Vila Olímpica. 17 horas da quarta-feira 18. Gustavo Borges, o maior medalhista do Brasil em Olimpíadas, dava pedaladas lentas em cima de uma bicicleta pequena que mal sustentava o seu corpo de 2,03m e 98 kg. Em meio a inúmeros atletas do mundo inteiro que circulavam na zona internacional do Complexo Olímpico esperando a próxima competição ou o próximo treinamento, o brasileiro de 32 anos está livre da pressão dos tempos ou do fantasma do podium. Vive um estranho rito de passagem. Desde que anunciou sua despedida da natação na segunda-feira 16, Gustavo já não é mais um atleta, mas ainda não se sente um ex. “Estou curtindo uma transição tranquila.”
Na verdade, como ele mesmo admite, a ficha ainda não caiu. “Quando a poeira baixar e eu não encarar mais aquela rotina do dia-a-dia, quando chegar o Troféu Brasil e eu não mais entrar na piscina, devo sentir bastante”, afirmou a Istoé. Enquanto isso, tenta aproveitar a sobrevida da convivência olímpica. “Agora sou um torcedor e um turista privilegiado”, assume. Mas não tem sido fácil. No dia seguinte ao adeus, Gustavo, que vai ficar na Vila Olímpica até o fim dos Jogos, levantou cedo para acompanhar mais uma eliminatória. Pegou a mochila com todos os apetrechos: sunga, óculos, roupa de competição. “Bastava um shorts e uma camiseta. Afinal, sou um espectador agora”, repete.

A rotina de turista acidental começou na noite daquele mesmo dia, quando
foi ver a derrota e a eliminação de Flávio Saretta e André Sá nas duplas de
tênis. Em cinco Olimpíadas, foi a segunda vez que ele viu uma competição
fora da natação – a primeira foi a partida de basquete feminino entre Brasil
e China em Atlanta, 1996. A agenda do turista Gustavo Borges, no entanto,
ainda é incerta. “Já fiz uns pedidos para assistir ao vôlei de praia e à vela.
Se tiver um atleta da natação brasileira competindo, vou dar preferência.”
Também é incerta a atuação de Gustavo no papel de um turista convencional. Ele trouxe duas máquinas fotográficas, umas delas digital, mas não tirou sequer uma foto. Se tiver tempo livre, talvez leia os livros que trouxe na bagagem, entre os quais Como se tornar rico, de Donald Trump. O quase ex-atleta, como ele se autodefine, que tem duas academias em Curitiba e São Paulo, uma empresa de eventos e dois bares na capital paulista, vai abraçar de vez a vida empresarial. Mas só depois do dia 29, quando vai empunhar a bandeira brasileira no encerramento dos Jogos de Atenas, fechando com chave de ouro uma vitoriosa carreira.