher de Bruno foi presa. Após serem considerados foragidos, o goleiro e seu amigo Luiz Henrique Romão, o Macarrão, acusado de participar do crime, se entregaram à polícia. Pouco depois, Flávio Caetano de Araújo, Wemerson Marques de Souza, o Coxinha, Elenilson Vitor da Silva e Sérgio Rosa Sales, outro primo de Bruno, também foram presos por envolvimento no crime. Todos negam participação e se recusaram a prestar depoimento à polícia, decidindo falar apenas em juízo.
No dia 30 de julho, a Polícia de Minas Gerais indiciou todos pelo sequestro e morte de Eliza, sendo que Bruno responderá como mandante e executor do crime. Além dos oito que foram presos inicialmente, a investigação apontou a participação da atual amante do goleiro, Fernanda Gomes Castro, que também foi indiciada e detida. O Ministério Público concordou com o relatório policial e ofereceu denúncia à Justiça, que aceitou e tornou réus todos os envolvidos. O jovem de 17 anos, embora tenha negado em depoimentos posteriores ter visto a morte de Eliza, foi condenado no dia 9 de agosto pela participação no crime e cumprirá medida socioeducativa de internação por prazo indeterminado.