Com a auto-estima esfacelada depois do fenômeno Casa dos artistas, do SBT, a Rede Globo se prepara para um novo embate com o canal de Silvio Santos. A Globo ataca com Big brother Brasil – versão tupiniquim do mais festejado reality show do mundo -, em que um grupo de 12 anônimos tenta conviver dentro de uma casa até que sobre apenas um vencedor do prêmio milionário, avaliado em R$ 500 mil. Outros programas do gênero estão nos planos da Globo, entre eles uma versão similar do Love cruise: a viagem de solteiros, no qual casais em cruzeiro num navio traçam armações e picuinhas diversas entre si. O barco da Globo navegaria dentro do programa Caldeirão do Huck e seria batizado de Barco do caldeirão. Para rebater a aposta voyeurista da concorrente, o SBT recarrega sua velha arma e promete Casa dos artistas 2, que deverá abrigar celebridades de curvas avantajadas, como Tiazinha e Ellen Rocche, assistente de palco do programa Qual é a música?, do mesmo SBT. Ou seja, Globo e SBT brigam no terreno dos reality shows, modalidade televisiva que promete fazer muito barulho no início deste ano, ainda que alguns especialistas tendam a projetar um esgotamento do formato a curto prazo. Flávio Ferrari, diretor do Ibope Pesquisa de Mídia, lembra que "todo mundo gosta de pimenta, mas ninguém come vatapá todo dia". Aproveitando-se das metáforas culinárias, Daniel Barbará, diretor comercial da DPZ, vai mais longe. "É um produto de ocasião que não vai se eternizar, vai passar do ponto e queimar."

Barbará, porém, faz uma ressalva à fórmula vitoriosa de Casa dos artistas. "Há uma química que envolve commodities de fofoca, um assunto que cresce cada vez mais na televisão e, portanto, deve emplacar sua segunda versão." O crítico de televisão Gabriel Priolli concorda que o programa de Silvio Santos é um híbrido de reality show com revista de fofocas e acredita que as atrações nessa linha ainda têm muita lenha para queimar. "A televisão vai copiar todas as variantes do gênero e pode até criar algo novo, mas ultimamente está difícil criar", admite ele. "A Globo pode amargar um monumental fracasso com seu Big brother caso bata de frente com Casa dos artistas 2. Um programa com anônimos não vai causar comoção." O crítico afirma que o melhor seria misturar pessoas comuns a famosos. "Seria a fantasia final do espectador ficar debaixo do edredom com uma celebridade."
 

Apesar de antever o choque entre os dois programas, Mauro Lissoni, diretor de programação do SBT, diz não ter pressa em colocar sua atração no ar, que, segundo ele, deve ocorrer em meados de fevereiro, no horário das 21h, já que janeiro é um mês de audiência potencialmente fraca. "Precisamos dar um intervalo, uma folga para que ninguém fale mais do Supla e surjam novos ídolos." Mas, em se tratando de Silvio Santos, tudo é possível e o programa pode estrear a qualquer momento. Casa dos artistas trouxe surpresas como a audiência de um público normalmente avesso ao estilo popular do SBT. Segundo o diretor, 28% dos espectadores pertenciam às classes A e B, faixas que também consomem a tevê paga, outro território infestado de reality shows. O que se anuncia como o melhor deles chama-se Human zoo, a ser apresentado pelo canal por assinatura GNT, cujo primeiro episódio será levado ao ar na quarta-feira 16, às 23h20.

A produção inglesa quer dar certo verniz de seriedade ao abordar meandros do comportamento humano. Mas seu ponto de partida é quase igual ao de seus pares: gente confinada numa casa, dividida em equipes e que aos poucos vai se tornando irascível. A diferença fica por conta das situações criadas para discutir, por exemplo, a relação das pessoas com os padrões estéticos e com as autoridades, respaldadas por psicólogos. Os outros programas concorrentes – sempre com mulheres e homens bonitos, de corpos esculturais – não mostram pretensões analíticas. Temptation island, exibido às segundas-feiras pela Fox, tem por objetivo separar casais de namorados num lugar paradisíaco, colocando-os diante das tentações do título, ou seja, o(a)s vário(a)s sedutores de plantão. Scream test, que vem logo em seguida, é uma espécie de Bruxa de Blair real, em locais tidos como assombrados, que tanto podem ser um cemitério como uma casa abandonada. A intenção é saber quem se sai mais corajoso e consegue captar provas de paranormalidade. Ambos estão sendo avaliados pela Globo. Há, ainda, Blind date, exibido às quintas-feiras no USA, que promove o encontro de casais de desconhecidos em lugares tão estranhos quanto uma banheira. Ao que tudo indica, vai ser difícil impedir que a moda se alastre. Afinal, a estrutura da tevê moderna é toda voyeurista, como afirma Ferrari, do Ibope, uma determinação atribuída ao controle remoto. Há oito anos, apenas 30% dos lares brasileiros tinham o aparelho. Hoje são 85%. Portanto, a audiência ficou mais suscetível e deve agora ser fisgada com situações inusitadas e de impacto. Os tais reality shows conservam este apelo instantâneo. Resta saber até quando.