i52070.jpgO delegado da Polícia Federal Ricardo Saadi e o procurador da República Rodrigo De Grandis começam nesta semana uma nova etapa da Operação Satiagraha. Liderando uma equipe composta por cerca de 50 policiais (agentes, delegados e escrivães), eles têm a missão de analisar cerca de uma tonelada de documentos apreendidos por 300 agentes da PF, que cumpriram 56 ordens de busca e apreensão em escritórios e residências de 21 pessoas ligadas ao banqueiro Daniel Dantas e ao investidor Naji Nahas. Entre os documentos em poder da polícia estão cerca de sete mil horas de diálogos obtidos a partir de interceptações telefônicas e gravações ambientes realizadas em escritórios e restaurantes, em São Paulo e em Brasília, além de 200 HDs (discos rígidos de computadores), no quais há inclusive o registro de troca de mensagens eletrônicas. Para auxiliar a análise de tanta documentação, até o final da semana, agentes do Conselho de Controle e Atividades Financeiras (Coaf), da Receita Federal e do Banco Central irão se juntar à equipe do delegado Saadi. "Essa fase da investigação será mais técnica e menos midiática", diz o ministro da Justiça, Tarso Genro. "Isso não significa, porém, que será uma investigação superficial. Pelo contrário. O objetivo é aprofundar a apuração."

Tanto o delegado quanto o procurador já manifestaram a alguns interlocutores o temor de que entre os documentos, em razão do vazamento de informações sobre a Operação Satiagraha, estejam "provas plantadas" com o objetivo de desmoralizar a investigação quando os inquéritos chegarem à Justiça. Documento forjado é o que argumenta, por exemplo, o Grupo Opportunity em relação a um suposto e.mail em que Verônica Dantas, irmã de Daniel, demonstrava ter conhecimento da tentativa de corrupção de um delegado da PF (leia quadro abaixo). Para evitar a armadilha das fraudes, após um primeiro processo de separação sobre o que poderá ser usado em futuros inquéritos e o que deverá ser descartado, o material selecionado passará por perícias específicas para comprovar a autenticidade e até a legalidade da prova. Em sua última edição, ISTOÉ revelou que funcionários da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) gravaram uma conversa do advogado de Daniel Dantas com dois assessores do ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, e uma mulher não-identificada durante um jantar em Brasília. No domingo 20, a direção da Abin emitiu uma nota negando que seus funcionários tenham feito a gravação. "Não é verdadeira a informação de que teria (a Abin) realizado o acompanhamento, tampouco a gravação do suposto encontro", afirma a direção da agência. Se a gravação foi feita sem o conhecimento dos dirigentes da Abin e estiver entre o material encaminhado à Procuradoria da Repúbica, será analisada por peritos.

E, se seu conteúdo indicar para algum tipo de crime, a legalidade da fita também será apurada.

Documentos contendo a relação de investidores do Opportunity, de Daniel Dantas, merecerão análise especial dos técnicos do Banco Central e da Receita. Isso porque entre os listados naturalmente estão também aqueles que fizeram operações regulares e devidamente comunicadas aos órgãos de controle da atividade financeira. Para a realização de todo esse trabalho, tanto o delegado quanto o procurador estimam que será necessário um período que pode variar entre três e quatro meses. Só depois disso é que serão definidos os próximos passos. "Esses documentos poderão servir de base para a abertura de vários inquéritos. Certamente parte do material poderá vir a ser encaminhada ao STF, por envolver pessoas com fórum privilegiado", disse à ISTOÉ, na manhã da quinta-feira 24, um dos agentes que participarão da investigação. Também já é dada como certa a abertura de um outro inquérito com o objetivo de aprofundar as investigações sobre tráfico de influência no governo federal e em alguns governos estaduais a favor dos interesses do Grupo Opportunity.

Nesse caso, os principais indícios encontrados até agora comprometem o ex-deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh e o ministro Mangabeira Unger. Greenhalgh afirma que não fez tráfico de influência e diz que estava advogando para Dantas. Mangabeira também nega ter feito uso do cargo de ministro em favor do dono do Opportunity. Ele afirma que fez consultoria para o grupo antes de se tornar ministro.

A VERSÃO DO OPPORTUNITY

"O Opportunity jamais foi investigado pela Polícia Federal na chamada Operação Farol da Colina e qualquer tentativa de envolvê-lo trata-se de uma grande mentira. Sobre os investimentos fora do Brasil, como se sabe, o Conselho Superior de Recursos do Sistema Financeiro Nacional julgou o processo aberto pela CVM em 2001, tendo o mesmo sido arquivado em agosto de 2007 com relação a todos os envolvidos. A decisão foi proferida à unanimidade no tocante à acusação de colocação de cotas do Opportunity Fund a residentes no Brasil." "Há erro de informação ao tratar um e-mail fantasioso entre a executiva Verônica Valente Dantas e a advogada Danielle Silbergleid. O referido e-mail jamais existiu, e conseqüentemente qualquer reprodução, pela via eletrônica ou pela via impressa, corresponde a uma mensagem forjada."

OPPORTUNITY

O delegado Saadi é o chefe da Delegacia de Combate ao Crime Organizado na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Sua nomeação para presidir a investigação no lugar de Protógenes Queiroz, que cuidou do caso nos últimos quatro anos, foi bem recebida pelo procurador De Grandis. Saadi é sobrinho do ex-superintende da PF em São Paulo Jaber Saadi. Foi o responsável pela operação que prendeu o traficante colombiano Juan Carlos Abadía e, mais recentemente, pela Operação Santa Tereza, que investigou fraudes em liberação de recursos do BNDES envolvendo o deputado Paulo Pereira da Silva (PDTSP), o Paulinho da Força Sindical. De 2004 até agora, a Operação Satiagraha se desdobrou em quatro inquéritos.

Num deles, Daniel Dantas e dois auxiliares foram indiciados por corrupção ativa e já são réus em processo criminal, acusados de tentar corromper por US$ 1 milhão um delegado da PF. Em outro inquérito, Dantas e outras nove pessoas são acusadas de gestão fraudulenta e formação de quadrilha. Um terceiro inquérito investiga supostos crimes financeiros praticados pelo Opportunity e, por fim, há uma investigação sobre evasão de divisas e lavagem de dinheiro contra Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta.

Após a análise dos documentos apreendidos, a expectativa é de que sejam abertos pelo menos mais seis inquéritos.