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SEM PARTIDO E SEM SALÁRIO "Ninguém explica como o Delúbio consegue manter o padrão de vida", diz o promotor Fernando Krebs, de Goiás

 Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, quer caminhar rápido. Na quinta-feira 2, quem o procurasse em Brasília ouvia de um funcionário da sede nacional do partido a seguinte resposta: "Ele está sem tempo. Tem várias conversas marcadas e pouco mais de 40 dias para decidir os próximos 20 anos de sua vida." Era uma referência ao dia 23 de maio, quando o Diretório Nacional do PT deverá responder se aceita o pedido de refi – liação de Delúbio, expulso do partido em 2005, após ser apontado como um dos líderes do Mensalão.

No fi nal do ano passado, ele colocou em prática um plano que batizou de Resgate da Cidadania Petis ta, com o objetivo de se candidatar a deputado federal em 2010. Passou a visitar parlamentares de diversos Estados e em 18 de março ofi cializou o pedido de refi liação por intermédio de uma carta encaminhada ao deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), presidente do partido. Guardou o velho Ômega blindado e semanalmente deixa Goiânia rumo a Brasília a bordo de um Toyota Corolla 2009. Na quinta-feira 2, entre as 9h e as 15h30, Delúbio conversou com oito líderes do PT, quatro deles membros do Diretório Nacional.

A EMPRESA DE PROPAGANDA
Registros na Junta Comercial de Goiás mostram que Delúbio tem 95% das ações da Geral. Com – Serviços de Divulgação Ltda. O foco da empresa é a distribuição de propaganda em Goiânia e na internet. Os outros 5% pertencem a Delma Soares, irmã de Delúbio

EMPRÉSTIMO DO BNDES
Em dezembro, Delúbio ajudou o governador de Goiás a aprovar na assembleia autorização para que 41% das ações da Companhia Energética de Goiás (Celg) fossem dadas como garantia a um empréstimo de R$ 1,2 bilhão junto ao BNDES. No mês passado, Delúbio trabalhou para arquivar uma CPI que iria investigar a dívida da estatal

A CANDIDATURA
Delúbio quer ser candidato a deputado federal em 2010. Ele já apresentou pedido de refiliação ao PT, tem mantido frequentes encontros com lideranças de vários Estados, mas encontra fortes resistências no Diretório Nacional, que deverá se manifestar em 23 de maio

INFLUÊNCIA FORA DO PT
Delúbio teve participação decisiva na reeleição do prefeito peemedebista de Goiânia, Íris Rezende, e recebeu acenos do PMDB de Goiás. Ele tem bom trânsito com o PP do governador Alcides Rodrigues e tem diálogo com o PRB e o PHS

A todos os interlocutores, Delúbio repete o que escreveu na carta a Berzoini e faz menção indireta ao silêncio mantido nos últimos quatro anos. "Sempre contribuí com o partido, comprometido com a causa coletiva. Não sou acusado de um único ato que visasse meu benefício, seja político, seja fi nanceiro ou pessoal", redigiu Delúbio.

"Sinto-me cumprindo uma pena capital." Apesar de expulso, o PT não abandonou Delúbio, ainda prestigiado na Esplanada dos Ministérios.

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JOGANDO EM TODAS Delúbio Soares com o secretário de Segurança de Goiás, Ernesto Roller (à dir.), e com a secretária de Desenvolvimento de Goiânia, Neide Aparecida, sua afilhada política

Em 2007, acelerou a liberação de recursos no Ministério da Saúde para equipar o hospital de Buriti Alegre (GO), sua cidade natal. Coube a ele a indicação de diretores dos Correios no Estado e para a Delegacia Regional do Trabalho de Goiás. Delúbio é um dos padrinhos de Sandra Cabral na chefi a de Gabinete do Ministério da Igualdade Racial. No ano passado, bancou a candidatura do petista Paulo Garcia para vice na chapa do prefeito reeleito de Goiânia, Íris Rezende (PMDB), e emplacou a ex-deputada Neide Aparecida na secretaria municipal de Desenvolvimento. No governo de Goiás, o secretário de Comunicação do governador Alcides Rodrigues (PP), Marcos Vinícius, também foi apadrinhado pelo ex-tesoureiro petista. "Em Goiás, quem fala em nome do PT ainda é o Délubio", diz o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). "É ele quem faz reuniões com prefeitos e avaliza os acordos políticos."

"Sou contra ele voltar", disse o presidente Lula, em reunião com deputados e senadores do PT

Na Justiça, o ex-tesoureiro está encrencado com o caso do Mensalão, no STF, e tem outro processo criminal em Goiás, para devolver os salários que teria recebido como professor sem nunca ter ido à sala de aula.

"O Delúbio é um mistério", diz o promotor Fernando Krebs, que atua no processo dos salários. "Ninguém explica como ele consegue manter o padrão de vida que tem. Ele montou uma empresa de propaganda, mas não conheço nenhum cliente dele."

Delúbio é sócio majoritário da Geral. Com – Serviços de Divulgação Ltda., com 95% das ações. Os outros 5% pertencem a sua irmã, Delma Soares. Segundo registro na Junta Comercial, a empresa vende publicidade para sites na internet e propaganda de rua em Goiânia. E ocupa duas salas no terceiro andar da Galeria Ipê, numa das avenidas mais movimentadas da capital. Delúbio paga aluguel de R$ 400 e condomínio de R$ 120.

"Não há o que ser investigado. Tratase de uma empresa legalmente constituída e que está dando os primeiros passos. Ninguém coloca um site no ar em 24 horas e nas próximas semanas estaremos com nossos produtos na internet", diz Delúbio. De fato, é difícil colocar um site no ar em 24 horas, mas a empresa foi fundada em julho de 2007.

Para resgatar a cidadania petista, o desafi o de Delúbio é deixar o vestiário e entrar em campo. "O partido me respeita, mas prefere que eu não vista a camisa oficial", disse Delúbio a um deputado na quinta-feira 2. Há duas semanas, por exemplo, ele esteve com o líder do PT na Câmara, Cândido Vacarezza (SP). A conversa não foi como Delúbio esperava:

– Tive uma pena maior do que os eventuais erros que cometi. Sou petista de coração e já cumpro um exílio há mais de três anos, disse Delúbio.

– Seus argumentos são fortes e de fato você tem uma militância histórica, respondeu Vacarezza.

– Deputado, o senhor votará a favor ou contra mim? – Seus argumentos são consistentes, mas não sei dizer qual é a tendência do Diretório e meu voto será manifestado apenas na reunião de 23 de maio.

Delúbio não gostou do que ouviu. "Não disse a ele que estou contra sua volta. Apenas deixei claro que considerava que ele poderia ter razão e que no momento oportuno manifestaria minha opinião", afirmou Vacarezza à ISTOÉ. Em recente conversa com quatro deputados e dois senadores do PT, o presidente Lula foi consultado sobre o projeto do ex-tesoureiro. "Esse é um assunto já resolvido no PT", disse Lula. "O Delúbio tomou muitas posições por conta própria. Sou contra ele voltar." Como o PT só faz o que Lula quer, a frase do presidente ecoou. "A agenda do Delúbio é inconveniente neste momento", afirmou o deputado Rubens Otoni (PT-GO). "Só a discussão sobre sua eventual volta já é inconveniente. Vou votar contra", antecipa.

Delúbio continua fumando charutos cubanos, veste camisas Lacoste e, ao lado da caneta Montblanc, leva no bolso um iPod carregado com músicas sertanejas, resultado da digitalização de antigos discos de vinil. Mas nem mesmo entre os companheiros de todas as agruras, há entusiasmo a sua acolhida. "Fui contra a expulsão do Delúbio", diz o ex-ministro José Dirceu. "Acho que, assim como eu, ele tem sido préjulgado e cumpre uma pena medieval.

Sou coerente e vou colocar minha posição no Diretório, mas isso não significa que eu esteja articulando sua volta ao partido."

Por isso, Delúbio trabalha com outros dois planos para viabilizar sua candidatura. O primeiro deles é assinar a ficha de filiação no PT no Diretório Municipal de Buriti Alegre, controlado totalmente por seus aliados, dias antes da reunião do Diretório Nacional.

Por isso, Delúbio trabalha com outros dois planos para viabilizar sua candidatura. O primeiro deles é assinar a ficha de filiação no PT no Diretório Municipal de Buriti Alegre, controlado totalmente por seus aliados, dias antes da reunião do Diretório Nacional.

Dessa forma, ficaria livre para se engajar na segunda trama. Delúbio foi personagem fundamental na reeleição do prefeito peemedebista Íris Rezende, que já encomendou um passaporte para o ex-tesoureiro. "Não temos restrições ao nome dele e, se houver um pedido de filiação oficial, vamos analisar", diz Adib Elias Júnior, presidente do diretório do PMDB em Goiás. O ex-tesoureiro também está em tratativas com o PRB e o PHS. "Na hora que ele quiser estamos de portas abertas", afirma o presidente regional do PHS, Walter Souto.

Além disso, Delúbio mantém frequentes encontros com o secretário de Segurança do Estado, Ernesto Roller, e tem prestígio e créditos junto ao PP do governador Alcides Ribeiro. Em dezembro, ele ajudou o governo a aprovar na assembleia a autorização para dispor de 41% das ações da Companhia Energética de Goiás (Celg), em troca de empréstimo de R$ 1,2 bilhão junto ao BNDES. O acordo ainda não foi fechado, mas o governo estadual precisa do empréstimo para ajudar a saldar uma dívida que supera os R$ 5 bilhões. Dívida essa que seria objeto de uma CPI no Estado. A oposição já tinha as assinaturas necessárias para iniciar a investigação, mas no dia 13 de março quatro deputados recuaram. "O Delúbio convenceu muita gente de que a CPI atrapalharia as negociações com o BNDES e levaria a Celg à falência", disse um deputado estadual do PSDB.

O objetivo final da movimentação do ex-tesoureiro do PT, dentro e fora do partido, visa a garantir um mandato de deputado federal. Como fundador do PT, Delúbio levou o mesmo tempo que Lula na caminhada rumo ao poder. Mas despencou dele em apenas dois anos. Agora, os novos passos indicam que um eventual mandato de deputado federal poderá servir não só para assegurar seu futuro como para proteger seu passado.

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 Os voos de Tasso

O senador Tasso Jereissati (PSDBCE) é empresário próspero e tem à sua disposição um jato Citation. Mesmo assim, usou sua cota de passagens aéreas para fretar jatinhos, o que não está previsto no Ato Número 62, da Mesa Diretora do Senado, de 1988. Dados do Siafi mostram que Tasso gastou R$ 469 mil com aluguel de aviões ao longo do mandato, segundo a Folha de S. Paulo. O senador explicou que gastou R$ 358 mil e fez apenas sete viagens em jatos alugados em seis anos. "Se alguém descobrir que extrapolei a cota a que eu tinha direito, me comprometo a recompor os gastos em dobro", afirma. "Nenhuma denúncia de picaretagem ou malandragem me atingirá." Na quinta-feira 2, ele subiu à tribuna para dar explicações. Mas foi confortado por colegas que também fretaram jatinhos.

O senador Heráclito Fortes (DEM-PI) estava preocupado apenas com o vernáculo: "Jatinho é uma palavra burguesa"