Premiado como um dos melhores do mundo, cabeleireiro cobra mais barato de Lula e diz que já tentaram usá-lo para fazer tráfico de influência

AGRESÃO Ele está prestes a se submeter a uma cirurgia, devido ao espancamento que sofreu por um grupo de rapazes, numa festa de socialites

Recém-premiado como um dos dez melhores cabeleireiros do mundo, na Alemanha, Wanderley Nunes, 49 anos, é dono de quatro salões de beleza em São Paulo, um deles com 1.600 metros quadrados. Mas, para cuidar das madeixas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da primeira-dama, Marisa Letícia, ele deixa seus salões nas mãos de 437 funcionários e parte em direção a Brasília ou a São Bernardo do Campo. Apesar do atendimento personalizado, cobra mais barato pelo corte – R$ 50 contra os R$ 350 pagos pela clientela convencional. "Só que, quando eu vou a Brasília, corto o cabelo de algumas madames e cobro R$ 1.500, R$ 2.000", conta Nunes. "Assim, pago a viagem." Por atender o casal presidencial, o cabeleireiro chegou a ser criticado por alguns clientes, durante o chamado escândalo do mensalão. Muitos, no entanto, querem mesmo é que ele faça tráfico de influência. "São pessoas que querem falar da empresa delas para o presidente", diz, ressaltando que jamais apresentou alguém a Lula. "Por que eu vou ser a ponte?" Filho de um barbeiro de Maringá (PR), Nunes começou a trabalhar aos 12 anos.

Com o pai, aprendeu a fazer a barba com pente e tesoura, como gosta o presidente. A seguir, os principais trechos de sua entrevista à ISTOÉ:

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"Na época do mensalão, um monte de mulheres ficou brava por eu ser o cabeleireiro do presidente e de dona Marisa"

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"Quando eu preciso da Cláudia Raia, ela vem a São Paulo. Se eu for cobrar um cabelo dela, ela vai cobrar R$ 30 mil, R$ 40 mil para ir a uma festa minha"

ISTOÉ – Como o sr. se aproximou da primeira-dama?
Wanderley Nunes

A dona Marisa foi até o meu salão, antes das eleições de 2002, indicada por uma amiga. Ela fez o cabelo com outro profissional. Mas tem uma coisa que acontece muito na minha vida: estou sempre no lugar certo, na hora certa, do jeito certo. Passei para ela o que eu sou.

Sempre fui simples, humilde e profissional. Nunca fiz tráfico de influência. Até falei uma vez para o presidente Lula: "Presidente, um monte de mulheres ficou brava por eu ser seu cabeleireiro."

Foi numa época em que ele não estava muito em alta.

ISTOÉ – Na época do mensalão?
Wanderley Nunes

Isso. Na época que aconteceram aquelas coisas com o ministro (o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu), com o Delúbio (o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares). Não contei para ele na época. Falei recentemente: "Olha, presidente, clientes que são esposas de industriais, de comerciantes que ficaram revoltados com algumas situações, me crucificaram." Agora que passou, as mesmas pessoas falam: "Puxa, Wanderley, você é o cabeleireiro do presidente, que legal." Não me envolvo em política. É claro que ser cabeleireiro de um presidente da República é memorial, tem relevância. Mas o mais importante é o respeito que eu tenho por ele e ele por mim. Quando estamos juntos, a gente nunca fala de política.

A única coisa que falei foi sobre pessoas que já criticaram, mas hoje estão me elogiando porque eu corto o cabelo dele.

ISTOÉ – Qual foi a reação dele?
Wanderley Nunes

Ele achou bom. Falei como algumas pessoas mudaram. E antes vinham até pessoas pedir favores para mim, "me apresenta a ele", "me apresenta um ministro".

ISTOÉ – O sr. também tem ministros entre os seus clientes?
Wanderley Nunes

Eu conheço todos. Não tem nenhum que é cliente, mas já cozinhei para todos no Palácio do Planalto.

Quando o presidente fez 35 anos de casamento, fui lá fazer o jantar. Acabei ficando conhecido de todos. Tenho amigos como o ministro dos Esportes, Orlando Silva. Mas nunca uso isso. Nunca apresentei ninguém para o presidente. Talvez apresentasse, se aparecesse alguém que quisesse ajudar o Fome Zero. Mas, em troca de favor, não. São pessoas que querem conhecer o presidente para falar da empresa delas. Por que eu vou ser a ponte? A minha ponte não atravessa esse rio.

ISTOÉ – Ele é um cliente exigente?
Wanderley Nunes

Ele é muito vaidoso. Não gosta que corte a barba com máquina. Tem de ser na tesoura. De vez em quando ele me chama de "bom barbeiro". Eu deixo o presidente me chamar de barbeiro. Meu pai sempre foi barbeiro e eu aprendi com ele a cortar a barba com o pente e a tesoura.

ISTOÉ – O sr. sempre corta o cabelo do presidente?
Wanderley Nunes

Corto de vez em quando. Ele tem um bom cabeleireiro, que é do Exército. Eu sempre elogio o cabelo dele. Quase sempre está bem cortado. De vez em quando, o presidente corta em outro lugar, não sei onde, que não fica muito bom.

ISTOÉ – O sr. vai com frequência a Brasília?
Wanderley Nunes

Não muito. Ele vem mais para cá. Eu vou a São Bernardo, corto na casa dele.,

 

ISTOÉ – Por causa do deslocamento, o sr. cobra mais caro dele?
Wanderley Nunes

Eu cobro o preço de Brasília, R$ 40, R$ 50 o corte. Só que, quando eu vou a Brasília, eu corto o cabelo de algumas madames e cobro R$ 1.500, R$ 2.000. Assim, pago a viagem.

ISTOÉ – O sr. já ofereceu seus serviços de graça para ele?
Wanderley Nunes

Eu não queria cobrar, mas ele não aceita. Nem ela. Dela eu cobro a mesma faixa pelo corte e R$ 100 pela tintura. Agora existem algumas pessoas para as quais eu faço o cabelo de graça.

ISTOÉ – Por exemplo…
Wanderley Nunes

Não cobro do Edson Celulari, da Cláudia Raia. Não cobro de várias pessoas que me ajudam.

Quando eu preciso da Cláudia Raia, ela vem a São Paulo. É uma troca. Se eu for cobrar um cabelo dela, ela vai cobrar R$ 30 mil, R$ 40 mil para ir a uma festa minha.

ISTOÉ – Soube que o sr. deu uma cadeira do designer Phillipe Stark para a primeira-dama.
Wanderley Nunes

Era uma Phillipe Stark, mas bem velhinha, bem judiada. Estava guardada no meu depósito. Mandei passar um pano e a levei para a casa dela para quando eu precisar cortar o cabelo ter esta cadeira lá. Eu tinha cinco. Nem falei que era Phillipe Stark. Mas quando a cadela fox terrier Michele morreu, eu dei uma cane corso para a dona Marisa. Chama Estrela, porque tem uma estrela branca no peito. É maravilhosa. Dona Marisa nem queria outro cachorro. Ela me xingou, mas eu dei assim mesmo. Ela é uma querida.

ISTOÉ – O que o sr. achou do novo visual da ministra Dilma Rousseff?
Wanderley Nunes

Achei que ela está chique. Deu uma personalizada. Quando o cabelo da mulher tem uma postura clássica, de bom gosto, ele imprime muito mais seriedade no que a pessoa fala. Não que o que ela falasse não era sério. Mas agora parece estar mais bem informada.

ISTOÉ – Falando em potenciais candidatos à sucessão de Lula, que tal o visual do governador José Serra?
Wanderley Nunes

Tem um texto dizendo que nunca um careca foi eleito presidente pelo povo. No mundo! Até dei para o presidente Lula ler. Quem escreveu foi o dr. José Marcos Pereira, que é tricologista, médico especialista em pelo. Tomara que o Serra quebre esta tradição. Porque ele é uma boa pessoa.

Ele tem um visual chique, de um homem limpo, cheiroso.

ISTOÉ – E o do Aécio Neves?
Wanderley Nunes

Adoro ele. Muito articulado, transmite modernidade. Um bom papo. Já falei para ele, em uma festa: "Aécio, eu acho que você vai ser o novo presidente." Ele deu risada.

ISTOÉ – E o visual dele?
Wanderley Nunes

Eu preferiria fazer o cabelo da Dilma do que o dele.

ISTOÉ – Por quê? O sr. acha que ela tem mais chances?
Wanderley Nunes

Porque é uma mulher chique. Eu vou torcer pela Dilma. Agora, falando em cabelo, eu prefiro fazer o cabelo dela. E, falando em cabelo, eu prefiro o do Aécio ao do Serra.

ISTOÉ – É verdade que, antes de abrir seu próprio negócio, o sr. foi demitido de todos os salões em que trabalhou?
Wanderley Nunes

Demitido por pura inveja. Quando trabalhei no Rio de Janeiro, no Shopping Rio Sul, fui mandado embora porque colocaram coisas roubadas no meu armário, para me incriminar. Isso me magoou muito. Aí vim trabalhar em São Paulo, no Shopping Iguatemi, e me mandaram embora achando que eu estava fazendo clientela para levar para outro salão.

Era mentira. Depois de 20 anos, ganhei uma fortuna do próprio shopping e um ponto enorme para montar lá meu salão. Já saiu no The New York Times, na Rolling Stones americana.Na Rolling Stones saiu a Gisele Bündchen falando que eu sou o melhor cabeleireiro do mundo.

ISTOÉ – Aliás, o sr. tem muita facilidade para fazer contato com pessoas como Gisele Bündchen. O sr. acha que é um homem de sorte?
Wanderley Nunes

Eu sou um homem abençoado. A explicação vem lá de cima. Deus tira do meu lado as pessoas que não são legais.

ISTOÉ – E aquela agressão que o sr. sofreu?
Wanderley Nunes

Eu vou ter que fazer uma nova cirurgia por causa disso. Levei muitos pontos. Perto do olho, perto da orelha, aqui atrás (mostra atrás da orelha). Me chutaram aqui (levanta a camisa e mostra uma cicatriz de quase 20 centímetros no abdome). Era uma hérnia que eu tinha operado. Deu no laudo do Einstein (o Hospital Albert Einstein) que eu corri sério risco de vida. As pessoas que fizeram isso foram identificadas. Estou pedindo uma indenização de R$ 1,5 milhão. Não quero dinheiro nenhum para mim.

Quero montar uma igreja da Congregação Cristã do Brasil na favela de Paraisópolis.

ISTOÉ – O sr. é evangélico?
Wanderley Nunes

Meus pais são. Eu sou uma pessoa que acredita em Deus, que lê a Bíblia todos os dias. Não sou um seguidor, mas acho que a igreja tira muita gente da rua.

ISTOÉ – Mas o que aconteceu exatamente?
Wanderley Nunes

Eu estava numa festa de três socialites, em São Paulo. Fazia dez dias que eu tinha sido operado.

Fui dar tchau para um funcionário meu que estava na fila para o banheiro. Um grupo de rapazes achou que eu iria furar a fila. Expliquei que não iria usar o banheiro. Aí, eles começaram a tirar sarro de mim. Veio um segurança e eu disse que os caras estavam bêbados e queriam briga. Quando o segurança se distraiu, eles fizeram uma roda de dez pessoas e quatro ou cinco me bateram. Foi um ato de covardia. Um dos que me salvaram foi o (ator) Dado Dolabella.

ISTOÉ – Como a crise econômica mundial está afetando seus salões?
Wanderley Nunes

Existem pessoas que choram. Outras fabricam lenços para vender. Não sou contra a crise. Sou contra os profissionais que tratam o consumidor como lixo.

ISTOÉ – E o que o sr. está planejando para este período de crise?
Wanderley Nunes

Vamos lançar uma franquia e uma linha de produtos para o público de menor renda. Isso porque o setor da beleza no Brasil está crescendo 12% ao ano. A maré está para peixe.